100 anos de resiliência e bom-humor: conheça a dona Alda
Ao longo do último século, o mundo viveu (e ainda vive), grandes pandemias. Presenciou a maior guerra da história e viu tragédias ambientais e humanas desolarem nações. Mas tem coisas que não mudam com o tempo, como o bom-humor da bento-gonçalvense Alda Dal Magro Bertarello. No último domingo, 16/08, ela completou 100 anos de muita resiliência e gratidão pela vida.
O filho dela, Antônio Luis Bertarello, conta que Alda nasceu no Distrito de São Pedro, em Bento Gonçalves, onde reside até hoje. Desde pequena, precisou lidar com traumas que marcaram sua vida. Aos dois anos, perdeu seu pai devido a uma infecção no pé e, aos quatro anos, perdeu a mãe para uma pneumonia. Foi criada pelo avô, Pietro Merlin, e pela avó, Lucia, junto a seus dois irmãos, Arquiles e Elda. “Aos sete anos, ela perdeu a avó e a tia Ofélia Ferri foi buscar os três mais o avô para morar junto com ela, também aqui em São Pedro. Mais tarde, os irmãos se separaram. A irmã foi para Toledo (Paraná) e o irmão para Encantado (RS). Eles se reencontraram somente depois de 18 anos. A família Ferri tinha uma ferraria onde minha mãe ajudava a fazer comida para os empregados e, depois, levava a comida para a tia na roça, onde almoçavam juntas”, conta Antônio.
Dois pretendentes, para garantir
Alda conheceu o marido, Garibaldi Giácomo Bertarello, ainda quando criança. Mas foi após um baile que os dois começaram a sair juntos. “Todos queriam namorar a mãe. Ela convidava sempre dois para ir aos bailes, pois se um não fosse, tinha o outro”, brinca o filho. “Em um desses bailes foram os dois que ela havia convidado. Então ela disse que o primeiro que entrasse no salão seria com quem ela iria ficar. E foi o Garibaldi que apareceu. O outro, incomodado, pegou o cavalo e foi embora”, relata o filho.
Alda casou com Garibaldi aos 25 anos e o casal morou por três anos com o avô Pedro Bertarello, ao lado do moinho que até hoje é uma referência no distrito. Após, Antônio conta que a mãe ganhou o terreno dos tios Adolfho e Ofélia Ferri e, com o dinheiro da herança, construiu uma casinha próxima ao moinho. “Com a sobra do dinheiro, comprou uma mesa, uma caixa de lenha e uma calheira para polenta, que tem até hoje. “Nós éramos em quatro filhos [Antônio, José Pedro, Maria Irene e Carlos], mas meu irmão [Carlos] faleceu em 1997, aos 38 anos. E meu pai morreu cinco anos depois, com câncer”, recorda Antônio.
Mesmo lidando com perdas desde criança, Alda nunca desanimou. De acordo com o filho, quando o marido dela ficou doente, ela esteve ao seu lado dia e noite, em casa e no hospital. “A minha mãe tem uma forte habilidade de se adaptar conforme as situações da vida. Quando meu pai morreu, um médico a aconselhou a começar a cuidar mais de si mesma”, conta.
E o conselho foi levado a sério. Mas o segredo para a vida longa e saudável que leva vai muito além de uma alimentação saudável ou de uma rotina ativa. O segredo da dona Alda está na sua saúde mental. “Ela é muito vaidosa, gosta de pintar as unhas, não sai de casa sem passar perfume, gosta de cores vivas como, por exemplo, a cor da casa que ela escolheu (lilás). Ela sempre diz que gosta de todo mundo (ela tem 22 afilhados dos quais ainda lembra o nome) e não se apega a bens materiais. Diz que, tendo uma casinha que não chove dentro, está bom, porque quando a gente morre, não se leva nada”, declara Antônio.
Há 18 anos, Alda vinha lidando com graves feridas nas pernas, por conta da má circulação sanguínea. Foram realizados procedimentos como implante de veias, mas as dores fortes não passaram. “Ela vivia à base de medicamentos, então chegou uma hora que o médico falou que seria melhor amputar uma das pernas. Conversamos com ela achando que iria ficar muito triste, mas ela disse que se fosse para parar de doer não tinha problemas. Depois de um ano, a outra perna começou a incomodar. Logo ela disse: ‘vamos lá cortar a outra’”, recorda o filho.
Antônio relata que a família teve receio que isso abalaria a saúde mental de dona Alda e pensou em levá-la a um psicólogo. “Mas ela sempre foi forte e venceu todas as barreiras. Ela vê o lado bom da vida. Quando teve as pernas amputadas, por exemplo, brincava que agora não precisava mais colocar água quente para esquentar os pés. Hoje, na cadeira de rodas, ela fala ‘ainda bem, porque aí fico todo o dia sentada’”, brinca. “Ela nunca levantou mal-humorada. Nunca esteve de mal com a vida”, continua Antônio.
A comemoração dos 100 anos não foi da forma esperada pelos filhos devido à pandemia do Coronavírus. Mas o respeito e o carinho pela mãe foram estampados em uma faixa colocada no distrito de São Pedro: “Ao longo destes cento anni você contornou obstáculos, superou barreiras e foi mostrando que a felicidade é feita pelas coisas simples que temos a nossa volta. Parabéns, Alda”, homenageou a família.
Fotos: arquivo pessoal