A rotina de quem cuida do trânsito há 17 anos
Há 17 anos, cuidar do trânsito da cidade é uma função que Ulisses Sebben, de 58 anos, exerce. Ele faz parte primeira turma de agentes concursados do Departamento Municipal de Trânsito (atual Departamento de Mobilidade Urbana). Apesar das dificuldades do trabalho, ele conta que nunca pensou em desistir. “É preciso gostar do que se está fazendo. Tem que saber o que faz, cumprir o que está escrito. Aí não tem erro. Se você fizer o que não pode, complica”, ensina.
Entre os ensinamentos aprendidos e os conhecimentos adquiridos por conta da profissão, o que ele classifica como mais interessante foi poder acompanhar as mudanças ocorridas na cidade. Graças às fiscalizações, Sebben passou a conhecer diferentes bairros e, ano após ano, presenciou o crescimento de Bento Gonçalves. Antes, ficava fechado dentro do meu local de trabalho. “Eu vi a cidade mudar. Que coisa bonita”, garante.
Natural de Bento Gonçalves, há cerca de 30 anos ele se mudou para São Miguel do Oeste (SC), onde morou durante cinco anos. Na época, trabalhou como pintor de automóveis em uma oficina mecânica. Ao retornar a Bento, comprou algumas ferramentas para abrir o próprio negócio no mesmo ramo. A empresa durou cinco anos. Depois, trabalhou como vigilante, área na qual seguiu até surgir a oportunidade de prestar concurso público para o cargo de agente de trânsito.
O departamento foi criado em 1998 e no ano seguinte o serviço começou a ser feito por agentes contratados temporariamente – conhecidos como “bordozinhos”. No mesmo ano, o município lançou edital para o concurso público e, em 2000, a função de cuidar o trânsito passou a ser feita pelos “azuizinhos” – nome dado em função da cor do uniforme. “Agora está mais calmo até, mas no início não foi fácil. O pessoal não estava acostumado porque uma vez era só a Brigada Militar que fazia esse serviço”, explica. Sebben deve seguir na área por pelo menos mais três anos, quando completará o tempo necessário no serviço para poder solicitar a aposentadoria.
Atualmente o quadro do Departamento de Mobilidade Urbana conta com 33 agentes, que se dividem em três escalas de trabalho (manhã, tarde e noite), com jornada de 6h cada, incluindo finais de semana. Dificilmente eles trabalham sozinhos, geralmente atuam em duplas. Sebben está na escala da tarde, mas eventualmente também trabalha à noite – o que não chega a ser uma dificuldade, já que estava acostumado ao horário quando era vigilante. Apesar das escalas aos finais de semana, ele sempre consegue tempo para ver a família – tem dois filhos e duas netas.
A primeira multa
Paciência e conhecimento para poder aplicar as penalidades corretas são as principais virtudes que Sebben acredita serem necessárias na profissão. Ele ainda recorda da primeira multa que aplicou. O condutor de um Monza, com placas de Carlos Barbosa, trafegava na contramão pela rua Xingu. Segundo ele, não foi uma tarefa difícil, mas ficou marcada. “Entramos preparados, fazemos dois meses de curso e um intensivo na rua. Ninguém gosta de ser multado, eu também não gostaria, mas é preciso”, comenta.
Com 17 anos de experiência e o aprendizado do dia a dia, ele avalia que o trânsito no município teve melhoras. “No começo a gente flagrava motoqueiro sem capacete em pleno Centro. Hoje não vê mais. Foi uma mudança extraordinária”, destaca. Ele acredita que o maior rigor nas leis e na fiscalização foram os principais responsáveis. “A lei está nos amparando bem. Estão aumentando os valores das multas e isso ajuda porque, infelizmente, alguns motoristas, se não forem penalizados, nunca vão respeitar”, lamenta.
Ele também conta que no início as tentativas de suborno eram mais frequentes, mas que diminuíram com o passar do tempo. Os xingamentos ao aplicar alguma penalidade também fazem parte da rotina, mas Sebben garante que já aprendeu a ter jogo de cintura nessas situações. O segredo é saber separar que as reclamações são para as instituições e não para a pessoa – ele revela que com frequência ouve queixas sobre o sistema político.
Balada segura
Desde 2015, os agentes passaram a também realizar a “Operação Balada Segura”, em convênio com a Brigada Militar, Polícia Civil, Detran e entidades vinculadas à educação no trânsito. Para ele, essa é a mais complicada das fiscalizações, especialmente por ser realizada de madrugada, quando, além de fazer mais frio, os servidores estão expostos a situações extras de perigo – felizmente até o momento não ocorreu nenhum incidente mais grave, exceto fugas e tentativas de atropelamento. Segundo ele, o bafômetro é temido por muitos motoristas – especialmente pelo alto valor da multa caso seja constatada a embriaguez. “Mas o pessoal está se cuidando mais”, pondera.
Acidentes
Ocorrências com morte são as que geralmente ficam guardadas na memória, mas há outras inusitadas que também fazem parte da rotina. Uma das mais marcantes para Sebben aconteceu há quase uma década. Os agentes estavam se deslocando no sentido São Roque-Centro quando uma moto avançou o sinal vermelho e foi acompanhada até próximo da saída para a BR-470. Ao perceber que estava sendo seguido, o caroneiro sacou uma arma e atirou contra a viatura. “Não chegou a atingir, mas o cara tentou acertar seis tiros em nós”, recorda. A moto – depois descoberta como furtada – foi abandonada e os criminosos fugiram a pé. Tempo depois, foram presos.
Pressa
Na visão de Sebben, o principal problema do trânsito, não apenas em Bento, é a pressa. “Se o trânsito está andando devagarinho, o pessoal até releva, mas se para todo mundo fica louco, daí começam a voltar na contramão, buzinam. Se andar numa boa, sem pressa, é difícil dar algum acidente. Pelo que eu vejo tem pouca direção defensiva. O pessoal só entra no carro e vai, se alguém se atravessar não se preocupa”, avalia.
Esta é a 41ª reportagem da Série “Vida de…”, uma das ações de comemoração aos 10 anos do SERRANOSSA e que tem como objetivo contar histórias de pessoas comuns, mostrando suas alegrias, dificuldades, desafios e superações e, através de seus relatos, incentivar o respeito.