Além das estatísticas: a dor e a saudade por trás das mortes por COVID-19 em Bento

Diariamente, às 16h, o Comitê de Atenção ao Coronavírus de Bento Gonçalves atualiza os dados sobre a pandemia no município. A cada novo dia, diversas pessoas entram para as estatísticas de pacientes curados, infectados, ou, infelizmente, dos que não resistiram ao novo vírus. Na última semana, a prefeitura confirmou a morte de quatro mulheres. A mais recente foi uma moradora na faixa etária dos 70 anos, que estava internada no Hospital da Unimed, em Caxias do Sul, e morreu no dia 12/06. São vidas que, independentemente de comorbidades ou de doenças pré-existentes, acabaram cedo por uma doença ainda pouco conhecida.  

Por trás dessas estatísticas estão relatos de dor e de saudade. Em apenas dois dias, mãe e filho perderam a batalha contra a COVID-19 em Bento Gonçalves. A professora aposentada Leilamar Bandeira Duarte, de 59 anos, morreu no dia 02/06 e seu filho, Jorge Luiz Bandeira, de 39 anos, no dia 03/06. “Ele estava se sentindo culpado por ter pegado e talvez ter sido o responsável por passar para a mãe dele. Pode ser por causa disso que ele não tenha buscado ajuda. Ele estava triste, em isolamento em casa. Passou uma noite resmungando de dor”, lamenta o amigo de infância de Jorge, Flávio Ambrósio. 


 

Jorge e Flávio se conheceram no bairro onde moravam quando crianças e, desde então, mantinham uma forte amizade. “Nós andávamos de bicicleta, jogávamos futebol e outras brincadeiras. Fazíamos campinhos e organizávamos pequenos torneios. O Jorge sempre foi diferenciado no futebol, era muito bom”, recorda Flávio.

Durante sua vida, mais que o talento para o futebol, Jorge evidenciou outra característica marcante de sua personalidade: a vontade de ajudar o próximo. Após passar por momentos difíceis e encontrar forças na fé, ele passou a se dedicar ao auxílio de outras pessoas que também estivessem passando por dificuldades. “Ele estava com um trabalho de evangelização, buscava dependentes químicos e os levava para a recuperação. Também recolhia alimentos e distribuía para pessoas carentes. Era um rapaz trabalhador, uma pessoa extraordinária”, declara o amigo. 

Atualmente, Bento Gonçalves é a terceira cidade do Rio Grande do Sul com mais óbitos pela COVID-19, perdendo apenas para Porto Alegre e Passo Fundo. 

Além da dor da perda, os familiares de pacientes infectados ou com suspeita de infecção pelo novo Coronavírus ainda precisam lidar com as restrições de velórios. “Um enterro lamentável. Ela não merecia isso. Não teve velório e ninguém conseguiu ver se realmente era ela… Era uma mulher sensacional, ainda não consigo acreditar. Tão jovem, tão cheia de saúde”, desabafa o familiar de outra vítima da doença. 

As vítimas de Bento Gonçalves*:

26/04 – Mulher, 80 anos
28/04 – Homem, 73 anos
03/05 – Homem, 64 anos
06/05 – Homem, 82 anos
09/05 – Homem, 68 anos
10/05 – Mulher, 87 anos
23/05 – Mulher, 87 anos
24/05 – Bebê, 1 mês
24/05 – Homem, 24 anos
26/05 – Homem, 67 anos
27/05 – Homem, 92 anos
30/05 – Homem na faixa etária dos 90 anos
30/05 – Homem na faixa etária dos 70 anos
31/05 – Homem na faixa etária dos 40 anos
02/06 – Mulher, 80 anos
02/06 – Mulher, 59 anos
03/06 – Mulher, 56 anos
04/06 – Mulher, faixa etária dos 80 anos 
03/06 – Homem, 39 anos
05/06 – Mulher, na faixa etária dos 60 anos
06/06 – Homem, 71 anos
06/06 – Mulher, na faixa etária dos 80 anos
08/06 – Mulher, na faixa etária dos 60 anos
12/06 – Mulher, na faixa etária dos 70 anos

*Informações compiladas da secretaria de saúde do estado e dos boletins epidemiológicos divulgados diariamente pelo Comitê de Atenção ao Coronavírus em Bento Gonçalves. 

Foto: Arquivo Pessoal