Altos custos e alternativas de transporte levam à baixa na procura pela CNH entre jovens

O número de jovens interessados em obter a Carteira Nacional de Habilitação (CNH) tem tido uma queda significativa em todo o país nos últimos anos. No Rio Grande do Sul, a baixa é percebida entre as faixas etárias de 18 e 25 anos, com maior incidência entre os mais jovens. Dados do DetranRS apontam que o número de condutores vem baixando desde o ano de 2016. Na faixa etária dos 18 anos, por exemplo, o dado baixou de 23.267 condutores em 2015 para 10.110 em 2020 – 56%. Até julho deste ano, o dado apontava apenas 9.007 condutores com essa faixa etária em todo o RS.
Em Bento Gonçalves, o número de emissões de primeira habilitação para o público de 18 anos caiu de 451 em 2019 para 331 em 2020, uma redução de 26%.

O professor dos cursos de extensão na área de trânsito da Universidade de Caxias do Sul (UCS), advogado e doutor e mestre em Direito, Ailor Carlos Brandelli, acredita que a diminuição da emissão da CNH nas faixas etárias mais jovens pode ser explicada por dois aspectos: o econômico e o cultural. “No aspecto econômico, o elevado custo da CNH e a ausência de políticas públicas voltadas ao incentivo de acesso gratuito aos serviços de habilitação, afastam inclusive o jovem do mercado de trabalho”, avalia o profissional. Atualmente, o valor para 1ª habilitação na categoria B (para carro) no RS é de pelo menos R$ 2.458,36. Se for para a categoria A (moto), o custo é a partir de R$ 2.111,54. Já para as duas categorias juntas (AB), o valor parte de R$ 3.157,87.


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O aspecto cultural envolve a ascensão das alternativas de transporte oferecidas atualmente, “como bicicletas, patinetes, aplicativos de transporte, além do uso da internet para planejamento de rotas, monitoramento do transporte público, caronas compartilhadas e afins”, cita Brandelli. O cenário, conforme o advogado, demonstra como a realidade dos jovens difere daquela de décadas anteriores, assim como suas percepções sobre “o status social que havia na época, de dirigir ou de comprar o primeiro veículo”. Na visão do profissional, outro ponto a ser destacado é que hoje há maior conscientização sobre a necessidade de respeito ao ciclista, além de um maior comprometimento ambiental visando reduzir o uso de combustíveis fósseis. 

Na análise feita pelo DetranRS ao jornal SERRANOSSA, ainda é possível acrescentar que o desejo de viver experiências diferentes, como um viagem, por exemplo, tem se sobressaído ao desejo de conquistar a carteira de motorista. 

Para o estagiário de compras nacionais Otávio Augusto Troian, de 20 anos, a obtenção da CNH e a compra de um veículo é uma de suas últimas prioridades no momento. Além de não sentir necessidade do transporte próprio durante seu dia a dia, o jovem avalia que os gastos para manutenção de um veículo são elevados atualmente. “Hoje não tenho necessidade de ter um [veículo] para mim. Quando preciso, utilizo o dos meus pais, já que é um alto gasto por mês”, comenta. 

Já o analista de negócios Anderson Andriolli Perego, de 26 anos, chegou a fazer a habilitação e até a adquirir um carro próprio quando completou 18 anos. Mas aos 21 anos, suas prioridades mudaram e ele decidiu vender o veículo. “Eu vendi meu carro para fazer um intercâmbio e, quando retornei ao Brasil, não senti mais necessidade de ter um veículo próprio”, recorda. Isso porque atualmente Perego trabalha em home office e se adaptou ao uso de transportes alternativos. “Quando preciso, utilizo transporte por aplicativo ou transportes de carona, ônibus ou consigo o carro emprestado de alguém da minha família, por exemplo. Não vejo necessidade de pagar seguro e impostos todo o ano”, afirma. 

Na visão do professor e advogado Ailor Carlos Brandelli, uma medida efetiva para tornar a habilitação mais atrativa para os jovens seria “a conversão de parte dos valores arrecadados com taxas de registro de veículos ou de valores provenientes de infrações de trânsito para esse fim [reduzir os valores de obtenção da CNH]”. Brandelli ainda cita iniciativas como o “Programa CNH Social” do governo do RS, que esteve em vigor em 2013 e 2014, fornecendo à população de baixa renda oportunidades no mercado de trabalho a partir de serviços de habilitação gratuitos. Entretanto, o programa está encerrado e, conforme o DetranRS, não há previsão de abertura de novo edital.