Após quase um ano, retomada das audiências ainda é incerta

As audiências judiciais deixaram de ser realizadas em março do ano passado, como medida de prevenção ao contágio pelo Coronavírus. O cancelamento impactou centenas de famílias em Bento Gonçalves e resultou no atraso dos processos, o que poderá gerar prejuízos financeiros. “Tenho alguns casos de processos ajuizados no Tribunal de Justiça do RS em outubro/2020 que sequer ainda tiveram o recebimento inicial. Outros que, por sua natureza alimentar (que são prioridade), demoraram cerca de dois meses para conseguirmos liberações, o que normalmente levava cerca de 3 a 4 dias”, relata a advogada sistêmica trabalhista Bruna Marin Rossatto.

Somente na 1ª e na 2ª Vara Cível de Bento Gonçalves, há pelo menos 359 audiências paradas. Conforme o juiz titular da 2ª Vara, Paulo Meneghetti, o acúmulo maior é na 1ª Vara Cível, que tem cerca de 222 audiências em espera. “Como a 1ª Vara está sem juiz titular, que assumirá em meados de fevereiro, advindo da Comarca de Nova Prata, de onde foi promovido, houve um acúmulo maior de processos para futura audiência”, explica. 

Mesmo após o início da vacinação e a flexibilização dos decretos estaduais e municipais, a retomada do serviço ainda é incerta. Entretanto, o juiz afirma que as audiências mais urgentes poderão, sim, ser realizadas. “Não há data certa para a retomada. Porém, não está vedada sua realização para casos que a necessitem. Claro que isso gera uma apreensão dos envolvidos e por isso, apenas são realizadas presencialmente quando for a única forma possível. Dá-se preferência para as audiências por videoconferência”, comenta o juiz. “Como há um ano de atraso, vai ser necessário um tempo semelhante ou até maior para que se possa normalizar a pauta de audiências, pois é como se tivesse que fazer o trabalho de dois anos no prazo de um”, complementa.


Juíz titular da 2 ª Vara, Paulo Meneghetti, afirma que o acúmulo maior é na 1ª Vara Cível, que tem cerca de 222 audiências em espera. Foto: Raquel Konrad

Ainda conforme o juiz, há atrasos em audiências da área cível e família, mas os processos que terão mais atraso são aqueles que necessitam de audiência de instrução (audiência para produção de provas). 

A advogada Bruna Rossatto afirma que possui audiências marcadas para março, então a expectativa é de retomada gradual à normalidade. 

Audiências on-line

Em setembro, o Fórum de Bento Gonçalves passou a realizar audiências de conciliação on-line, na área de família, as quais auxiliam na resolução de alguns processos. De acordo com o juiz, essas foram priorizadas porque são as mais urgentes e mais fáceis de se obter acordos. No caso de audiências de instrução, por exemplo, a realização do processo on-line é mais complexo por conta dos registros em gravação digital. “Já nas audiências de conciliação, basta que todos se ouçam bem, pois fica o registro apenas de uma ata do que aconteceu em audiência, o que simplifica o trabalho”, explica o juiz da 2ª Vara Cível, Paulo Meneghetti. Até o momento, foram realizadas 14 audiências por videoconferência nas varas cíveis e outras cinco estão marcadas para o início de fevereiro. 

Questionado sobre o formato dessas audiências on-line, o juiz afirma que o momento está sendo de aprendizado para todos, inclusive para advogados. “Cada participante da audiência pode estar em um local diferente e até mesmo a testemunha. Isso é muito bacana, porém torna imprescindível que o equipamento e a internet funcionem bem, coisa que não é muito segura”, pontua. A advogada Bruna complementa que, além da disponibilidade de internet no Brasil ainda ser escassa, a própria Justiça Brasileira não está adaptada para a realização de atos virtuais. “As partes, então, são as principais prejudicadas, já que muitos sequer acesso à internet possuem”, comenta. 

Devido ao problema relativo à internet, a advogada tem oferecido o espaço do seu escritório para que os clientes tenham acesso aos equipamentos eletrônicos necessários para as audiências e perícias virtuais. “Isso também impactou na minha própria estrutura física, sendo obrigada a ter cuidados de higiene como o álcool gel, a medição da temperatura e a disponibilização de máscaras e, ainda, a aquisição de mais equipamentos eletrônicos de comunicação que suprissem a demanda”, relata. 

Outro desafio dos atos virtuais está ligado à demora no processo. O juiz Meneghetti explica que, na audiência presencial, o contato acaba sendo mais próximo e permite mais agilidade e rapidez. “Em algumas [audiências] foi necessário um tempo enorme para conseguir contornar a má qualidade do áudio ou do vídeo. Também ocorreram problemas de ficar sem som ou imagem, tendo que resolver isso, com alongamento do tempo de espera até a solução do problema”, exemplifica. 


Advogada Bruna Rossatto acredita que a experiência poderá resultar na consolidação dos atos virtuais. Foto: Arquivo pessoal

Apesar dos inconvenientes, a advogada Bruna acredita que a experiência poderá resultar na consolidação dos atos virtuais. “Pessoalmente gosto da dinâmica da audiência virtual para as de conciliação e desejo que permaneçam mesmo depois da pandemia, já que agilizam o processo e nos poupam o tempo de espera no átrio dos foros”, afirma. “Ficamos nos nossos escritórios trabalhando enquanto não somos chamados para a sala virtual. Ganhamos muito tempo com isso. Já as audiências de instrução, quando são ouvidas testemunhas, devem ter seu retorno imediato já que estão paralisadas desde o início da pandemia e prejudicando as partes”, finaliza.