Auxílio para entidades divide opiniões

Desde julho de 2011, nenhum projeto autorizando auxílio financeiro a entidades do município de Bento Gonçalves passou mais pela Câmara. O fato aconteceu após derrubada de lei que obrigava que qualquer auxílio passasse pela apreciação dos vereadores (veja quadro). Na época, os advogados consultados pelo SERRANOSSA tinham diferentes opiniões sobre o tema. Não havia um consenso se, de acordo com a legislação em vigor, cada repasse deveria ou não ter o aval do Legislativo. Nesta semana, um novo episódio voltou a reacender a polêmica. Isso porque foi negada a declaração de inconstitucionalidade de artigo de outra lei, que determina que o repasse de auxílios deve ser autorizado por lei específica.

Novamente as opiniões são divergentes. Isso porque a redação da lei dá margem para múltiplas interpretações. O que está causando entendimentos diferentes são duas expressões referentes à definição de auxílios financeiros: “autorizada por lei específica”; e à competência do legislativo: “legislar sobre a concessão de auxílios”. De um lado está o presidente da Câmara de Vereadores, Valdecir Rubbo (PDT), que, amparado pela assessoria jurídica da Casa, entende que a primeira expressão determina que cada repasse exija uma nova lei autorizadora. Do outro, a procuradora-geral do município, Simone Azevedo Dias Flores, que defende que a redação dos artigos apenas autoriza o Legislativo a criar leis que normatizem os repasses de forma geral. 

Devolução de valores

A preocupação de Rubbo é que as entidades possam ser prejudicadas por essa ação do Executivo. Para ele, “todos os recursos repassados sem a autorização legislativa são repasses que não têm sustentação jurídica, portanto são ilegais”. O vereador ainda acredita que, quando forem analisadas as finanças, o Tribunal de Contas do Estado (TCE), caso tenha o mesmo entendimento defendido pelo Legislativo, pode obrigar o prefeito a devolver os recursos, que chegam próximo a R$ 1 milhão, somando os valores de 2011 e 2012. Os vereadores esperam que, a partir de agora, futuros repasses de auxílio financeiro voltem a passar pela Câmara. Entretanto,  para a procuradora-geral do município, isso não é possível.

 
“Uma polêmica desnecessária”

Para Simone está descartada totalmente a possibilidade de devolver valores e essa é uma polêmica desnecessária. “Começo a pensar que há uma verdadeira intenção eleitoreira para atingir o prefeito, porque não é crível que não se pode entender uma coisa tão simples assim”, observa. Segundo ela, a Lei Orgânica prevê que compete tanto ao Poder Legislativo quanto ao Executivo a criação de uma lei específica, conforme ocorre com a lei 4.160, que impede possíveis vícios ou impessoalidade no repasse dos recursos. “Simplesmente isso. O que não pode acontecer é a Câmara exigir que todo e qualquer auxílio que vai ser repassado tenha que passar pela Casa. Isso é inconstitucional”, destaca. Além disso, Simone diz ainda que os repasses são autorizados com base em uma lei orçamentária, no caso a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), aprovada anualmente pela Câmara.


Entenda o caso

* Em 2009, foi promulgada a lei n º 4.740, de autoria do vereador Adelino Cainelli (PP) que obrigava a apreciação dos vereadores em qualquer auxílio financeiro repassado pela prefeitura a entidades, associações e órgãos privados;

* Em 2010, o município ingressou com Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) contra esta lei e dois incisos da Lei Orgânica, espécie de constituição municipal;

* Em julho de 2011 a referida lei foi apontada como inconstitucional pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) juntamente com um dos incisos questionados. Ele atribuía à Câmara a competência de autorizar convênios e contratos de interesse municipal. A justificativa é de que a legislação feria a independência dos Poderes. Na época, a Câmara não ingressou com recurso por entender que não era possível contestar a decisão do TJRS;

* O outro inciso questionado foi declarado constitucional. Ele versa sobre a competência da Câmara, com sanção do prefeito, de legislar sobre a concessão de auxílios e doações a terceiros;

* A permanência deste artigo na Lei Orgânica dividiu opiniões de advogados consultados pelo SERRANOSSA na época. Enquanto uns entendiam que os projetos autorizando repasses deveriam continuar a passar pela Câmara, para outros os vereadores não tinham mais o poder de aprovar ou não as leis sobre auxílios, mas apenas normatizar a forma como os repasses seriam feitos;

* No entendimento da procuradora-geral do município, Simone Azevedo Dias Flores, as leis autorizando concessão de auxílio financeiro não deveriam mais passar pela Câmara e passaram a ser feitas via decreto pelo prefeito;

* Em novembro de 2011 o município ingressou novamente com outra Adin para tentar derrubar artigo de outra lei (4.160/2007), que falava sobre a necessidade de existir lei específica para autorizar os repasses. O departamento jurídico da Câmara Municipal prestou as devidas informações no processo, entendendo que o artigo é constitucional, tendo a Câmara o poder de legislar sobre a destinação de auxílios e doações a terceiros, conforme prevê a Lei Orgânica;

* A ação foi julgada improcedente pelo Tribunal Pleno do TJRS em 16 de abril deste ano. Entretanto, ainda não transita em julgado, uma vez que não foi publicado o Acórdão sobre o caso.


Repasses que não passaram pela Câmara

Em 2011:

Associação dos Deficientes Físicos de Bento Gonçalves (ADEF)
Associação Gota D’Água
Associação Moto Clube Bento
Associação de Pais e Amigos Excepcionais de Bento Gonçalves (Apae)
Associação de Tênis de Mesa Bento Gonçalves

Em 2012:

Clube Esportivo
Sociedade Educativa e Cultural Poli-esportiva de Bento Associação Bento-gonçalvense de Convivência e Apoio à infância e juventude (Abraçaí)
Associação Gota D’Água
Sociedade São Vicente de Paulo – Conferência Irmã Dulce
Associação dos Deficiente Visuais de Bento (ADVBG)
Serviço Nacional de Aprendizagem do Transporte (Senat)
Serviço Social do Transporte (Sest)
Associação dos Surdos de Bento Gonçalves (ASBG)
Círculo Operário Bento-gonçalvense

Reportagem: Carina Furlanetto

 

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