Bento Gonçalves: uma história a ser comemorada
Greice Scotton*
11 de outubro de 1890. O ato 474, assinado por Cândido Costa, então General de Divisão do governo do Estado do Rio Grande do Sul, cria oficialmente um novo município, constituído dos territórios das freguesias de São Pedro, na Colônia Conde D´Eu, e Santo Antônio, na Colônia Dona Isabel, elevando-a à categoria de vila, com a denominação Bento Gonçalves.
Passaram-se 126 anos desde que a cidade se emancipou, mas as mudanças que ocorreram nesse espaço tempo aparentam que faz muito mais. Você consegue imaginar Bento descrita como um lugar situado em “uma concha de colinas muito abertas, a duas horas de distância de Garibaldi e a três da estação ferroviária de Carlos Barbosa”? Esse é um trecho do relatório de Ranieri Pesciolini Venerosi, em 1913. Na época, 23 anos após a emancipação, a cidade já era considerada uma referência regional forte, com cerca de 25 mil habitantes, dos quais 22 mil italianos e 120 casas de comércio instaladas, além de algumas indústrias – destaque para quatro fábricas de chapéus de palha que exportavam seus produtos para outros Estados do Brasil e uma de queijo, com produção anual de 20 toneladas.
Mas engana-se quem pensa que o caminho do desenvolvimento não foi árduo. Os primeiros relatos oficiais, datados de 1892, trazem um cenário de sofrimento. “Chegado à colônia, o imigrante era provisoriamente abrigado em velhas barracas de madeira e, após alguns dias, era-lhe indicado um lote. Nos primeiros anos, levava uma vida muito difícil, pois chegava quase sempre desprovido de dinheiro. Não havia obras públicas nas quais pudesse trabalhar e sua terra rendia muito pouco”, diz o relatório do Cônsul Real Eduardo dos Condes Compans de Brichanteau. “Os colonos chegados sem família recebiam seu lote sob a promessa de mandar vir da Itália mulher e filhos e os solteiros, sob a promessa de casar-se… A medição das terras era feita ao deus-dará e os limites foram assinados com palanques de madeira, hoje quase todos podres… sofreram muito nos primeiros tempos, devido aos maus-tratos que tiveram que suportar dos empregados públicos, devido aos péssimos abrigos provisórios e à alimentação escassa. A terra é pouco fértil e montanhosa, geralmente coberta de pedras, troncos, árvores e outras; por isso o colono só pode trabalhar com a enxada, cultivando uma parte bem menor do que faria se pudesse utilizar o arado”, relata o cônsul.
Se mal havia o que comer, imagine outros serviços que hoje consideramos básicos. “As necessidades mais urgentes da colônia são um médico e uma farmácia bem provida de medicamentos, oferecidos a preços módicos… Também a presença de uma parteira é indispensável: há mulheres que exercem a profissão como práticas, mas, apresentando-se um parto difícil, a pobre parturiente acaba sucumbindo por falta de médico e parteira competente”, diz o relatório de 1892. A situação só viria a apresentar melhora de vulto várias décadas depois, com a chegada do Dr. Bartholomeu Tacchini, em 1927, e a instalação de uma casa de saúde, próxima à igreja Santo Antônio. “O serviço interno é zelosamente dirigido por irmãs da Ordem de São Carlos e a administração do hospital está confiada a uma diretoria eleita anualmente. O corpo médico é constituído pelo benemérito Dr. Bartholomeu Tacchini como diretor do hospital, Dr. Vico Barbieri; José Florêncio Martins, auxiliar; Dr. Carlos Cini, oculista; Sr. Augusto Casagrande, enfermeiro; radiologista, o Dr. Mário Francisco Caorsi”, descreve o relatório do intendente Olinto Fagundes de Oliveira Freitas, datado de 1928/1929.
A Bento de hoje
Um cenário bem diferente dos tempos de colônia pode ser visto na Bento Gonçalves de 2016. Com uma população estimada em 114.206 habitantes (IBGE/2016), o município é referência em qualidade de vida e se consolidou como importante polo industrial e turístico da Serra Gaúcha, figurando entre as 10 maiores economias do Rio Grande do Sul.
Detentora do título de “Capital Brasileira da Uva e do Vinho”, Bento é pioneira no Brasil no desenvolvimento do Enoturismo (Revista Panorama Socioeconômico de Bento Gonçalves – CIC /2013) – a Serra Gaúcha é a maior e mais importante região vinícola do Brasil, respondendo por cerca de 85% da produção nacional de vinhos, de acordo com o Ibravin, e 10% das indústrias gaúchas do segmento são de Bento (Ibravin/2012). O Vale dos Vinhedos é o principal destino enoturístico do Brasil e também o mais visitado desde 2008, tendo sido a primeira região do país a obter uma Indicação de Procedência e uma Denominação de Origem para seus vinhos e espumantes. Desde 2012, o Vale dos Vinhedos integra oficialmente o patrimônio histórico e cultural do Estado do Rio Grande do Sul.
Bento Gonçalves também representa o maior e o mais expressivo polo moveleiro do Estado, conhecido nacional e internacionalmente – são 262 empresas, que empregam mais de 8 mil pessoas (Movergs/2015).
Os indicadores de desenvolvimento e de renda colocam Bento Gonçalves em destaque tanto em nível estadual quanto nacional. Com Índice de Desenvolvimento Socioeconômico (Idese) de 0,816 (FEE/RS-2010), a cidade é classificada como tendo um nível de alto desenvolvimento. O município também se destaca pela prosperidade: de acordo com a Revista Panorama Socioeconômico (CIC/2013), o PIB per capita do município é quase 20% superior à média estadual.
*Informações baseadas no livro “Memórias Bento Gonçalves – RS – Fundamentação Histórica”, de Assunta De Paris.
Foto: www.memoriasdebento.com.br