Com as portas e corações abertos para a causa animal
O trabalho realizado por protetores e voluntários da causa animal depende muito da colaboração mútua para ter bons resultados. Uma das principais dificuldades encontradas por quem atua na área é encontrar os chamados lares temporários (LTs) – especialmente para cães de grande porte e gatos adultos. É uma forma solidária de reduzir o número de animais desabrigados até que se encontre um adotante.
Como as entidades envolvidas com a causa não dispõem de sede, é preciso contar com a colaboração daqueles que abrem as portas de suas casas. “Sem lares temporários, não temos como resgatar mais animais”, comenta a diretora da ONG Todos por um Focinho, Paula Trigo. A principal queixa é a falta de novos interessados em colaborar. “São sempre os mesmos. Alguns ajudam somente com casos de gatos, outros somente com cachorros. Temos, no máximo, seis pessoas que ajudam sempre”, lamenta. Além disso, há também os que abandonam a tarefa passados alguns dias. “Alguns ajudaram por cinco dias e desistiram, porque o animal fazia muita sujeira. As pessoas têm que estar cientes que um animal faz suas necessidades, pede carinho e precisa comer. Não é de pelúcia”, observa.
Em média, o animal fica neste lar durante 15 dias. Alguns casos podem ser mais demorados para encontrar adotantes. “Estamos ajudando vidas, não podemos devolver ou simplesmente desistir. Eles têm sentimentos e sofrem a cada ida e volta de lares temporários”, complementa.
Paula explica que não há um padrão e tampouco pré-requisitos. “A única coisa que precisamos é um cantinho para abrigar os animais enquanto tentamos achar um lar definitivo para eles. Temos pessoas que moram em apartamento ou que moram em casas e sítios. Quando se quer ajudar, não existem desculpas de espaço ou coisas parecidas”, argumenta. Segundo ela, pessoas que nunca tiveram um animal podem fazer um teste sendo lar temporário e quem já tem cão ou gato também pode colaborar, já que os animais costumam adaptarem-se uns aos outros.
“É só dar amor e cuidar”
Os animais encaminhados para os lares temporários estão bem de saúde e precisam apenas de um local para descansar. As entidades ficam responsáveis por bancar alimentação, consultas e medicação. “A pessoa só tem que dar amor e cuidar. Lógico que se a pessoa puder auxiliar com custos será de grande ajuda, mas muitas vezes uma cama quentinha e carinho são mais do que suficientes para que as protetoras continuem desenvolvendo seu trabalho”, comenta uma das voluntárias, que prefere não se identificar.
Sem atuação direta em nenhuma entidade, ela acredita que muitas pessoas desconhecem o funcionamento dos lares temporários e por isso não se voluntariam, com medo de que o animal seja esquecido e de precisar arcar com custos de consultas e medicação. “É impossível os protetores ou ONGs poderem fornecer um tratamento adequado a um animal resgatado se não tiverem onde deixá-lo. A maioria pensa que as organizações têm sede e que os protetores são ricos e tem obrigação de ficar com todos os bichos em suas casas. É importante ressaltar que nenhuma ONG ou protetor recebe auxílio da prefeitura para fazer esse serviço. Todos fazemos por amor e a maior parte dos custos é paga com o nosso próprio dinheiro e doações que pessoas de bom coração oferecem”, observa.
De temporário a permanente
Na maioria das vezes, quem fica de lar temporário de algum animal com situação mais delicada, se apega e o adota. É o caso de Jocelyn Arce. Dos cinco animais que ela tem (dois cães e três gatos) dois eram para ficar em sua casa apenas temporariamente. “Acabei me apegando pelo sofrimento que passaram”, explica. O cão Jackie ela recolheu na rua, quase atropelado e extremamente magro. Já a gata Molly fazia parte de uma família de 11 filhotes, todos com infecção ocular, dos quais apenas três sobreviveram. Ela precisava de cuidado especial com a aplicação de colírio para não ficar cega.
Seu envolvimento com a causa foi intensificado há três anos e ela já acolheu cerca de 10 animais neste período, ao mesmo tempo em que participou de entidades ligadas à proteção animal. “Infelizmente, as pessoas não contribuem muito pelo fato do preconceito, mas acredito que é mais pela falta de conhecimento e comprometimento. Sim, é ‘dificil’ ser lar temporário, porque você está abrigando um ‘desconhecido’ na sua casa, porém, se as pessoas tivessem mais compaixão e menos preocupação com cuidados financeiros, teríamos mais lares desse tipo. Tem que ter um tempinho para poder fazer um carinho no animal e tentar apagar as memórias ruins da sua cabecinha”, pontua.
Sem lar temporário, pagar hospedagem é alternativa
Nos casos em que não se encontra um lar temporário, a entidade precisa arcar com os custos de uma hospedagem ou, em último caso, devolver o animal para onde estava antes do resgate. “Nos casos que devolvemos, acabamos ficando de olho e colocando como prioridade para achar um lar definitivo. Resolvemos casos conforme podemos, conforme entra dinheiro da ajuda da população. Os lares temporários estão lotados, precisamos de gente que abra a cabeça e comece a ajudar e pensar com o coração. A gente só está tentando acabar com o sofrimento de vários animais, mas sozinhos não temos como resgatar todos os pedidos de ajuda”, explica.
Um dos casos que exemplifica a dificuldade de encontrar lares temporários é de Dengoso (foto), de oito anos, que desde outubro do ano passado procura por adotantes. Ele chegou a ficar em lar temporário, mas como a pessoa mudou-se para outra cidade, a alternativa encontrada pela ONG foi arcar com os custos de um canil, onde está há quatro meses. O único cuidado especial é o uso de um colírio diariamente, já que ele não produz lágrimas.
Essas e outras histórias podem se encontradas nas páginas de ONGs como a “Patas e Focinhos” e a “Todos por um Focinho” que atuam na causa animal em Bento Gonçalves. Confira em fb.com/todosporumfocinho e fb.com/SOSpatasefocinhos.