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Com milhares de animais mortos anualmente, biólogos explicam importância de travessias aéreas na Rota do Sol

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Estruturas são voltadas para espécies arborícolas, ou seja, que vivem nas copas das árvores. Além disso, profissionais esclarecem que valores contestados pela população incluem uma série de estudos e etapas anteriores e posteriores à instalação das travessias na rodovia

Foto: Divulgação/Daer

A construção de cinco estruturas aéreas para a travessia de anfíbios na Rota do Sol tem sido motivo de piada nas redes sociais nos últimos dias. Algumas pessoas contestam a utilidade dessas travessias e debocham do formato das estruturas, questionando como anfíbios conseguiriam “escalar” o acesso. Outras têm criticado o valor anunciado pelo Departamento Autônomo de Estradas de Rodagem (Daer), de R$ 2 milhões, para a construção das travessias e demais medidas de proteção à fauna na rodovia. Diante da grande onda de desinformação que se espalhou pela internet, o SERRANOSSA procurou profissionais com autoridade para falar sobre o assunto: a educadora ambiental em Gramado e Sapiranga e bióloga Bruna Hellen de Melo Gomes e o biólogo do Museu de Ciências Naturais da UCS Fábio Moura. Ambos são mestrandos do Programa de Pós-Graduação em Sistemática da Diversidade Biológica – UERGS/SEMA – Porto Alegre.

Diversos memes e piadas envolvendo a construção das travessias foram criados e compartilhados nas últimas semanas pelas redes sociais. Imagem: Reprodução/Facebook

Funcionalidade das travessias aéreas

Conforme os biólogos, as estruturas aéreas que estão sendo instaladas na Rota do Sol são voltadas para espécies arborícolas, que já vivem nas copas das árvores. Dessa forma, as travessias tendem a servir como uma “ponte” entre uma copa e outra, separadas pela rodovia. “Aliás, o objetivo é justamente fazer com que estes animais não precisem ir ao solo, pois geralmente são nesses casos em que ocorre o atropelamento”, enfatizam os biólogos.

Além das travessias aéreas, há uma série de outras estruturas que podem auxiliar na segurança das espécies que contornam a rodovia. Passagens subterrâneas, por exemplo, também já foram instaladas na Rota do Sol em Itati, no Litoral Norte. Segundo os biólogos, essas, sim, são destinadas a espécies que vivem no solo. Além disso, há estruturas como as cercas, a fim de encaminhar os animais para trechos seguros de travessia.

E a importância de promover passagens seguras por animais se traduz em números. No Rio Grande do Sul, estimativas apontam que anfíbios atropelados chegam a 9.000 indivíduos por quilômetro por ano. Na Rota do Sol, segundo o DAER e pesquisadores que atuam na região, a estimativa de atropelamento é de cerca de 7 mil animais em pouco mais de 2 anos de monitoramento, principalmente em épocas de alta temporada no litoral. “Se pensarmos na Reserva Biológica da Mata Paludosa, por onde passa a Rota do Sol, que conta com cenário rico em espécies endêmicas, sendo únicas da Mata Atlântica, ou seja, não existem em outro lugar no mundo, e que infelizmente estão ameaçadas de extinção, logo, uma gestão para preservar estas espécies é urgente, levando em consideração que também fazemos uso das toxinas produzidas por esses indivíduos, quando são utilizadas dentro da indústria farmacêutica para a elaboração de medicamentos contra a enxaqueca e medicamentos para o tratamento de câncer”, ressaltam os biólogos.

Conforme Bruna e Fábio, estudos sobre o impacto das rodovias nas espécies selvagens estão sendo realizados desde a década de 70. Em 1998, houve a consolidação da área de pesquisa chamada “Ecologia de Estradas”. “Então é um problema que requer atenção e atitudes sérias para que não tenhamos perdas irreparáveis que vão afetar a vida de todo mundo em algum grau”, alertam.

Custos totais de investimento

Antes de qualquer julgamento sem embasamento, os biólogos afirmam que é preciso levar em consideração as etapas anteriores e posteriores da implantação de soluções para a fauna em rodovias. Eles enfatizam que as estruturas que já foram e que estão sendo instaladas ainda passarão por monitoramento e revisão, podendo ser utilizadas para novos projetos de rodovias e construções mais sustentáveis. “Do mesmo jeito que um atleta é resultado de um processo de muito tempo de treino e investimento que antecede uma competição, um investimento em preservação da biodiversidade e manutenção de recursos naturais também é um processo de desenvolvimento”, comparam. “Houve muito tempo de pesquisa, experimentos e dados para então haver decisões. Não foi algo decidido e pensado apenas nestes últimos meses. Então é sobre esta dimensão que devemos enxergar o custo total das travessias”, comentam.
Segundo os profissionais, a mitigação de impactos ambientais de empreendimentos diversos, como uma rodovia, é um grande desafio para cientistas, planejadores e gestores ambientais. “Isso exige do gestor que tenha uma base de conhecimentos da região para uma tomada de decisões, não somente para prevenir danos ambientais, mas também para evitar questões jurídicas”, explicam. “Se deve incluir itens bem específicos voltados à relação entre rodovias e animais, através da identificação de passivos que impactam a fauna, em específico os atropelamentos. Se isso acontece, é obrigatório apresentar um programa de recuperação, identificando áreas que tem potencial para servirem de corredor ou de refúgio das espécies”, complementam.

Ainda, eles reforçam que é preciso entender a Rota do Sol como um espaço de compartilhamento entre os seres humanos e os organismos que vivem nas áreas florestais da região. “A relevância destes projetos é justamente a manutenção da nossa sociedade para um patamar sustentável, ecologicamente equilibrado e que consequentemente traz benefícios econômicos e sociais”, refletem. “Nisso, a Educação Ambiental também é primordial para que os motoristas adotem uma direção segura nestes trechos, seja através de informações, atividades ou engajamento sobre a preservação das espécies”, continuam.

Outros projetos para a Rota do Sol

A instalação de travessias na rodovia é apenas uma das diversas etapas de monitoramento, estudos e constatações que estão sendo feitas há anos por diversos pesquisadores do RS e de fora dele. “Através de instituições de pesquisas, SEMA e empresas, pesquisadores estão em constante avanço sobre as informações da biologia das espécies na região. Informações do tipo: como elas estão a nível populacional e genético? Quais são as ameaças para esses animais? Quais os manejos e projetos necessários para a sua preservação?”, citam. “É a partir dessas informações que temos a aplicação desses e dos próximos projetos na Rota do Sol”, informam.

Os biólogos ainda citam a importância da participação da comunidade e dos usuários da rodovia para otimizar o trabalho de preservação da biodiversidade. “A ciência não é feita apenas para cientistas, é um serviço que pode ser feito por todos, para a melhora de todos, enquanto sociedade”, finalizam.

Sobre as obras de instalação de travessias

As obras para instalação das travessias aéreas na Rota do Sol tiveram início no dia 26/10, e deverão ser concluídas em 20 dias. Não há previsão de alteração de tráfego, segundo informações do Daer. As obras iniciaram após a conclusão das passagens subterrâneas para a fauna na Rota do Sol (ERS-486), em Itati, no Litoral Norte gaúcho. “As novas travessias complementam os equipamentos para proteção à fauna existentes no segmento da Reserva Biológica Mata Paludosa e compõe um complexo inédito no país voltado à travessia de anfíbios, que conta, ainda, com cercas-guias para a condução dos animais para essas estruturas”, ressalta a Superintendente de Meio Ambiente do Daer, Josani Carbonera.

De acordo com a engenheira, os equipamentos foram propostos pela empresa Biolaw Consultoria Ambiental, contratada em 2017 pelo Daer para um estudo de monitoramento de fauna na Rota do Sol. A pesquisa, realizada durante seis meses, apontou o alto índice de atropelamento de animais, inclusive de espécies que estão em risco de extinção (conforme Decreto Estadual de 2014): a perereca-castanhola (Itapotihyla langsdorffii), perereca-risadinha (Ololygon rizibilis) e perereca-macaca (Phyllomedusa distincta). Esta última é encontrada no país apenas na Mata Atlântica, nos estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná e São Paulo.

“Ao se deslocar de um lado para outro da rodovia para se reproduzir e buscar recursos, como alimentos, esses anfíbios acabam sofrendo acidentes”, explica o biólogo Luiz Carlos Leite. “Dentre eles estão espécies com hábitos terrestres e aéreos, por isso a necessidade de disponibilizarmos estruturas de passagens de fauna adaptadas para essas movimentações” acrescenta.

“Ao todo, cerca de R$ 2 milhões estão sendo investidos nas ações de proteção à fauna na rodovia. Elas incluem, ainda, uma segunda fase do estudo, que consiste na avaliação da efetividade nos dispositivos. Essa etapa ocorrerá no período entre a Primavera e o Verão, quando os animais estão mais ativos”, afirma o diretor-geral do Daer, Luciano Faustino.

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