Conheça Drika, a cadelinha de Bento que venceu a segunda doença mais letal em cães

Adotar um animal de estimação é um momento transformador tanto para o bichinho quanto para seus novos tutores. Mas poucas pessoas sabem do histórico de cada animal, das dificuldades enfrentadas na rua, da dor do abandono, dos maus-tratos ou das doenças que eles carregam consigo.

Considerada a segunda doença mais letal de cães, perdendo apenas para a raiva, a cinomose tem acometido uma série de cães em Bento Gonçalves, com relatos de surtos em bairros como Ouro Verde, Zatt e Maria Goretti – na chamada Vila do Sapo. “A cinomose é uma doença viral causada pelo vírus da família Paramyxovirus. Tem caráter multissistêmico, afeta os sistemas respiratório, gastrointestinal, sistema nervoso central e tegumentar e é altamente contagiosa”, explica a veterinária Bruna Invernizzi Zauza.

O diagnóstico da doença é feito por meio de testes rápidos ou exames PCR e os sintomas mais comuns são apatia, anorexia, secreção ocular, nasal, tosse, náuseas, diarreia e, em casos mais graves, convulsões, paraplegia/tetraplegia e mioclonias. “Isso vai depender da gravidade da cepa e da imunidade do cão acometido”, comenta a veterinária. O contágio ocorre em cães não vacinados que têm acesso à rua ou a outros cães também não vacinados. 

Em março de 2018, a cachorrinha Drika foi abandonada no bairro Santa Helena e resgatada pelo casal Marcelo Felippe e Talita Poletti Dutra. Após dez dias, ela começou a apresentar sintomas neurais, como tremedeira e espasmos. “Levamos a uma clínica veterinária e nos falaram que era cinomose. Até então, não sabíamos o que era. O veterinário que nos atendeu falou que, provavelmente, ela teria sido abandonada justamente por estar doente”, conta Felippe. 

Ciente da dificuldade do tratamento, o casal decidiu entrar na luta junto com Drika. Entre o final de março e o início de abril de 2018, os tutores entraram com as medicações e todos os suportes necessários para auxiliar a cachorrinha no combate ao vírus. “O veterinário nos falou que era uma doença muito complicada e que, em algum momento, talvez precisássemos conversar sobre a eutanásia”, recorda. 

Durante cerca de um mês, o casal dormiu em quartos separados para ficar em tempo integral com Drika. “Ela gritava demais, começava por volta das 1h30 e ia até umas quatro. Então a gente a acalmava com chá de melissa”, relembra Felippe. Sem aceitar ração, os tutores precisaram oferecer comidas diferentes, como pedaços de frango e carne, “tudo picado, porque ela não conseguia mastigar e ficava todo tempo deitada”, conta.


 

Ao longo dos dias, Drika foi perdendo a coordenação motora e tendo espasmos cada vez mais intensos. “O tratamento foi bem cansativo e doloroso. Chegou um ponto que falamos que seria necessário conversar com o veterinário, porque parecia que ela sofria demais”, complementa. Mas o amor entre os três parece ter derrotado o vírus. Em uma manhã, após o casal ter considerado pela primeira vez a eutanásia, Drika começou a melhorar. “Então ela foi melhorando, melhorando e hoje está um espetáculo. Acho que ela não desistiu e nós também não, foi um conjunto. A gente foi se ajudando e venceu”, declara. 

Hoje, após cerca de seis meses de tratamento – incluindo procedimentos como fisioterapia –, mesmo com alguns espasmos na pata esquerda, Drika corre, brinca e garante muito carinho aos seus tutores. “Nosso conselho é tentar de tudo e dar muito carinho ao bichinho”, afirma. 


 

Sobre a cinomose

A cinomose e a parvovirose, de forma geral, são as doenças virais com maior taxa de mortalidade entre os cães. Após o diagnóstico, é essencial que o animal seja mantido em isolamento, iniciando o tratamento suporte. Além das medicações para tratar dos sintomas da cinomose, as terapias suporte também são a base do tratamento da doença. “Fisioterapia e acupuntura são bem-vindas após PCR negativo, para ajudar na reabilitação das sequelas neurológicas”, comenta a veterinária Bruna. 

Para evitar a cinomose, a única maneira é vacinar os cães com médicos veterinários, “utilizando protocolos corretos, atualizados e vacinas éticas”, afirma. Para obter mais chances de sobrevivência e sucesso no tratamento, é necessário que o cão seja levado ao veterinário logo após os primeiros sintomas. 

Papel do Poder Público

Na opinião da veterinária, a prefeitura municipal tem papel fundamental no controle dessas doenças virais, mas não tem posto em prática medidas efetivas para evitar os surtos que vêm sendo registrados em Bento. “O Poder Público se esquece que cuidar dos animais também é uma questão de saúde pública”, comenta.

Para Bruna, é necessária a implantação de uma política ampla de castração, conscientização e punição. “Esses são os pilares”, afirma. Na parte da conscientização, entra a questão da vacinação, a qual não é tida como prioridade para muitos tutores de pet. 

O que diz a prefeitura

De acordo com a secretaria do Meio Ambiente, a prefeitura vem trabalhando com a conscientização ambiental e verificação de animais em situação de maus-tratos. Já a vigilância ambiental com a verificação de zoonoses. “A vigilância ambiental realiza a verificação em casos relacionados a zoonoses, como a raiva por exemplo. Em virtude desse cuidado, a raiva é uma doença que há anos não é registrada na cidade. Mas, também estamos atentos a outros tipos de doenças”, afirma o secretário de Meio Ambiente, Claudiomiro Dias. 

Apesar dos relatos de surtos nas rede sociais, o secretário afirma que não há registros na cidade. Ainda, complementa que a secretaria continuará, juntamente com o Conselho do Bem-Estar Animal, trabalhando com “ações de educação ambiental e verificando todas as situações, que são repassadas”, afirma o secretário. Questionado se a secretaria recebe e verifica denúncias de animais com essas doenças virais, Dias apenas responde que o Meio Ambiente “verifica situações de maus-tratos de animais”. O contato para denúncias é o 0800.979.6866.