Cultura conservadora dificulta inserção da mulher em cargos políticos, analisa professora
A doutora em Educação Claudia Schiedeck Soares de Souza sempre esteve envolvida em movimentos políticos, sindicais e estudantis. Natural de Getúlio Vargas, mas moradora da região há cerca de 40 anos, Claudia já lecionou no colégio Aparecida, na Universidade de Caxias do Sul (UCS) e na antiga escola Agrotécnica, hoje Instituto Federal do Rio Grande do Sul (IFRS), campus Bento. Por lá, a professora foi eleita diretora geral quando a instituição ainda se chamava Centro Federal de Educação Tecnológica (CEFET), sendo a primeira mulher a assumir o cargo em 50 anos de história da instituição. Na sequência, assumiu por dois mandatos o cargo de reitora do agora IFRS. “Foi uma experiência muito interessante, porque envolve cargo político e de gestão, envolve a questão da mulher estar em uma função de destaque. E até aquele momento, eu nunca havia percebido claramente essa distinção entre homens e mulheres”, revela. “As mulheres podem até ter ideias muito interessantes, mas dela sempre é cobrada alguma coisa a mais”, complementa.
Na opinião da professora, quando as mulheres estão à frente de cargos políticos e de gestão, é cobrado que ela seja dura para se igualar ao patamar dos homens. “Mas se ela é dura demais, é porque não tem jogo de cintura e, portanto, não sabe fazer política. No meu caso, sempre fui guiada pela emoção e as pessoas me cobravam muito isso. Falavam que eu não poderia ser emotiva demais, porque não era isso que se esperava de uma gestora pública”, recorda Claudia. Por outro lado, na visão da professora, um homem à frente do mesmo cargo pode ser duro em suas relações e falar o que lhe for conveniente, não sendo cobrado por isso.
Foto: Fabíola Koche
Além das lições adquiridas durante seus mandatos como reitora, Claudia aprendeu sobre a questão de equidade de gênero durante suas candidaturas à prefeita de Garibaldi e à vereadora de Bento Gonçalves. Apesar de não ter sido eleita, ela afirma que foram experiências enriquecedoras para sua visão como sociedade. “Nossa região é muito conservadora e ainda tem um olhar muito focado à imagem da mulher vinculada ao trabalho doméstico, à casa. São poucas as mulheres que conseguem ter espaço para fazer essa inserção politica”, analisa. Para Claudia, alguns partidos têm uma cultura mais aberta à participação da mulher, mas não é o caso dos partidos com maior força política na região. “Esses são associados ao Coronelismo, à figura do homem como principal provedor de ideias políticas e principal provedor da casa”, comenta. “A nossa sociedade precisa sair desse maniqueísmo que ela vive e que, de certa forma, gera a polarização política que a gente vive hoje. Porque é tudo preto ou branco, é tudo vermelho ou verde, não existem meios tons”, complementa.
Mudança positiva
Apesar da cultura mais conservadora, Claudia acredita que o cenário esteja mudando positivamente ao longo dos últimos anos, principalmente nas últimas eleições. A professora associa o maior número de mulheres eleitas ao Legislativo na região à legislação de cotas, permitindo que mais recursos financeiros chegassem às mulheres. “Garibaldi teve quatro mulheres eleitas e eu espero que elas tenham esse comprometimento com a causa das mulheres, com a diversidade, com os animais e todas essas questões que precisam de um olhar diferenciado, que os homens não têm muitas vezes porque não vivem isso”, explica.
Dessa forma, a professora analisa que é necessário buscar espaços nos partidos que permitem essa diversidade, que valorizam a figura da mulher e que elas de identifiquem ideologicamente. “Às vezes eu me pergunto o que uma mulher que fala sobre os problemas que enfrenta faz em um partido que representa o Bolsonaro, por exemplo, que é o oposto disso. Muitas vezes não conhecem nem a tradição de seus partidos. E não estou dizendo que tem que ser vinculado ao PT, acho que pode ser dentro de outros partidos até mesmo para mudar a dinâmica deles”, esclarece.
Ainda na visão da professora, muitos homens sequer percebem a desigualdade da sociedade que vivem, justamente por ser um aspecto cultural já enraizado. “Então é uma luta diária constante, fazer com que os homens percebam que a sociedade mudou e que hoje muitas das mulheres são empresárias e empreendedoras de sucesso, que são elas que sustem a casa e seus filhos. E essa é uma realidade que veio para ficar”, finaliza.