De amor a caso de polícia

Um ataque de fúria pôs fim ao relacionamento de quase dez anos de Júlia e João (nomes fictícios a pedido da vítima). Ela conta que o amor virou medo depois da primeira agressão. Júlia diz que o ex-companheiro é uma pessoa boa e atenciosa, mas que o uso abusivo de álcool fez com que o comportamento dele mudasse drasticamente nos últimos dois anos. As agressões, inicialmente verbais, evoluíram para violência física. Depois da primeira surra, ela terminou o relacionamento e procurou ajuda. Apesar de não deixar sequelas graves, marcas profundas permanecem na lembrança. Hoje ela frequenta o Centro de Referência da Mulher em Situação de Violência – Revivi, de Bento Gonçalves, e busca nas novas amizades força e coragem para ser feliz.

Júlia se descreve como uma pessoa que nunca teve a pretensão de casar e ter filhos. Ela conta que conheceu João e depois de dois anos de relacionamento, resolveram morar juntos. “Eu havia sido alertada de que ele bebia e que às vezes poderia ser violento, mas quando se ama a pessoa, acaba enfrentando tudo”, relata. Ela diz que nos primeiros anos de convivência, ele era maravilhoso e a ajudava com as atividades da casa. O cenário mudou há dois anos. “Cada vez que ele bebia, me agredia verbalmente, insinuava que eu tinha amante e me xingava de diversos palavrões. Eu sabia que quando ele chegava alcoolizado em casa eu não devia falar nada, porque qualquer coisinha era motivo de briga. Mesmo quando eu ficava calada, ele fazia de tudo para provocar e causar uma discussão”, descreve. Júlia conta que aguentou essa situação por quase dois anos. “Quando se ama a pessoa, relevamos algumas coisas. Após essas brigas, no dia seguinte, era sempre um perdão e uma promessa de que isso não iria mais acontecer ou que tinha sido motivado por estresse no trabalho. Sempre tinha uma desculpa, mas a situação acaba se repetindo e cada vez mais com frequência”, relembra. Aos poucos, Júlia foi se afastando dos amigos e da família, que por diversas vezes a tentaram avisá-la sobre o problema e ela diz que até pensou em tirar a própria vida.

A agressão

Os xingamentos evoluíram para violência física no início deste ano. “Ele chegou do trabalho fazendo barulho e imaginei que seria um dia ruim, mas não que acabaria da forma como terminou”, conta a dona de casa. “Após uma pequena discussão sobre o fato de ele ter bebido, ficou muito nervoso e começou a quebrar as coisas dentro de casa e a me bater, me jogou contra os móveis e as paredes e ainda me arrastou pela casa, sempre me ameaçando. Lutei até que tive força, depois eu só pedia a Deus que me desse mais força para aguentar aquilo”, descreve. A ajuda veio de vizinhos, que chamaram a Brigada Militar. Os soldados prenderam João, embasados no que prevê a Lei Maria da Penha.

Uma nova vida

Após o ataque, o relacionamento foi desfeito e Júlia leva uma nova vida. Hoje, ela possui medidas protetivas contra o agressor e, mesmo com medo, continua forte na sua decisão. “Não desejo o que passei nem para o meu pior inimigo. Hoje voltei a conversar com minha família e tenho novas amizades”, conta. 

Há pouco mais de dois meses, ela frequenta o Centro Revivi onde participa de grupo de apoio. “No começo eu era meio tímida, tinha vergonha. Nunca havia apanhado na minha vida e não imaginava sofrer agressão de uma pessoa que dizia me amar. Passados alguns meses do acontecimento, me sinto ótima, muito mais feliz”, desabafa. Ela acrescenta que “quem sofre com a violência que procure ajuda, denuncie, que não tenha medo, porque tem alguém para nos ajudar. Ninguém é propriedade de ninguém e não tem o direito de tirar a vida de uma pessoa. Hoje vivo com receio de que ele possa aparecer, mas estou muito feliz e a cada dia ganho mais coragem para viver”, finaliza. 

Revivi

Assim como Júlia, cerca de 30 novas mulheres vítimas de violência procuram o Revivi a cada mês. Conforme a psicóloga Sandra Giacomini, esse aumento acontece principalmente pelo fortalecimento da rede de atendimento à mulher. “É uma parceria que vai além dos serviços de saúde e assistência social. Contamos com o apoio do Ministério Público, da Defensoria Pública, Judiciário e do Posto da Mulher. Somos uma rede articulada, que a cada ano vem ganhando mais visibilidade na violência contra a mulher”, destaca. Na última quinta-feira, dia 30, foi realizada a 5ª edição do Seminário Lei Maria da Penha, que teve por objetivo avaliar os trabalhos desenvolvidos pelos integrantes e apontar quais as necessidades para melhorar os atendimentos. O evento aconteceu no Campus Universitário da Região dos Vinhedos (UCS/Carvi) e não havia encerrado até o fechamento desta edição.

Reportagem: Katiane Cardoso

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