Dia nacional da onça pintada: preservação exige medidas de proteção e combate à caça ilegal

Pesando entre 60 e 160 quilos, a onça-pintada é o maior felino das Américas e o terceiro maior do mundo, atrás apenas do tigre e do leão. No entanto, ela que é uma das espécies-símbolo do Brasil, ilustrando a cédula de 50 reais, também é uma das mais ameaçadas. Com sua população em declínio, ao celebrar o Dia Nacional da Onça-Pintada, que acontece neste domingo,  29/11, é preciso destacar as medidas fundamentais para a sua preservação.

Não existem números oficiais sobre a quantidade de onças pintadas no Brasil. Segundo o biólogo e membro da Rede de Especialistas em Conservação da Natureza (RECN), Roberto Fusco, que há mais de 15 anos estuda o animal, o que há são estimativas, geralmente calculadas com base em informações muito localizadas e a partir de diferentes metodologias. “Existe uma extrapolação. Na Mata Atlântica, Cerrado e Caatinga, por exemplo, a população provavelmente é menor que 300 indivíduos. Já no Pantanal é inferior a mil, enquanto que na Amazônia é menos do que 10 mil”, explica o pesquisador.

Preservar a espécie exige medidas efetivas de combate à caça ilegal e de preservação ao seu habitat natural, que já soma 50% de perda ao longo de sua distribuição pelo continente americano – o único onde ela pode ser encontrada. De acordo com a União Internacional para a Conservação da Natureza, a onça-pintada está próxima de ser classificada como ameaçada de extinção. “Com a suspeita da perda de 20% a 25% de indivíduos maduros nos últimos 21 anos, ela provavelmente entrará na lista de espécies ameaçadas na categoria vulnerável em um futuro próximo”, lamenta o biólogo, que também é pesquisador do Instituto de Pesquisas Cananéia (IPeC) e pós-doutorando em Ecologia e Conservação na UFPR.

No Brasil, porém, a onça-pintada já está ameaçada na categoria vulnerável, com perspectivas de agravamento da situação. Quando analisadas apenas as ocorrências do animal na Mata Atlântica, por exemplo, a espécie é classificada como criticamente em perigo, por já ter perdido 85% de seu habitat, ocupando apenas 3% da região. Dados da Fundação SOS Mata Atlântica e do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) revelam que o desmatamento no bioma cresceu 27,2% entre 2018 e 2019 na comparação com o período entre 2017 e 2018.


Foto: Fabio Grison
 

Na Caatinga, por sua vez, a onça-pintada também está criticamente em perigo, ocupando 19% do bioma. No Cerrado, está classificada como em perigo, ocupando 32% da savana brasileira. Já no Pantanal e Amazônia, onde existem as maiores populações, elas se encontram em situação vulnerável, em grande parte pela perda de indivíduos por retaliação e caça ilegal, além do avanço da agropecuária.

Durante o segundo semestre de 2020, os incêndios que atingiram o Pantanal, destruindo lugares como o Parque Estadual Encontro das Água, que concentra a maior população de onças-pintadas no mundo, colocou mais pressão sobre o status de conservação da espécie no bioma.

“De forma geral, as principais ameaças à espécie continuam sendo a perda e a fragmentação de habitat, ocasionado pela expansão agrícola, que tem resultado na quebra de conectividade e no isolamento entre as populações de onças. Outro fator é a morte de indivíduos pela caça ilegal e pela retaliação por parte de proprietários rurais, devido à predação sobre rebanhos ou animais domésticos. A caça também impacta na redução da abundância das presas da onça, como antas e queixadas. Por fim, as onças-pintadas estão começando a ser um substituto para o osso de tigre com propósitos de medicina tradicional devido à aproximação do comércio asiático na América Latina”, detalha Fusco.


Foto: Leonardo Ramos
 

Características

Originalmente, a onça-pintada podia ser encontrada desde o sudoeste dos Estados Unidos até o centro-sul da Argentina e Uruguai, habitando diferentes tipos de ambientes, de florestas tropicais e subtropicais a regiões semidesérticas, de preferência ambientes próximos de curso d’água.

Contudo, devido principalmente à perda de habitat por fatores antrópicos, atualmente a espécie é considerada extinta nos EUA, se restringindo às planícies costeiras do México, países da América Central (com exceção de El Salvador) e na América do Sul (exceto Uruguai). No Brasil, ela originalmente ocupava todos os biomas, mas não há mais relatos da espécie na região do Pampa.

O animal geralmente evita regiões com atividades humanas. Em áreas rurais, próximas de seu ambiente natural, elas podem atacar o rebanho doméstico, ocasionando conflito com os proprietários.

A espécie tem a mordida mais forte entre todos os felinos do mundo. O corpo é revestido por pintas negras, formando rosetas com diferentes tamanhos, geralmente grandes com um ou mais pontos negros no seu interior. O aparecimento de indivíduos melânicos (onça-preta) não é raro, e mesmo nesses casos as rosetas podem ser vistas em contraste com a luz.

As onças têm hábito solitário, podendo ser ativas durante o dia e à noite. É um animal terrestre, mas escala árvores e nada muito bem. A onça se alimenta de vertebrados de médio e grande porte, como anta, porco-do-mato, veado, tamanduá, capivara, jacaré, quati, entre outros.

Machos e fêmeas encontram-se apenas no período reprodutivo; geram em média dois filhotes que permanecem com a fêmea até os dois anos de idade. Os machos possuem territórios maiores que podem se sobrepor os de várias fêmeas. Assim como outros grandes felinos, a onça-pintada requer uma grande área para sobreviver. Sua presença em grande densidade, portanto, serve como um indicador da qualidade de conservação daquele ecossistema.


Foto: Instituto Último Refúgio
 

Ações de conservação

Em razão do declínio populacional das onças-pintadas, cada vez mais têm surgido projetos que buscam a conservação do animal. “O desaparecimento desses predadores pode gerar impacto em todo o ecossistema, por meio de um efeito cascata, que começa com o aumento de suas presas, geralmente herbívoros, que por sua vez impacta a composição e estrutura da vegetação. Essa bagunça no ecossistema pode trazer efeitos imprevisíveis, como a perda de biodiversidade, alteração na composição do solo, aumento de espécies exóticas e até mesmo na liberação de patógenos, o que pode potencialmente afetar a saúde humana”, alerta Fusco.

O especialista lançou, neste ano, juntamente com outras pesquisadoras, o Programa Grandes Mamíferos da Serra do Mar, que busca justamente monitorar a população desses animais ao longo de uma grande porção de Mata Atlântica e, assim, gerar dados mais sólidos sobre sua relação com os ecossistemas e subsidiar ações de conservação mais eficazes. O projeto é realizado pelo Instituto de Pesquisas Cananéia (IPeC) e Instituto Manacá, com apoio da Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza, WWF-Brasil e banco ABN AMRO.

Além dessa iniciativa, muitas outras ações têm ajudado na conservação das onças-pintadas no Brasil, como o Centro Nacional de Pesquisa e Conservação de Mamíferos Carnívoros, o Instituto Onça-Pintada, o Projeto Onças do Contínuo de Paranapiacaba, o Onças do Iguaçu, o Projeto Felinos, a Associação Onçafari, o Programa Amigos da Onça, o Panthera Pantanal, o Ecologia e Conservação de Felinos na Amazônia e o Detetives Ecológicos do Instituto de Pesquisas Ecológicas, entre outros.

Fonte: Rede de Especialistas em Conservação da Natureza (RECN)