Diretores de escolas de Bento dão exemplo de gestão humanizada em meio à pandemia
O ano de 2020 tem sido um desafio para a saúde pública em todo o mundo, com mais de 51 milhões de casos e um milhão de mortes registradas globalmente. Entretanto, os efeitos da pandemia do Coronavírus têm trazido uma série de desafios para todas as demais áreas da sociedade, principalmente para a educação. Desde o mês de março, as instituições de ensino, juntamente com os poderes públicos, têm discutido, pensado e repensado maneiras de dar sequência ao aprendizado. E apesar das decisões serem tomadas de forma conjunta, são os diretores das escolas que precisam lidar diretamente e diariamente com as mudanças constantes de cenário. Por isso, o SERRANOSSA decidiu entrevistar alguns desses profissionais da rede pública, a fim de mostrar como tem sido essa adaptação e homenageá-los pelo Dia do Diretor, celebrado na quinta-feira, 12/11.
“O período servirá para a valorização da presença do professor em sala de aula”
Márcio Pilotti, diretor da escola Alfredo Aveline
O professor e diretor da Escola Municipal de Ensino Médio, Alfredo Aveline, Márcio Pilotti, ingressou no magistério com apenas 20 anos, motivado por sua paixão pela sala de aula. Além do amor pela profissão, Pilotti desenvolveu, desde a adolescência, habilidades de liderança, estando à frente das turmas e dos grupos estudantis. “Eu sempre tive esse perfil e também amava crianças. Então sempre gostei de ser professor. É minha paixão e minha vocação”, conta. Dessa forma, Pilotti cursou duas graduações, em Matemática e Ciências, fez pós-graduação em Matemática e Mestrado na área da Educação, na Argentina. “Para ser diretor de uma escola é preciso ter todo um jeito de lidar com as pessoas, com os funcionários, com os pais, alunos, professores, e com a comunidade, porque a escola não é minha, é da cidade”, afirma.
Ao longo dos seus 28 anos de carreira, o professor foi conquistando o carinho e a confiança das equipes escolares, assumindo cargos de diretoria em escola municipais e estaduais. Por 13 anos, integrou a direção do colégio Bom Retiro e, em 2019, foi escolhido para assumir interinamente a escola Alfredo Aveline. No mesmo ano, foi eleito oficialmente para dirigir a instituição até 2022. “Eu sou muito de vestir a camiseta. Doo-me muito para o ambiente que estou, não tenho horário, não tenho sábado, domingo, ou feriado. Se precisar servir lanche, varrer, substituir professor, eu faço. Eu me sinto responsável pelo ambiente que eu dirijo”, comenta. Durante seu mandato como diretor no Bom Retiro, Pilotti recebeu premiações e reconhecimentos pela atuação no cargo. “Eu gosto muito de fazer com que as pessoas se sintam bem no ambiente escolar. Gosto de conversar com os pais e com os alunos no corredor. Não sou um diretor de gabinete. Estou sempre circulando. Agora, com essa pandemia, tudo mudou”, lamenta.
Apesar da experiência no cargo, o diretor revela que gerir uma escola com 840 estudantes em meio a uma pandemia tem sido um desafio diário. “Não foi fácil porque foi algo de surpresa, principalmente essa questão dos professores, com as tecnologias digitais, e depois essa questão de voltar apenas uma parte dos alunos e os demais continuarem apenas no ensino remoto”, revela. “Além disso, é um desafio muito grande porque estamos acostumados com aquela rotina do recreio, com a troca de período. Estamos acostumados em dar um abraço nos pequenos, coisa que vai mudar agora com esse novo normal”, complementa.
A escola se organizou desde o início da pandemia dentro dos protocolos estabelecidos no âmbito municipal, oportunizando aulas a distância para aqueles com acesso à internet (mais de 95% dos alunos) e conteúdos impressos para os demais. “Trabalhamos com ligações constantes para as famílias, a fim de saber quem está conseguindo acessar os conteúdos, quem está fazendo as atividades… criamos grupos de WhatsApp com pais, professores e alunos. Então buscamos manter um contato para amparar a todos”, explica.
Para o ano que vem, o diretor comenta que será necessário um esforço dobrado para conseguir colocar o conteúdo atrasado em dia, mas poucos alunos deverão precisar repetir o ano. “Só irá repetir quem não fez nada, quem abandonou o barco. Esses não chegam a 1% de todos os estudantes”, afirma.
Mesmo sem previsão para o ano letivo de 2021, que dependerá muito da nova gestão que assumirá a prefeitura após as eleições desse domingo, 15/11, Pilotti afirma que a pandemia possibilitou algumas reflexões importantes dentro do cargo de diretoria. “Além de termos aprendido a lidar melhor com a parte da informática, acredito que esse período servirá para a valorização da figura do professor. Nenhum outro meio digital vai substituir a presença do professor em sala de aula, a troca de olhar entre ele e os alunos. Hoje, se existe qualquer profissão, é porque passou por um professor”, reflete.
“Tivemos que nos reinventar para incentivar o aluno a permanecer na escola”
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Rosalice Rossetti Morbini, diretora da escola Landell de Moura
A diretora Rosalice Rossetti Morbini atua há 29 anos no Colégio Estadual Landell de Moura. Ao longo dos anos, esteve em diferentes cargos dentro da escola, absorvendo experiências e conhecimentos que ajudaram a lhe tornar a profissional de hoje. “Juntei todo conhecimento da parte administrativa e humana que adquiri com os profissionais com quem trabalhei com o meu modo de ser. Agora, procuramos desenvolver um trabalho de excelência. Temos um grupo de professores bem engajados e nos sentimos em casa”, comenta Rosalice.
Para a profissional, uma instituição tem três linhas de atuação: a pedagógica, a financeira e a administrativa. “Eu conto com vices que me ajudam muito, mas o olhar do diretor tem que ser global. Quando eu assumi o cargo, sempre tive o objetivo de tornar o Landell uma escola de excelência, onde os alunos se sintam bem. Estamos localizados em uma área nobre da cidade, com 3 mil metros de área construída, bosque, pátio, área de esporte, campo de futebol… Os alunos abrem as janelas e veem os tucanos cantando”, comenta.
No calendário de 2020, diversas atividades e projetos estavam programados, mas precisaram ser suspensos por conta da pandemia. “A direção e os professores estão trabalhando dobrado. Tivemos que aprender a lidar com as tecnologias e a nos reinventar para incentivar o aluno a permanecer na escola. Esse é o principal desafio, fazer com que os estudantes não percam o vínculo com a instituição, que não desistam de estudar”, afirma.
Para tanto, está sendo realizada uma busca ativa diária dos estudantes. De acordo com a diretora, cerca de 80% dos alunos estão inscritos na plataforma escolhida pelo estado para as aulas on-line, e os demais têm retirado atividades na escola. “Estamos preocupados, primeiramente, com a saúde de todos. Em relação aos conteúdos, estamos priorizando a qualidade e não a quantidade de ensino. Fizemos um programa no qual visamos àquilo que realmente é necessário para o aluno seguir adiante. E ano que vem serão feitos reforços e retomadas de conteúdos”, explica.
De acordo com Rosalice, as mudanças têm sido grandes, assim como a necessidade de adaptação. “Procuramos incentivar as pessoas para que elas não fiquem tristes e não adoeçam. Temos que dar apoio às famílias, aos estudantes e aos professores, que acabam misturando suas vidas familiares com as dos alunos. E precisamos de muita calma e serenidade para conseguir superar esse momento e seguir no novo normal”, comenta.
Ainda não há definição de data para retorno das demais séries, mas a diretora destaca que a equipe está diariamente no local para prestar suporte aos pais e estudantes. “Estamos esperando os alunos ansiosamente e estamos preparados para enfrentar essa pandemia”, afirma. “Quero parabenizar e desejar um feliz Dia dos Diretores a todos os meus colegas e suas equipes, porque sozinhos não somos nada”, finaliza.
“A preocupação principal era como ficaria o direito de estudar das pessoas que não têm equipamentos e acesso à internet”
Diretor-geral do IFRS campus Bento, Rodrigo Monteiro
O diretor-geral do Instituto Federal do Rio Grande do Sul (IFRS) campus Bento, Rodrigo Monteiro, não conseguiu sequer sentir o gostinho de gerir a instituição em sua normalidade. Ele assumiu o cargo no final de fevereiro, juntamente com o diretor de Administração, Thiago dos Reis, com o diretor de Ensino, Tiago Goulart, com a diretora de Extensão, Raquel Scotton, com a diretora de Pesquisa, Pós-Graduação e Inovação, Luciana Bernd e com o diretor de Desenvolvimento Institucional, Jonatas Martins.
Há 13 anos lecionando no IFRS, o engenheiro agrônomo de formação comenta que a expectativa para 2020 era muito boa, mas que a pandemia acabou trazendo grandes mudanças ao ano letivo. “Então além do desafio do aprendizado de iniciar em um novo cargo, vieram mais os desafios da pandemia”, comenta.
Dessa forma, logo após a suspensão das atividades presenciais em março, a equipe diretiva formou um comitê local para prevenção e acompanhamento da COVID-19.
A decisão sobre como seria dado sequência às atividades pedagógicas foi tomada pelo Conselho Superior do IFRS. Foram cerca de cinco meses de discussão para, em meados de agosto, ser decidido pela retomada das ações acadêmicas a partir da oferta de Atividades Pedagógicas não Presenciais (APNPs). “Temos a missão social de atingir pessoas que são vulneráveis socialmente. Por isso essa era a preocupação principal: como ficaria o direito de estudar das pessoas que não têm equipamentos e acesso à internet?”, comenta.
Apesar da decisão majoritária em relação à continuidade do aprendizado, os diretores precisaram criar estratégias internas para manter o vínculo dos servidores e estudantes com o ambiente escolar e garantir suporte às famílias dos estudantes. O diretor de Desenvolvimento Institucional, Jonatas Campos Martins, afirma que a equipe pensou em não apenas atender as questões relacionadas ao campus, como também à sociedade. “Pensamos em aproveitar nosso conhecimento e expertise para poder minimizar o impacto para as famílias dos estudantes, para toda a comunidade e para os municípios vizinhos”, explica. Por meio de busca de recursos e doações, o campus auxiliou a sociedade com ações como produção de EPIs e doação de 50 mil litros de vinho para serem transformados em álcool. Também passaram a ser distribuídas cestas básicas, produtos de higiene e limpeza para as famílias dos estudantes mais vulneráveis.
Em relação ao ensino, a direção convidou os professores para que, voluntariamente, repassassem atividades aos seus alunos, a fim de manter o contato entre eles e a instituição. Também foram realizados encontros virtuais, contando com momentos culturais, entre servidores e estudantes. “Nossa preocupação era não deixar o aluno desassistido”, comenta o diretor-geral.
A equipe ainda aproveitou o momento de suspensão das aulas presenciais para colocar em dia demandas antigas de infraestrutura do campus. “Quando os alunos voltarem, terão mais laboratórios, mais salas de aula, novos equipamentos e uma rede de internet melhor”, revela o diretor de Desenvolvimento Institucional, Jonatas Campos Martins. As melhorias foram possibilitadas a partir de uma readequação no orçamento anual previsto para este ano. Com a suspensão nas atividades, os custos foram reduzidos em serviços como água, luz e alimentação.
Com orçamentos mais apertados anualmente e com os efeitos da pandemia que deverão perdurar pelo menos até o próximo ano, os diretores estão trabalhando exaustivamente para evitar grandes perdas de aprendizagem e para tentar tirar proveito dos aprendizados adquiridos. Na visão de Monteiro, a gestão de pessoas é o grande desafio dos diretores de instituições de ensino, principalmente diante de um cenário de pandemia, no qual as incertezas e a diversidade de opiniões afloram. “Essa pandemia trouxe aprendizados na questão administrativa, com a fluidez de processos por meio eletrônico, mas também está nos ensinando sobre relacionamento com as pessoas”, analisa.
Para o diretor de Desenvolvimento Institucional, Jonatas Campos Martins, a pandemia reforçou ainda mais a capacidade de adaptação do ser humano, tendo que mudar completamente a forma de viver neste período. “Além disso, o distanciamento social evidenciou e valorizou a importância do convívio”, complementa.
“Por fim, quero destacar que os desafios foram minimizados pela excelente equipe diretiva com quem estamos tendo a oportunidade de aprender e de conviver. Pessoas extremamente profissionais e compromissadas. Deixo meus cumprimentos a todos pelo dia do Diretor”, finaliza Monteiro.
Fotos: Eduarda Bucco