EJA: uma opção para continuar os estudos

A noite vem chegando e, com ela, o sonho de um grupo de estudantes começa a ganhar forma. Para eles não existem obstáculos que os desviem do seu caminho. Após anos sem estudar, por diversos motivos, seis alunos da modalidade de Educação de Jovens e Adultos (EJA) da Escola Estadual de Ensino Fundamental General Bento Gonçalves da Silva, com idade entre 21 e 51 anos, estão aprendendo a escrever, ler e fazer cálculos. Apesar de terem dificuldade na aprendizagem, buscam força na amizade e no carinho em ensinar da professora para dar o próximo passo rumo à satisfação pessoal.

O EJA é desenvolvido em sete escolas no município e atende cerca de 600 alunos, tanto na rede municipal quanto na estadual. Na Escola Bento, é oferecida da alfabetização à 8ª série. Nas turmas das totalidades 1 e 2, que correspondem aos quatro primeiros anos do Ensino Fundamental, estão inscritas 23 pessoas. “A maioria dos alunos têm mais de 20 anos. A turma é composta praticamente por adultos, que voltaram a estudar e são bastante interessados e persistentes. Nessa turma, cerca de 13 alunos frequentam a aula com maior assiduidade. São esforçados e, mesmo com as dificuldades, nunca desistem”, descreve a professora Silvia Pomatti Sonza, que durante a tarde ministra aula para alunos do 5º ano.

Conforme Silvia, cada aula é planejada individualmente. “É uma turma bem heterogênea. Cada um tem sua dificuldade. Alguns já conseguem ler, outros estão evoluindo, mas todos têm bastante força de vontade. Cada dia o planejamento de aula é pensado de forma individual, mais específico para poder sanar as dificuldades de cada um. É muito bom trabalhar com eles”, enfatiza.

Para ingressar em uma das turmas do EJA é necessário ter no mínimo 15 anos, para Ensino Fundamental; e 18 anos para Ensino Médio.


“No início, eu tinha vergonha de participar”

A aposentada Marlise Bohn, de 49 anos de idade, moradora do bairro Santa Helena, estudou apenas até a 4ª série do Ensino Fundamental. Por trabalhar no interior, foi tirada cedo da escola para ajudar em casa. Casou, teve filhos e os estudos sempre foram deixados de lado. Há alguns anos, após ter câncer de mama e passar por quatro cirurgias, não teve como voltar a trabalhar. Ao ser diagnosticada incapaz para o trabalho pelo INSS, recebeu o conselho de um médico para que retomasse os estudos. “No início tive vergonha. Fiz minha matrícula, mas não apareci nas duas primeiras semanas. Pensava: ‘o que eu, velha, vou fazer no meio dos jovens?’ Eu não gostava de estudar, mas agora estou adorando”, descreve. Marlise pretende continuar os estudos até concluir a escola. Mãe de quatro filhos, sempre os incentivou a estudarem. Atualmente frequenta a mesma escola que uma das filhas. “Agora não paro mais. Meus colegas são muito legais e a professora  é bem divertida. Temos um bom relacionamento e nos tratam de forma igualitária, aqui ninguém é diferente do outro. Daqui para frente espero que tudo melhore. Continuo fazendo o tratamento contra o câncer, mas só falto à aula quando estou mal”, enfatiza. Ela está na chamada totalidade 2, que representa a 3ª e 4ª série do Ensino Fundamental. Além de frequentar as aulas, no noturno, durante o dia realiza curso de informática.

 
“Passei doze anos sem estudar, agora quero recomeçar”

Jeferson Luís Cordeiro, 25 anos de idade, natural de Santana do Livramento, parou de estudar no ano de 2000, não por opção, mas por necessidade de ajudar os pais a sustentar a família. Na época, havia iniciado os estudos na 5ª série. Após se mudar para Bento Gonçalves e começar a trabalhar em uma empresa de móveis, voltou a estudar. “Eu queria e a empresa me incentivou. Faz uns três meses que voltei a frequentar o colégio. Hoje em dia, ninguém é nada sem estudo”, enfatiza.

Cordeiro mora no bairro Santa Rita e, mesmo depois de passar o dia inteiro trabalhando, não desanima com a distância para se deslocar até o centro, para estudar. “Primeiro quero terminar os estudos e depois fazer um curso profissionalizante. Estou aprendendo muita coisa e retomando algumas que eu já sabia, mas havia esquecido. Agora já não tenho mais dificuldade para ler, escrever e fazer cálculos”, relata.

 
“Meu pai nunca me deixou estudar”

Natural de Guarujá, São Paulo, Leobina Lima dos Santos (foto acima), de 51 anos de idade, está aprendendo a ler e escrever. Quando jovem, seu pai não a deixou estudar. A primeira vez que frequentou a escola foi depois de ter criado uma família, quando adulta. Moradora do bairro Fátima, desde 2009, recomeçou os estudos no final de 2011, por incentivo dos filhos. “Em São Paulo, antes de me mudar, até frequentei a escola, mas devido a um acidente, bati a cabeça e acabei esquecendo algumas coisas que havia aprendido. Tenho muita dificuldade para aprender, mas não deixo de vir à aula”, relata.

Leobina conta que no início tinha bastante vergonha de frequentar a aula, mas agora, com a convivência com os colegas e com a persistência da professora, deixou isso de lado e está adorando estudar. “Sem estudo não se vai a lugar nenhum. Já perdi emprego por não ter o Ensino Médio completo. Os trabalhos melhores são destinados para pessoas que têm estudo. Agora só falto quando estiver doente. Estou fazendo um curso para cuidar de criança e tenho que terminar meus estudos o mais rápido possível”, enfatiza. Sua meta é que até o final do ano esteja lendo, sem dificuldades.

Apesar de não ter estudando quando mais jovem, Leobina sempre incentivou os filhos a estudar. “Quando falo com meus netos, que moram em São Paulo, sempre procuro saber como eles estão na escola e dou duro para que eles estudem bastante”, conta.

 
“Meu sonho é terminar a escola”

Com 10 anos de idade, ainda quando morava em Água Santa, na região noroeste do Estado, Loreci Melo de Oliveira Monik parou de estudar após ter crises convulsivas. A decisão foi do pai, que foi orientado por um médico. Ela cursou somente até a 1ª série do Ensino Fundamental. Há pouco mais de quatro anos, retomou os estudos e, mesmo com a doença, nunca desistiu. “Voltei porque meu médico atual me orientou. Depois que retomei os estudos fiz ainda uma operação na cabeça, por causa da doença. Algumas coisas me fogem da memória, mas não quero desistir, meu sonho é terminar a escola”, descreve.

Hoje com 42 anos, Loreci não desiste, frequenta a totalidade 2, correspondente ao 3º e 4º ano do Ensino Fundamental, e mesmo com os problemas de saúde, procura nunca faltar às aulas. “Tomo diariamente 11 medicações diferentes e irei passar novamente por uma cirurgia para conter os ataques. Venho sempre que estou boa, nunca desisto, quero uma vida melhor e aprender a ler”, destaca.


“Estudar é tudo na vida”

Com 24 anos de idade, Gregori de Oliveira Pereira voltou a estudar no ano passado. Quando morava em Viamão, cursou apenas até a 4ª série, interrompendo os estudos aos 16 anos, quando começou a trabalhar. Após se mudar para Bento, matriculou-se novamente. Hoje ele trabalha em uma empresa de serviços elétricos e frequenta a totalidade 2, que representa a 3ª e 4ª série do Fundamental. “Pretendo terminar o colégio e fazer um curso para que eu possa trabalhar com o meu pai”, relata. Ele ainda tem um pouco de dificuldade para ler e realizar contas de dividir e multiplicar. Com o apoio da professora e dos colegas, busca superar as dificuldades. “Meus pais e minha irmã são os meus grandes incentivadores. Estudar é tudo na minha vida”, pontua.

 
“Adoro a professora e os colegas”

A jovem Karina da Silva, de 21 anos de idade, é moradora do bairro Maria Goretti, e conta que sempre teve vontade de estudar. Neste ano, ela conseguiu retomar as tão sonhadas atividades. Ela já havia estudado, também no sistema de Educação de Jovens e Adultos (EJA)  em uma escola no bairro Zatt. Atualmente, frequenta a totalidade 1, referente à 1ª e 2ª série do Ensino Fundamental e conta que prefere atividades que envolvem o ensino da língua portuguesa. “Adoro fazer as atividades de português, como cruzadinhas e pintura. Mas o que mais gosto é dos colegas e da professora. Ainda tenho um pouco de dificuldade para fazer cálculos, mas não pretendo parar, quero terminar a escola”, enfatiza.

 
Escolas que oferecem o EJA em Bento

*Escola Municipal Professora Maria Borges Frota – Rua Pastor João R. de Jesus, 192 – Bairro Zatt

*Escola Municipal Ulysses Leonel de Gasperi – Rua B, 189 – Bairro Glória

*Escola Municipal Professora Maria Margarida Zambon Benini – Rua Arnaldo Audibert, 61 – Bairro Vila Nova

*Escola Estadual General Bento Gonçalves da Silva – Rua Benjamin Constant, 229 – Centro

*Escola Estadual Imaculada Conceição – Rua Livramento, 115 – Bairro Conceição

*Colégio Estadual Dona Isabel – Rua Padre Raul Accorsi, 300 – Bairro Universitário

*Núcleo de Educação para Jovens e Adultos e Cultura Popular (Neeja), junto à Escola Estadual Anselmo Luigi Piccoli –  Rua Joana G. Tonello, 940 – Bairro Cohab 2

 

Reportagem: Katiane Cardoso

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