ENEM 2022: uma prova decisiva, mas ainda com problemas

A nova edição do exame foi aplicada para milhões de estudantes que sonham com o Ensino Superior e suas possibilidades

Foto: Reprodução Internet

Nos dias 13 e 20 de novembro, estudantes de todo o Brasil participaram da 25ª edição do Exame Nacional do Ensino Médio, o Enem. Com mudanças na sua estrutura – agora a prova também pode ser feita no formato on-line – ao longo dos anos, o exame se consagrou como um dos principais meios das pessoas adentrarem em universidades públicas e particulares. Afinal, programas como o Sisu, ProUni e FIES dependem da nota do Enem para concederem bolsas e acessos às instituições de ensino pelo país.

Nesta edição, no total, foram mais de 3,3 milhões de inscritos, número bem menor se comparado aos recordes de 2014 e 2016, quando quase nove milhões de pessoas se inscreveram para realizar o teste. No Rio Grande do Sul foram mais de 146 mil inscritos. Um deles foi a professora Nathália Casagrande, de 26 anos e que saiu do Ensino Médio em 2014. Anos longe dos estudos, a jovem decidiu que era a hora de enfrentar a prova por uma terceira vez, agora, mais tranquila. “Essa foi a primeira prova que me senti madura pra fazê-la”, afirma.

É comum que a maioria do público presente para realizar as provas seja de jovens que estão no Ensino Médio ou perto de concluí-lo. Segundo Nathália, na sala em que prestou a prova estavam diversos adolescentes nervosos e ansiosos, todos preocupados em ter um bom desempenho. Longe do ambiente escolar há oito anos, a professora acredita que esse seja um dos pontos negativos da prova: a pressão em cima de jovens – talvez ainda indecisos do que fazer da vida – para que se saiam bem. “[A prova] tem me feito fazer várias reflexões sobre o quão é válido um aluno/aluna ser avaliado a partir desse método”, destaca.

As provas

Quem também enfrentou os dois dias de Enem foi o jovem Eduardo Ribeiro Nalin, de 18 anos, estudante do 3º ano do Ensino Médio em Bento Gonçalves. Segundo ele, o nível de dificuldade das questões não estava absurdo, o que atrapalhou mesmo foi a falta de tempo. No primeiro dia, com redação, linguagens e ciências humanas, os participantes tinham 5h30. No segundo, com matemática e ciências na natureza, 5h foram disponibilizadas.

“A prova em si não é algo complicado de ser realizado. A grande dificuldade é o alto número de questões e a quantidade de textos para serem lidos e interpretados, mais os cálculos a serem feitos, isso sem contar a redação. Ter que realizar todas essas tarefas em um período de cinco horas é realmente desafiador e cansativo”, destaca.

O estudante acredita que aqueles que realmente estudaram e se dedicaram conseguiram realizar as questões e não devem ter encontrado dificuldades. “Não havia aquelas questões impossíveis de serem resolvidas, mas também não eram simples demais, a prova estava equilibrada nesse quesito.”

Para o professor e diretor de curso preparatório para Enem e vestibulares Vagner da Cruz, a prova teve suas características tradicionais, mas apresentou falhas, principalmente em questões trabalhosas, que tiraram tempo precioso dos alunos. “A prova de Química, por exemplo, não conseguiu contemplar vários conteúdos. Parece que a prova não foi muito bem elaborada. Em 15 questões, caíram duas com o mesmo conteúdo e outros conteúdos ficaram de fora”, pontua.

Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

A redação

Um ponto positivo, de acordo com o professor, foi o tema da redação. Neste ano, em no máximo 30 linhas, os estudantes tiveram que discorrer e apresentar uma proposta de intervenção sobre o tema “Desafios para a valorização de comunidades e povos tradicionais no Brasil”, que poderia incluir qualquer grupo originário do país, seja indígenas, quilombolas, entre outros.

“O tema de redação, dentro das características da prova, fez um chamado para reflexão em relação aos povos tradicionais, aos povos originais do Brasil. Foi uma questão bem relevante trazer a pauta dessa discussão dos povos que não somente os povos indígenas. Cada região, praticamente, tem seus povos tradicionais”, pontua Cruz.

Para Nathália, que procurou estudar e focar nas estruturas de uma redação, o assunto proposto foi uma grata surpresa. “Achei o tema de muita relevância e um tema em que eu sabia me expressar.” Junto à proposta de redação são anexados textos e informações que podem ajudar os alunos a escreverem de forma mais tranquila. Para Nalin, essa foi uma ajuda necessária, visto a surpresa com o tema apresentado. “As informações que estavam na prova foram muito úteis e facilitaram no desenvolvimento da redação.”

COVID-19 e Enem

É fato que a COVID-19 afetou a educação de uma forma nunca antes imaginada. Com dois anos de estudos em casa, estudantes, professores e comunidade escolar sofreram para ficar de pé. Também é fato que muitos tiveram o ensino prejudicado e defasado. Contudo, de acordo com o professor e diretor Vagner da Cruz, o Enem não levou em consideração esse fato. “A gente espera que os alunos ainda tenham sequelas dessas lacunas que ficaram de 2020/2021. Isso aí é inevitável e não houve nenhum tipo de consideração com relação a isso […] mas não foi uma questão do Inep [Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas], foi uma questão geral. Todo mundo sabe que havia um problema, todo mundo sabia que tinha um problema sério em relação à educação [na pandemia], mas isso não foi ponderado”, afirma.

Os resquícios da pandemia podem ter levado a uma alta taxa de abstenção. No primeiro domingo, 26,7% dos inscritos deixaram de fazer a prova, número pouco maior que na edição de 2021 (26%). No segundo domingo, a abstenção chegou a 32,4%. Com um número menor de inscritos e uma alta abstenção, leva-se a pensar se ainda vale a pena realizar a prova. Para Nathália, o Enem ainda é válido e abre oportunidades, mas precisa levar em consideração a realidade dos estudantes brasileiros. “Acredito que pode ser mudado a sua forma de aplicação, sabendo que nem todas as escolas do Brasil tem o mesmo nível de preparo”, diz. O jovem Eduardo Nalin concorda. “É uma oportunidade de ouro para quem não tem as melhores condições financeiras para ingressar em uma faculdade federal, mas algumas alterações devem ser feitas, talvez com um incentivo maior por parte de quem aplica as provas e algumas mudanças na estrutura dela.”

Para Vagner, o Enem pode levar o estudante dedicado, que entende a dinâmica da prova, que se testa e a testa, para longe – incluindo outros países, que utilizam da nota do Enem para conceder bolsas –, mas precisa de melhoras e adaptações. Além disso, ainda é uma porta de entrada muito importante para o Ensino Superior. “O Enem te abre uma possibilidade além daquela que o aluno costuma pensar, como uma vaga numa universidade federal. É bem mais amplo do que isso.”