Entidades captam recursos, mas nova lei impede que sejam usados

Pouco mais de R$ 1 milhão – mais precisamente R$ 1.064.972,04 –, destinado por empresas e pessoas físicas através da dedução de Imposto de Renda, está bloqueado na conta do Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente (Comdica) e não pode ser usado pelas entidades beneficiadas pelo Fundo Municipal, entre as quais Bento Vôlei, Pelotão Curumim e Abraçaí. Isso porque a prefeitura de Bento Gonçalves passou a cumprir a Lei Federal 13.019/2014, que entrou em vigor em janeiro deste ano. As entidades, porém, cobram os repasses, alegando que um artigo da legislação (disposições transitórias) permite que as regras valham para parcerias firmadas no ano passado.

A polêmica ganhou corpo na última sexta-feira, dia 31, quando o Bento Vôlei anunciou o encerramento das atividades do seu projeto social, o Sacada Solidária, por falta de repasse dos recursos. Mais de 600 crianças deixaram de ser atendidas desde então, causando protesto de alunos e familiares.

Em coletiva de imprensa realizada na última segunda-feira, dia 3, o Bento Vôlei afirmou que a decisão de encerramento das atividades é a única solução, tendo em vista que não há como pagar as despesas, de aproximadamente R$ 27 mil mensais, para o atendimento das crianças. A indignação é ainda maior porque ao longo de todo o ano de 2016 dirigentes se empenharam em captar os recursos, via dedução de impostos, junto a empresas, instituições financeiras e empresários. “A gente captou R$ 390 mil para atender até 800 crianças neste ano. Hoje, não temos acesso a esse dinheiro, não temos como manter o projeto e ainda ficamos envergonhados diante daqueles para quem pedimos dinheiro”, confessa o presidente do clube, Marcos Paulo Machado.

Novas regras terão que ser cumpridas
Já a prefeitura alega que as instituições sabiam que a lei entraria em vigor neste ano e que, para receberem os recursos, teriam que se adequar às novas regras. “A concessão de auxílio mudou completamente. Para recebê-los, a entidade tem que dar uma contrapartida de serviço público. Vai se assemelhar muito ao processo de licitação. As associações que têm o mesmo fim irão concorrer entre si. Todos os projetos vão passar por uma comissão, que já está formada, para ver se estão capacitadas para receberem a verba e serão fiscalizadas ao longo de todo o contrato. A nova lei está mais transparente, porém, mais burocrática”, explica o secretário-adjunto de Finanças, Heitor André Tartaro. “O caso do Bento Vôlei é um pouco mais simples, já que, a priori, não existem outras que oferecem o mesmo tipo de atendimento – aulas de vôlei no contraturno escolar. O clube, aliás, está regular, apenas precisará se adequar à nova legislação”, explica.

Heitor reitera que a prefeitura vai trabalhar “dentro da legalidade” e que não há outra alternativa a não ser as entidades entregarem os projetos de acordo com legislação vigente. Ele também afirmou que, assim que as instituições fizerem as mudanças nos projetos, se aprovado, o repasse pode ser destinado em até 30 dias. 
Até lá, porém, o Bento Vôlei promete não retomar as atividades. De acordo com a diretoria, frequentemente o clube vem sendo onerado financeiramente por promessas, causando prejuízos para os cofres da entidade e deixando de pagar profissionais que se dedicam a atender centenas de crianças. 

Na última quinta-feira, dia 6, a prefeitura convocou uma reunião com líderes, conselheiros e jurídicos de instituições para reiterar que cumprirá a lei e entregará formulários que facilitam a adequação às novas regras.

ENTENDA O CASO

A Lei Federal 13.019/2014 recebeu uma série de modificações em 2015 – alguns artigos foram incluídos, outros revogados. Em função das eleições, para os municípios a lei só entrou em vigor no dia 1° de janeiro de 2017. Um edital publicado em 2016 pelo Comdica aprovou o projeto de várias entidades de Bento Gonçalves que captaram, segundo informações passadas pelas instituições, o equivalente a R$ 1.064.972,04 em dedução de Imposto de Renda. Os recursos, porém, agora estão bloqueados, porque os projetos não estão de acordo com a nova legislação. A prefeitura diz que deve seguir dentro da legalidade e que as entidades devem readequar os projetos com as novas normas do estatuto. As instituições, por sua vez, alegam que o artigo 83 da lei, que são as disposições transitórias, diz que as parcerias que se iniciaram no ano anterior à entrada em vigor desta lei se aplicam à legislação anterior. O impasse acarretou no encerramento do projeto Sacada Solidária, do Bento Vôlei (foto), que atende mais de 600 crianças em 11 núcleos na cidade, e comprometeu atividades em diversas outras entidades.

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