Falta de matéria-prima, aumento no custo da produção e incapacidade de atender consumidor preocupam setor moveleiro

Desde o ano passado, o setor produtivo tem sofrido com recorrentes falta de matéria-prima, aumento no custo da produção – por conta da desvalorização do real, que faz fornecedores optarem pela exportação ao abastecimento do mercado interno – e sentido os impactos do desabastecimento no faturamento. Por conta disso, a Associação das Indústrias de Móveis do Estado do Rio Grande do Sul (Movergs) divulgou um manifesto clamando pela colaboração da cadeia de fornecimento e união política para amenizar os problemas.

De acordo com o presidente da entidade, Rogério Frâncio, as perdas ocorridas no ano passado estão cada vez mais difíceis de serem revertidas. O setor moveleiro gaúcho teve um crescimento de 9,1% em 2020 em comparação ao ano anterior e o polo moveleiro de Bento Gonçalves, que responde por 27,2% do faturamento do Estado, cresceu 10,9% nesse mesmo período. Entretanto, o desempenho do setor em 2020 demanda uma leitura mais aprofundada levando em conta o aumento nos custos de produção. “No momento, a indústria enfrenta faturamento real negativo, margens deprimidas, falta de matérias-primas, baixos estoques e consequente incapacidade de atender a demanda do consumidor. É crescente nossa preocupação com o aumento nos custos de produção, bem como redução nas cotas de aquisição para matérias-primas. Esse ritmo de aumento dos preços está penalizando a indústria moveleira de forma severa, podendo inviabilizar muitas operações e prejudicando o setor como um todo”, avalia o dirigente.


 

REIVINDICAÇÕES
Para poder reverter essa situação, o setor reivindica o acesso amplo e urgente das vacinas para a população. Já do ponto de vista estratégico, a entidade aponta que é necessário que haja melhorias no ambiente econômico e negócios, com a reforma tributária que a entidade reivindica historicamente. “Além disso, a Movergs está pontualmente solicitando isenção dos impostos de importação de chapas de madeira”, destaca.

Mesmo com estas dificuldades, Frâncio destaca que a indústria de móveis vai permanecer com um bom ritmo no varejo em 2021. “Estamos projetando um crescimento de 4% no faturamento do setor moveleiro gaúcho, sempre com a ressalva das incertezas do momento. Em verdade, esse viés é negativo tendo em vista o recrudescimento da pandemia e dificuldades da retomada econômica”, pontua.


 

“Os preços estão ficando insuportáveis”

Empresários do setor moveleiro confirmam o cenário de dificuldades. De acordo com o diretor da Casttini Móveis, Vitor Agostini, existe um grave problema em relação ao fornecimento de matéria-prima. “A cadeia produtiva está desabastecida e a produção não consegue atender a demanda. Até o momento, nós ainda estamos conseguindo atender todos os pedidos, pois sempre tivemos um estoque regulador em nossa empresa e nossos fornecedores atenderam e deram preferência a quem tinha um histórico de compras”, explica.
Vitor explica que impacto da alta do dólar para quem exporta é positivo, mas quem atua somente no mercado interno está sentindo no bolso o aumento de insumos. “Praticamente todos os meses acontecem mudanças nos valores e os custos estão ficando insuportáveis, e isso reflete na ponta, pois as vendas estão cada vez mais difíceis de acontecer”, desabafa. Ele comenta que tem matérias-primas que chegaram a ter 50% de reajuste.


 

PERDA PRODUTIVA INCALCULÁVEL
Vinícius Geremia, diretor-geral Gebb Work Indústria de Móveis, aponta que a perda produtiva do ano passado pra cá é “incalculável”. “Aconteceu de colocarmos o pedido para a produção e quando estava quase tudo pronto não chegava material de embalagem. Com isso, além de atraso nas entregas, a gente não podia faturar aquele pedido no dia”, detalha ele, comentando que os produtos mais concorridos pelas indústrias são MDP e MDF, matérias-primas principais da cadeia produtiva.
Atualmente, de acordo Geremia, o cenário é um pouco melhor em relação ao ano passado, mas ainda enfrenta problemas. “Hoje o que mais estamos com dificuldade é em relação a painéis e materiais de embalagem, pois as fábricas ainda não conseguiram dar conta do excedente de produção. Eles ainda estão nos entregando esse material, mas somente a média de compra dos últimos 12 meses. Ou seja, não conseguimos comprar a mais, o que acarreta em perdas de pedidos”, explica.

Quanto ao aumento do dólar, Geremia afirma que o impacto no preço da matéria-prima é preocupante. “Muitos materiais, apesar de serem produzidos no Brasil, têm como base matérias-primas importadas, o que acarretou em aumentos exponenciais, fazendo com que a gente tenha que repassar preços e criar novas tabelas mensalmente”, comenta.
O aumento do custo de produção e do dólar também acarretou na parada de investimentos no setor. “Hoje a gente depende muito de tecnologias estrangeiras, software, peças e máquinas, por exemplo, e, por conta do custo, inviabiliza investir em novas linhas de produção. Temos várias demandas na nossa empresa, mas a gente fica esperando a situação normalizar, mas parece que ela só piora. Tudo isso tem retardado os investimentos que precisamos fazer”, comenta.
Outro apontamento é que indústrias de material primário, como aço e painéis, têm optado por exportar a vender para o mercado interno. “A margem fica bem atrativa para estas grandes companhias e isso faz com que além de termos uma piora na escassez do produto, também tem a elevação do preço por conta da oferta e demanda”, explica Geremia.
Para tentar reverter essa situação, o setor cobra vacinação em massa, controle da inflação e do envio de matérias-primas para outros países, reforma tributária e, mais do que nunca, “acabar com o coronavírus para ter nossa vida normal de volta”, conclui Geremia.