Horário de verão entra novamente em discussão no país

Nas últimas semanas, o retorno do horário de verão entrou novamente em discussão no Brasil. Alguns empresários do setor de turismo, restaurante e comércio entraram em um movimento pedindo o retorno da medida. “O fato de ganharmos uma hora durante o dia faz com que a roda da fortuna gire mais e influencia positivamente toda economia, principalmente setores importantes, como o turismo, bares, comércios, restaurantes e automaticamente gera mais empregos também nas indústrias”, escreveu Luciano Hang, dono das lojas Havan, em sua conta no Instagram no dia 03/07. Alguns especialistas também avaliam o retorno do horário de verão como uma forma de aliviar a crise hídrica vivenciada atualmente no país, que têm elevado os gastos com geração de energia.

A medida que adiantava o relógio em uma hora durante os meses de verão foi extinta em 2019 pelo presidente Jair Bolsonaro, com a alegação de que não apresentava mais uma economia de energia significativa e que poderia causar prejuízos à saúde da população.  Além disso, segundo o Ministério de Minas e Energia, devido a mudanças nos hábitos de vida dos brasileiros, o horário de maior consumo de energia passou do período da noite para o meio da tarde. E apesar da pressão por parte de alguns empresários, o presidente voltou a afirmar no dia 06/07 que não irá retomar a medida. 

Em Bento Gonçalves, alguns empreendedores do setor gastronômico também se mostram contrários à volta do horário de verão, principalmente aqueles que atuam no período da noite. O proprietário de uma cervejaria e pub, por exemplo, que preferiu não ser identificado, afirma que o horário de verão atrasa a chegada dos clientes e prejudica o faturamento. “Com mais tempo de sol, a galera tende a vir mais tarde”, esclarece. 

O empresário do setor gastronômico Airton Rigotti afirma que, apesar de pessoalmente preferir o horário de verão, para o seu negócio a medida se torna onerosa. “Nosso expediente tem início às 19h. Hoje eu tenho uma alta demanda no período das 19h30, mas com o horário de verão, essa demanda iria para às 20h e 20h30, então eu fico com esse período das 19h ocioso”, comenta o empresário. Quando o horário de verão estava em vigor, Rigotti conta que precisou fazer diversas promoções para atrair os clientes ao horário das 19h. “Outro problema é que todos acabam chegando ao mesmo tempo. Sem o horário de verão os clientes aparecem em horários mais dispersos, o que é ainda mais importante nesse momento de pandemia que estamos vivendo”, complementa. 

Em termos de economicidade, o professor de Economia da Universidade de Caxias do Sul (UCS) Mosar Ness acredita que a decisão de acabar com o horário de verão tenha sido assertiva. “Não se observava mais uma economia de energia que fosse crescente e efetiva ao longo dos últimos anos”, analisa. “O que de fato impactará no futuro da geração de energia será a autogeração a partir de placas fotovoltaicas, instaladas nas residências e nas indústrias, que deverão se popularizar nos próximos anos e contribuir para a redução da dependência de grandes plantas geradoras de energia elétrica”, complementa. 


Foto: Reprodução/Internet
 

Sobre o horário de verão

O horário de verão no Brasil foi adotado pela primeira vez em 1931, por decreto do então presidente Getúlio Vargas. Ao longo dos anos seguintes, sua implantação foi feita de forma esporádica, sem critérios científicos definidos. Após 18 anos sem que o horário de verão fosse adotado, essa medida voltou a vigorar no verão de 1985/1986, como uma das ações tomadas pelo governo por causa do racionamento causado, na época, pelo baixo nível dos reservatórios das hidrelétricas. Desde então, o horário de verão foi adotado anualmente, sem interrupções. 

“O motivo que levou Vargas a adotar o horário de verão refere-se ao fato de que, com a quebra da bolsa de Nova York, nossas exportações de café caíram abruptamente. Sem divisas para comprar petróleo e com grande parte da geração de energia dependendo de sistemas térmicos, o escalonamento do consumo foi bem-vindo. Assim, podia se manter os motores em uma rotação mais baixa, consumindo menos combustível e gerando energia elétrica”, explica o professor Mosar Ness. 

Até 2007, a duração e a abrangência do horário de verão por estados eram definidas anualmente por decreto da Presidência da República. Em 2008 foi publicado o decreto n° 6558 que definiu regras para as datas de início e término do horário de verão no Brasil, começando no terceiro domingo de outubro e encerrando no terceiro domingo de fevereiro – exceto quando coincide com o domingo de Carnaval. Até 2018, em sua última configuração, o horário de verão foi adotado nas regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste.

Ao longo dos anos, o horário de verão passou por diversas fases e se ajustou às necessidades do país. No início, o intuito era racionalizar o consumo de combustível. “Já a partir de 1985 o objetivo foi desconcentrar o horário de pico do consumo para que o sistema operasse com folga, não aquecesse e assim fosse mais confiável sua operação. Sem riscos de desligamento automático do sistema”, relata Ness. 

Atualmente, “com a construção de novas linhas de transmissão e um período regular de chuvas”, o professor avalia que a economia do horário de verão não é mais significativa e que sua manutenção teria se tornado onerosa à sociedade. Além disso, ele complementa que a mudança do horário, apesar de beneficiar atividades ao ar livre, como a prática de exercícios físico, interfere no ciclo biológico das pessoas. “Aí você tem trabalhadores sonolentos e cansados ao fim do dia, com uma produtividade ainda menor”, esclarece. 

Conforme o professor de economia, o motivo que levou à redução da economicidade foi a mudança de hábitos das pessoas, “que aumentaram a renda, passaram a consumir mais eletrônicos e eletrodomésticos. O passeio ao ar livre foi substituído pelo shopping climatizado. A nossa sociedade tem hoje uma gama muito maior de equipamentos que se, de um lado, aumentaram o conforto, de outro elevaram o consumo de energia elétrica”, explica.