Luto prolongado – um novo diagnóstico a ser considerado na área da saúde
Franciele Sassi – Psicóloga Clínica
Importante, antes de tudo, enfatizar que luto não é doença, mas sim um processo natural que ocorre diante do rompimento de um vínculo com algo ou alguém. Essa é a ligação principal que devemos fazer: se teve vínculo, então, terá luto. Seus sintomas e reações são esperados e genuínos, justamente porque nunca estaremos preparados para perder uma pessoa que amamos. Sofremos muito com as mudanças que a perda nos impõe, por isso choramos, nos desanimamos, não temos fome ou então a temos em demasia, sentimos raiva, pesar, sono e cansaço excessivos ou então não conseguimos dormir, apresentamos sensações físicas e corporais como dores no peito e na barriga, entre tantas outras condições. Perder pode nos desorganizar por um tempo, justamente porque abrange todas as dimensões humanas: física, biológica, psíquica, social, espiritual. O grande desafio sempre é entender até que ponto isso tudo é “normal” ou se torna fator complicador.
Em 2022, os manuais diagnósticos utilizados pelas áreas da saúde (DSM V-TR e CID 11) reconheceram o que hoje atualmente chamamos de Transtorno de Luto Prolongado, que se trata de um transtorno mental decorrente da extensão dos sintomas de luto por períodos maiores do que os considerados entre 6 a 12 meses e de acordo com os critérios levantados pelos manuais. O Transtorno de Luto Prolongado, assim, causa dor constante no enlutado e o impossibilita, incapacita de reestabelecer sua vida de maneira funcional. Os sintomas são parecidos com os da depressão, mas vale lembrar sempre que luto não é depressão, porque a grande diferença é que no luto o gatilho da dor e do sofrimento é a perda, enquanto não é o caso específico da depressão, onde muitas vezes a angústia não tem causa aparente perceptível pelo indivíduo.
Enquanto que no luto considerado “normal”, a dor aguda também existe, mas vai sendo ressignificada com o passar do tempo e os sintomas oscilam entre a perda e o investimento na vida, no luto prolongado, o enlutado permanece sempre mais voltado para a perda e não consegue enxergar possibilidades de retomar a vida. Os sintomas podem envolver dificuldade de concentração, de produzir, desvalorização da vida e perda de sentido, e impotência.
O lado positivo do reconhecimento científico acerca de complicações do processo de luto possibilita que esta experiência seja devidamente validada pela sociedade e seja considerada com mais seriedade acerca dos prejuízos que as pessoas podem ter na vida pessoal e interpessoal, nas relações de trabalho, etc. Em suma, o diagnóstico dá direitos legais e sociais aos enlutados, autoriza e valida suas reações, entre outros benefícios, por assim dizer. Por outro lado, também entendo que há um longo caminho pessoal e também profissional para tratarmos deste assunto sem a tendência de patologizar o luto, porque não podemos negar que a sociedade apresenta dificuldades de lidar com a dor e tenta evitar o contato com o sofrimento. Logo, o risco de diagnósticos equivocados e precoces também se torna maior. E, por consequência, medicações prescritas de forma ineficiente também. Nestes casos, vale sempre buscar mais de uma opinião. E, principalmente, contatar profissionais capacitados especificamente nos trabalhos com luto e que possam aprofundar as avaliações clínicas.
Franciele Sassi – Psicóloga Clínica
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