Marco sanitário: esgoto tratado deve virar realidade em Bento no mês de maio

Bento Gonçalves conta com mais de 121 mil moradores e, assim como outras centenas de municípios brasileiros, ainda vê todo o seu esgoto sendo despejado nos rios e arroios, sem tratamento. Mas após anos de discussão, planejamentos e obras, a primeira Estação de Tratamento de Esgoto (ETE) deverá entrar em funcionamento em maio – um verdadeiro marco sanitário para Bento Gonçalves. A estrutura localizada na ERS-444, no bairro Barracão, atenderá toda a região Sul do município, o que corresponde a cerca de 30% da população – mais de 35 mil habitantes. Poderão se beneficiar da estação residências dos bairros Imigrante, Santa Marta, Santa Helena, Fátima, Santo Antão e parte do Botafogo. “Essa estação foi designada para a parte Sul porque foi a região que mais cresceu nos últimos anos, principalmente por conta dos novos loteamentos. E também foi levado em conta que o esgoto dessas residências deságua no arroio Barracão, onde a gente capta parte da água para tratar e disponibilizar para a população”, comenta o gerente da Corsan de Bento, Marciano Dal Pizzol. 

A ETE do Barracão contará com uma tecnologia pioneira no RS, que contempla o tratamento terciário. Esse tipo de tratamento remove até mesmo os nutrientes mais difíceis, como nitrogênio e fósforo. “Além disso, a estação conta com tratamento de irradiação ultravioleta, que promove a desinfecção do esgoto tratado, ou seja, a remoção de bactérias fecais que  estão presentes no esgoto”, complementa a engenheira bioquímica da Corsan, Renata Dal Magro.


 

Outra importante característica da ETE do Barracão é que ela tem uma rede coletora própria, o que se chama de separador absoluto. Na região Sul da cidade, foi instalada uma rede destinada exclusivamente para o esgoto doméstico, sem haver encontro com a água da chuva.

“Esse tipo de estação vai ser a segunda a operar no RS. Tem uma em Canela que começou há pouco. Então para a Corsan é uma situação de novidade”, revela Dal Pizzol. Por conta disso, durante um ano a empresa responsável pela projeção da Estação trabalhará em conjunto com a equipe da Corsan, a fim de possibilitar a transferência de conhecimento para a operação da ETE e comprovação de sua eficiência. “Vale pontuar que uma parcela do valor da licitação [a ser paga à empresa] está condicionada a essa operação assistida, porque isso vai comprovar se os parâmetros de emissão do esgoto tratado atendem ao que foi solicitado pela Companhia e licenciado junto a FEPAM”, ressalta Renata. 

Até o momento, em toda a estrutura da estação, incluindo a rede coletora, estações elevatórias e emissário final, foi investido um total de R$ 26,5 milhões.


 

Como funcionará a estação?

Para garantir o esgoto tratado, as residências deverão se ligar à rede coletora da ETE. Em alguns pontos – nas ruas Plauto de Abreu e Alfredo Giacomello, no Santo Antão, e na ERS-444 – foi necessária a instalação de estações elevatórias, onde o esgoto é bombeado até a estação. Há também as ligações em que o esgoto é conduzido por gravidade até a estação elevatória localizada na ERS-444.

Chegando à estação, o esgoto terá medição da vazão, ou seja, da quantidade de esgoto que está chegando à estrutura.  Com isso, é possível fazer a dosagem de produtos químicos que deverá ser utilizada para tratar aquela quantidade de esgoto. A ETE é licenciada para operar com até 40 litros por segundo.

Na primeira etapa ocorre o tratamento preliminar, conhecido como gradeamento, todo o material grosseiro que estiver presente no esgoto – como restos embalagens ou outros resíduos sólidos – é retido e separado da parte líquida. Depois, a fase do desarenador é responsável por retirar a areia que prejudicaria os processos seguintes. Após, há a adição de produtos químicos, coagulante, alcalinizante e polímero para a clarificação do efluente, que ocorre na fase de flotação, que separa algumas substâncias em suspensão e remove fósforo do esgoto. “Então o esgoto, fração líquida, segue para as etapas seguintes. Há reator e filtro biológico, em que a biomassa desenvolvida remove matéria orgânica e nitrogênio. Na sequência, mais um flotador, para remoção do material suspenso. E, por último, tem a câmara de desinfecção por irradiação ultravioleta, que faz a remoção das bactérias de origem fecal”, explica a engenheira Renata Dal Magro. Ainda, possui queimador do gás gerado.

Após tratado, o esgoto deságua no arroio Barracão, depois do ponto de captação de água para tratamento da Corsan. A companhia ressalta que a maior parte da água tratada no município provém da captação junto à barragem Buratti, com reservação anterior na barragem São Miguel.

Benefícios à saúde e ao meio ambiente

Conforme dados da Organização Mundial da Saúde, para cada R$ 1 investido em esgoto, as despesas com saúde são reduzidas em R$ 4. Além de reduzir substâncias nocivas à saúde dos seres humanos e dos animais, o tratamento de esgoto possibilita a melhora na qualidade da água dos mananciais. “Quanto mais se investir em tratamento de esgoto, menos produtos a gente vai ter que utilizar no tratamento dessa água”, explica Marciano Dal Pizzol. “Também há economicidade na questão financeira, porque os produtos utilizados para tratar a água não são baratos e, a maioria, é importado”, complementa. 
Outro benefício diz respeito à redução de perdas de água potável, que muitas vezes acontecem por ligações clandestinas e vazamentos. “Água é um bem finito, então temos que focar na redução de perdas”, ressalta. 


 

Campanha para ligação das casas

“O tratamento do esgoto, tanto quanto o tratamento da água, é essencial para a preservação do meio ambiente. Infelizmente, para algumas pessoas o esgoto não tem valor. É considerado apenas mais uma despesa. Mas saneamento vai muito além: trata-se de saúde pública. Conectar-se à rede de esgoto é uma questão de cidadania, não apenas uma decisão individual”, destaca a Corsan. 

Apesar de a ligação das residências não ser obrigatória, a Corsan fará um programa de incentivo para que todos os usuários optem por aderir ao sistema de tratamento. Amparado pela Agência Estadual de Regulação dos Serviços Públicos Delegados do Rio Grande do Sul (Agergs), o programa prevê que seja pago um valor pela disponibilidade do serviço. “Nós vamos convidar o usuário a se ligar, por meio de uma ampla comunicação. Quem aceitar se ligar ao sistema pagará um determinado valor e terá carência de seis meses para o início da cobrança. Caso o usuário decida não se ligar, o valor será mais caro, e também terá prazo de seis meses”, explica Dal Pizzol. 

Para operacionalidade da ETE, além do valor de ligação do sistema, será cobrada uma tarifa mensalmente, equivalente a 70% do consumo de água. “O tratamento é um procedimento bastante caro. E se estima que 70% do nosso consumo de água vire esgoto, por isso esse valor”, comenta. O preço de ligação ao sistema dependerá da infraestrutura de cada residência, explica Marciano. “A Corsan fará a ligação sem custo para as pessoas de baixa renda, que recebem programas sociais. Então esse valor a mais que iremos cobrar de quem não quiser se ligar vai ser para subsidiar aqueles que não têm condições, mas querem o serviço”, continua. 

Fotos: Eduarda Bucco/SERRANOSSA