Ministério Público e Poder Judiciário manifestam-se contra alterações no pacote anticorrupção

Na tarde desta segunda-feira, dia 5, membros do Ministério Público (MP) e Poder Judiciário da comarca de Bento Gonçalves reuniram-se para uma manifestação contra as mudanças feitas pelos deputados federais no pacote anticorrupção. “Na semana passada, infelizmente, membros do Congresso Nacional, temerosos pela nossa atividade, tomaram a iniciativa de deturparem um projeto de lei de iniciativa apoiada por milhares de brasileiros e simbolizado nas 10 medidas contra a corrupção. O que se fez semana passada foi uma tentativa de se instituir na lei uma criminalização da atividade hermenêutica dos juízes, promotores e procuradores da República e isso de forma alguma é admissível”, destacou o primeiro promotor de Justiça da Promotoria de Justiça Criminal da comarca de Bento Gonçalves, Eduardo Só dos Santos Lumertz.

A mobilização é uma resposta às emendas feitas ao projeto de lei apresentado pelo Ministério Público Federal, conhecido como “10 medidas contra a corrupção”, que modificaram a proposta inicial e acrescentaram punição para juízes e membros do MP. As críticas foram ainda maiores pelo fato de a votação ter ocorrido em sessão realizada enquanto o país estava consternado com o acidente com o voo que transportava a delegação da Chapecoense. A proposta precisa ainda passar pelo Senado antes de entrar em vigor. “Criaram enquadramentos de abuso de autoridade para aqueles que estariam encarregados a combater a corrupção. Isso é um golpe. Na calada da noite tentaram perseguir aqueles que estão trazendo à luz da transparência a realidade brasileira”, salientou o promotor de Justiça Alécio Silveira Nogueira, em nome do Ministério Público Estadual.

Ele reforçou ainda a importância de chamar a atenção da sociedade para este momento. “Nessa sala normalmente se reunia imprensa e população para tratarmos das nossas investigações, para passar para a comunidade o que estava acontecendo, dar uma satisfação do nosso trabalho. Querem acabar com isso e estamos aqui para tentar evitar que isso acabe. Se forem aprovadas as medidas, uma delas é a impossibilidade de comentar qualquer expediente”, lamentou. Segundo ele, a lógica da força foi invertida, tentando punir aqueles que estão investigando. “É como se uma criança tentasse pedir alimentos para o seu pai e fosse condenada a pagar o dobro do que está pedindo”, compara. “É um risco não apenas para as instituições, mas para a sociedade. Não estamos defendendo interesses corporativos, defendemos interesses da sociedade. Quem vai ser atingido é a sociedade como um todo, que terá seus canais de combate à corrupção simplesmente anulados”, complementou.

A juíza Fernanda Ghiringhelli de Azevedo, representando o Poder Judiciário Estadual, leu uma nota de repúdio assinada pela Associação dos Juízes do Rio Grande do Sul (Ajuris).  “Colocar-se contra a corrupção é não fragilizar aqueles que a combatem. O Judiciário fortalecido é pressuposto essencial do Estado Democrático de Direito”, diz o texto.

O Juiz federal Rodrigo Koehler Ribeiro, diretor do foro da Subseção Judiciária de Bento Gonçalves, lembrou que a situação não é original e já foi vivenciada na Itália na década de 90, com a Operação Mãos Limpas. Por falta de comoção popular, as medidas que dificultaram as investigações criminais acabaram por ocasionar um acréscimo significativo na corrupção. “A história está se repetindo, mas nós devemos nos unir para que não ocorra o que aconteceu na Itália naquele momento e estejamos cientes de que o Ministério Público e o Judiciário não almejam estar acima da lei. Todas as tipificações inseridas neste pacote que acabou por deturpar as medidas, já estavam inseridas em responsabilização funcional dos magistrados em diplomas que estão vigendo. Se a gente acabar por praticar um ato ilícito vamos ser responsabilizados por isso”, argumentou, classificando a atitude do parlamento como fascista e autoritária em revanche aos resultados da Operação Lava-jato.

Caso o projeto vingue, os promotores e juízes estarão fadados a conduzir os casos de forma burocrática sem ouvir a sociedade, conforme o procurador da República Alexandre Schneider, representando o Ministério Público Federal. “O momento é grave, porque toca justamente na essência da instituição, na essência do Ministério Público e na essência do Judiciário. Somos a última salvaguarda da sociedade. Quando Legislativo e Executivo abusam, só resta à sociedade procurar a magistratura. Dia a dia nós atuamos em prol da sociedade, defendendo interesse de minorias”, afirmou.

Para o diretor do Foro Trabalhista de Bento Gonçalves, juiz Silvionei do Carmo, o Brasil vive um momento muito grave, com a classe política de costas para a população. O que ocorreu na semana passada, para ele teve caráter de vingança por terem interesses contrariados devido à atuação independente dos promotores e juízes. “Sem independência de atuação não há Justiça e nem garantia de que os cidadãos terão seus direitos respeitados. O que se pretende com esse projeto de lei é acuar os membros do Ministério Público e Judiciário, receosos com as possíveis represálias, deixem de perseguir na sua atuação diária a condenação pelos atos de corrupção e outros tantos crimes que são praticados”, concluiu.

 

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