Moradores de Bento relatam sequelas meses após infecção pelo Coronavírus

Em março, o SERRANOSSA fez uma reportagem sobre alterações neurológicas causadas pela infecção pelo Coronavírus, com manifestações psicopatológicas, tais como depressão, transtorno de pânico e humor, ansiedade, perda de memória, entre outros. Além dessas sequelas, pacientes têm relatado outras mudanças significativas no seu dia a dia, como alterações no olfato e paladar, dores de cabeça e dificuldade respiratória.

O escrevente Wesley Bertoldi, de 25 anos, contraiu a COVID-19 no fim de outubro do ano passado e teve sintomas leves, como perda de olfato e  paladar e dores de cabeça. Asmático, ele conta que costumava utilizar a bombinha apenas em casos extremos, cerca de cinco vezes ao ano. Mesmo não tendo lidado com dificuldades respiratórias durante a infecção pelo Coronavírus, Bertoldi conta que as crises respiratórias se acentuaram significativamente no período pós-covid. “Hoje sinto necessidade de usar a bombinha antes de algum exercício físico ou, às vezes, até quando acordo para trabalhar, porque sinto minha respiração bem mais pesada”, cita.

Mas a dificuldade para respirar não apareceu logo após a infecção, e sim cerca de três meses após o período. Efeitos tardios da infecção também estão sendo constatados por outro morador de Bento, de 18 anos, que preferiu não se identificar. Ele conta que contraiu a COVID-19 no fim de fevereiro e teve sintomas “moderados”. “Passei dois dias na cama, sem forças, espirrando, e rapidamente já perdi o olfato e o paladar”, relata.

Após a infecção, a ausência do olfato e do paladar permaneceu por cerca de dois meses. Entre o fim de abril e início de maio, os sentidos  retornaram. Mas há cerca de uma semana o jovem começou a sentir cheiros “estranhos e incômodos”. “Comidas com gorduras, molhos ou fritura se tornaram completamente desagradáveis. Os cheiros se  assemelham a lixo e o gosto à ferrugem, ou comida estragada”, descreve.


Imagem ilustrativa. Crédito: iStock
 

Estudos sobre o tema

Casos parecidos têm sido relatados de forma recorrente em diversas partes do mundo. No Brasil, o alto número de pacientes com sequelas pós-covid levou o Hospital Universitário Pedro Ernesto, vinculado à  universidade Estadual do Rio de Janeiro, a criar um ambulatório exclusivo para atendimento desses pacientes. O centro foi inaugurado no dia 31/05, com o objetivo de produzir estudos sobre o tema, em parceria com a UERJ e com a Secretaria Estadual de Saúde.

O mesmo foi feito pelo Hospital Universitário Cajuru, em Curitiba, em parceria com a PUCPR. O espaço montado no local oferece atendimento de pneumologia, fisioterapia respiratória e funcional, psicologia, neuropsicologia e cardiologia, dependendo da necessidade dos pacientes que são encaminhados pelo SUS, além de servir como ambiente acadêmico para pesquisas sobre a doença.

De acordo com os dados alcançados e analisados em quatro meses de serviço, 90% dos pacientes entre 24 e 76 anos apresentam fadiga; 85% teve uma grande perda de massa muscular; 70% dispneia (falta de ar) e 50% cefaleia (dores de cabeça). “Logo no começo da pandemia nós percebemos que seria necessário um espaço especializado para tratamento das possíveis sequelas da COVID-19 nos pacientes. Certos disso, criamos o ambulatório para prestar atendimento gratuito aos pacientes e ainda contribuir com os avanços das pesquisas, ajudando a mapear o vírus e as sequelas mais comuns e severas da doença. O ambulatório une serviço, pesquisa e educação”, revela a pesquisadora do ambulatório Cristina Baena.

Conforme estimativas da Organização Mundial da Saúde (OMS), pelo menos 10% dos pacientes que se recuperam da COVID-19 mantêm algum sintoma. Entretanto, ainda pouco se sabe sobre sua duração e gravidade.

Em coletiva de imprensa do Tacchini realizada na semana passada, a diretora de divisão hospitalar, Roberta Pozza, citou um estudo publicado no Journal of the American Medical Association (JAMA), o qual demonstrou que 25% dos pacientes que internam com a COVID-19, mesmo após receberem alta, correm o risco de retornar. “É um número que consideramos bastante elevado, mas tivemos poucos casos como esse no Tacchini até então”, revelou. “Pacientes COVID e acometidos de muitas outras comorbidades, que têm mais idade, têm risco maior de fazer internações mais prolongadas por conta da sua dificuldade de reabilitar após o comprometimento pulmonar. Muitas vezes o quadro da COVID acaba descompensando outras doenças que estão tratadas de forma adequada, como o próprio diabete ou a insuficiência cardíaca”, ressaltou.

Dessa forma, a médica alerta sobre a necessidade do acompanhamento médico mesmo após a recuperação da doença. “A condição ideal é essa construção do cuidado continuado. Esses pacientes devem ficar em atenção fisioterápica e em contato com seu médico”, reforçou.


Fonte: Central Press