Nova onda de mortandade de abelhas na região preocupa produtores e ambientalistas

A mortandade de abelhas se tornou um assunto recorrente nos últimos anos entre produtores e pesquisadores de todo o país. Além de causar prejuízos econômicos, a falta desses insetos no meio ambiente pode provocar um sério e irreversível desequilíbrio ecológico. Somente nas últimas semanas, pelo menos cinco localidades da região de Bento Gonçalves – comunidades do interior do município e de cidades vizinhas, como Pinto Bandeira, Monte Belo e Garibaldi – registraram morte de colmeias inteiras. No total, cerca de 50 caixas foram afetadas nesses locais. “Isso é o que os agricultores comentam, mas tem todas as colmeias nativas, então o número é bem maior”, revela o fiscal da Associação Riograndense de Proteção ao Meio Ambiente e aos Animais (ARPA), Jorge Acco. 


 

Um dos apicultores prejudicados foi Santo Carrer, de Pinto Bandeira. Ele trabalha com o manejo de colmeias há anos, tendo caixas em sua propriedade e cuidando de caixas para terceiros. “Aqui em casa perdemos 14 colmeias inteiras. Isso aconteceu de setembro pra cá. Eu tinha 22 caixas aqui”, relata. Para Carrer, a maior preocupação não está ligada às perdas em sua propriedade, e sim à possibilidade da extinção de abelhas no futuro. 

Em Monte Belo, o apicultor Adriano Balbinot, morador da Linha Fernando de Lima, conta que perdeu pelo menos 13 colmeias nos últimos 20 dias. Há quatro anos cuidando de caixas de abelhas, ele afirma que essa foi a primeira vez que registrou mortandade em larga escala. “Levei uma amostra na Inspetoria, mas ainda não me deram retorno. Muitos estão se queixando, mas parece que não têm coragem de denunciar. As minhas continuam morrendo, mas não fui mais ver, desanimei. Porque não tem o que ser feito. Teríamos que descobrir quem está passando [agrotóxico] para conseguir alertar sobre isso”, afirma. Na opinião do apicultor, alguns produtores estão utilizando um produto proibido, que deveria ser aplicado no solo, para pulverizar parreirais. “Os cantineiros deveriam ficar em cima disso. Eles deveriam dizer que, se for passado esse tipo de produto, não pegarão as uvas desse produtor”, sugere.

Segundo Acco, uma das principais suspeitas é que a onda de mortandade esteja ligada à má utilização de agrotóxicos na agricultura, muitos deles importados. “Podem estar sendo utilizados agrotóxicos não permitidos ou sendo administrados os permitidos de forma incorreta. Muitas vezes os agricultores aplicam em cima das flores e nesse período não pode, porque as abelhas vão em cima e acabam morrendo”, explica.


 

A bióloga e professora titular da PUCRS Betina Blochtein afirma que há registros de mortandade de abelhas em várias regiões do Estado e até mesmo do país, variando de acordo com a cultura de cada localidade.  “As causas que têm sido atribuídas às situações agudas geralmente são a presença de agrotóxicos, principalmente inseticidas. Esses são usados ou no controle de pragas, na preparação do solo antes do plantio ou mesmo na questão do controle de formigas, especialmente em época de brotação de videiras, que me parece que é o caso na região de Bento”, analisa. 
Dessa forma, a aplicação de inseticidas acaba atingindo as abelhas que estão nesses ambientes, em flores e vegetações secundárias, por exemplo. “Também tem o problema da deriva. Quando esses produtos inseticidas são pulverizados nas áreas, muitas vezes em função do vento, acabam atingindo as colmeias ou as proximidades, levando as abelhas à morte”, explica Betina. 

Mais do que prejuízos econômicos em colmeias manejadas, principalmente com finalidade de produção de mel e outros subprodutos, como o própolis ou pólen, a preocupação está ligada ao equilíbrio dos ecossistemas. “As perdas maiores são na polinização, porque elas são importantes polinizadoras de culturas agrícolas, e também da vegetação nativa, porque quando as abelhas morrem e diminuem suas populações em determinadas áreas, toda essa estrutura de polinização vai se alterar. A polinização promove a produção de frutos e sementes que são essenciais tanto para o bem-estar humano, quanto para a própria saúde dos ecossistemas”, ressalta a bióloga. 

A importância do registro

A professora Betina afirma que saber aplicar de forma correta os produtos agrotóxicos é essencial para não prejudicar as abelhas. “Temos sempre chamado a atenção que boas práticas para o uso de agrotóxicos são fundamentais para proteção dos polinizadores”, comenta. Mas outra questão também importante em meio a ocorrências de mortandade é o registro junto aos órgãos competentes. No Rio Grande do Sul, as informações devem ser repassadas à Inspetoria Veterinária da Secretaria da Agricultura, a qual disponibiliza técnicos para irem até as propriedades e coletarem amostras. Somente assim é possível identificar a(s) verdadeira(s) causa(s) da morte desses insetos. 
“Nós recebemos apenas uma notificação nos últimos dias [na região de Bento Gonçalves], mas o produtor somente trouxe as abelhas mortas na inspetoria, o que não nos ajuda. Precisamos de mais informações. Muitas vezes sabemos das mortalidades por terceiros, e então já se passou muito tempo”, revela o veterinário responsável, Willian Smiderle. 

Dessa forma, o produtor deve comunicar sobre o fato na Inspetoria o mais rápido possível, informando dados como quando iniciou, os sinais observados e quantas caixas foram afetadas. “É fundamental também que estejam cadastrados na inspetoria e que digam qual a finalidade da criação. A partir da informação completa, conforme o caso, é feita visita para realizar coleta de abelhas mortas e análise da situação no local. Eles também precisam relatar aos agrônomos da área vegetal o uso incorreto de defensivos agrícolas, que tem sido uma causa apontada quando há relatos de mortalidade”, complementa Smiderle. A Inspetoria de Bento Gonçalves atende pelo telefone (54) 3452 2131 (WhatsApp). 

O mesmo cenário de falta de informações é relatado na secretaria de Desenvolvimento da Agricultura de Bento Gonçalves. De acordo com o médico veterinário da pasta, Cristiano Selbach da Silva, neste ano ainda não foram recebidas denúncias de mortandade de abelhas no município. “No último ano, a secretaria esteve visitando alguns apicultores. A pasta conta com o programa de troca da cera bruta pela alveolada, que é utilizada nas caixas para as abelhas produzirem o mel. Mas, claro, se houver a necessidade, a secretaria irá verificar”, afirma. 

Fotos: Divulgação/Arpa

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