O caminho que levou à retirada e arquivamento dos projetos de revisão do Plano Diretor de Bento
Na última semana, o Executivo de Bento deu ouvidos às reclamações de comunidades e entidades e disse que irá promover novas discussões em relação à proposta entregue à Câmara
A prefeitura de Bento bem que tentou, mas não adiantou. A pressão popular e as diversas manifestações de entidades forçaram o Executivo a recuar e solicitar o arquivamento dos Projetos de Lei Complementar (PLCs) 10 e 12/2022 na Câmara de Vereadores. Os PLCs tratavam sobre a revisão do Plano Diretor da cidade e já geravam polêmicas e reclamação entre moradores do interior – principalmente Vale dos Vinhedos –, de alguns bairros atingidos pelas mudanças – como São Bento e Santo Antão – e dentro do próprio Legislativo. Porém, vamos por partes.
Na tarde de quinta-feira, 15/09, a prefeitura de Bento Gonçalves, em conjunto com a Câmara, divulgou uma nota oficial que solicitava que os projetos saíssem de pauta na Casa do Povo e que fossem arquivados. No jornal da última sexta-feira, 16/09, o SERRANOSSA abordou em detalhes os desdobramentos dos PLCs, no entanto, o fechamento da edição ocorreu antes da divulgação da nota.
Conforme justificativa da prefeitura, a medida teve um objetivo simples. “A decisão, que, também, parte do entendimento da Câmara de Vereadores, permite que a iniciativa seja amplamente discutida entre toda a comunidade, buscando equalizar as demandas e as necessidades do município. Paralelamente, um Plano de Gestão e Desenvolvimento da Paisagem do Vale dos Vinhedos será desenvolvido, contando com a participação dos municípios que integram a região”, dizia nota publicada pelo Executivo em seu site oficial.
Em nota publicada pela Câmara, o então presidente da Comissão de Infraestrutura, Desenvolvimento e Bem-estar Social (CID), vereador Anderson Zanella (PP), informou que a retirada dos projetos tem também a intenção de acalmar os ânimos.
“O Legislativo quer restabelecer o respeito e o foco da audiência pública durante as manifestações, sejam de vereadores, lideranças da comunidade ou moradores. O que infelizmente não ocorreu na audiência distrital realizada no dia 8 de setembro, quando os ânimos se exaltaram e muitas das manifestações se desvirtuaram para ataques pessoais. Bento Gonçalves é maior que isso e queremos que os debates tenham foco no campo das ideias e não no desrespeito e ataques pessoais”, disse. Zanella está em licença não remunerada desde o dia 14 de setembro.
O vereador Eduardo Pompermayer (União), atual presidente da CID, acredita que foi acertada a decisão de retirada do projeto, afinal, a prefeitura é a principal responsável pelo projeto. “Então eu acho que sim, o poder Executivo está correto em fazer um melhor estudo e mandar um plano mais sofisticado para que a gente possa aí sim fazer novas emendas e depois aprovar. Mas, espero que não fique esquecido, porque existem mudanças que são necessárias”, pontuou.
O presidente da Câmara, vereador Rafael Pasqualotto (PP), também se manifestou via nota. “Essa decisão é fundamental, precisamos ampliar o debate e saber o que a população bento-gonçalvense realmente quer referente a esses empreendimentos. Não decidimos ainda se vamos propor um plebiscito ou um referendo, mas devemos analisar minuciosamente, pois a lei é pra todos” disse.
Caos
A rejeição aos PLCs se aflorou após a primeira Audiência Pública promovida pelo Legislativo, realizada no dia 08/09, na comunidade 8 da Graciema. O clima tenso, as trocas de acusações de interesses e os ânimos exaltados e nervosos em alguns momentos fizeram com que a discussão perdesse o rumo e passasse longe de analisar os projetos e suas 40 emendas (33 do PLC 10 e 7 do PLC 12/2022).
No dia 09/09, seis entidades que têm representação no Conselho Municipal de Planejamento Urbano (Complan) emitiram uma “carta aberta à população de Bento”, na qual apresentaram alguns pontos divergentes aos projetos e ao modo que a prefeitura deu andamento às discussões – ou sobre a falta delas –, além de solicitar que o projeto fosse retirado. Assinaram a carta o Conselho de Arquitetura e Urbanismo (CAU), Conselho Regional de Engenharia e Agronomia (CREA), Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) – Subseção de Bento Gonçalves, Instituto dos Arquitetos do Brasil (IAB), Associação dos Engenheiros e Arquitetos da Região dos Vinhedos (AERV) e o curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Caxias do Sul (UCS).
Segundo o presidente da OAB Subseção de Bento Gonçalves, Rodrigo Terra de Souza, a retirada do projeto foi acertada. “No entendimento da Subseção não houve o respeito aos preceitos legais na tramitação dos Projetos de Leis Complementares apresentadas pelo Executivo Municipal, tendo em vista que há todo um regramento que deve ser respeitado até o encaminhamento dos respectivos projetos para aprovação. Além disto, no entendimento desta Instituição, a forma célere em que os projetos foram encaminhados, certamente não teriam a melhor avaliação de impacto à sociedade bento-gonçalvense”, afirmou em nota.
No dia 10/09, o vereador Zanella, até então presidente da CID, informou que as outras duas audiências que estavam marcadas para 12 e 15/09, haviam sido suspensas. “O clima está muito tenso, não discutiram as emendas, não discutiram o projeto. Em muitos momentos a audiência foi agressiva, foi pessoalizada, não teve o respeito, ordem. Então, nesse sentido, a Câmara vai reestabelecer a ordem, a ordem de respeito, da democracia desse processo. As pessoas tem que entender que elas têm que discutir o que está em questão”, disse o vereador licenciado na ocasião. Na sessão do dia 12/09, os vereadores Agostinho Petroli (MDB) e Rafael Fantin (PSD) se manifestaram na tribuna e solicitaram que a prefeitura retirasse o projeto. Pasqualotto e Zanella comentaram sobre a audiência no 8 da Graciema e criticaram a postura de alguns lá presentes.
Com uma bomba em mãos, a prefeitura não teve muita escolha senão repensar. Ao final da nota oficial que informava a retirada dos PLCs e de seu arquivamento, o Executivo assumiu um novo olhar para com a iniciativa. “A Prefeitura reforça o seu compromisso com a busca do consenso em torno das questões relacionadas à legislação — contribuindo com o desenvolvimento e o futuro da nossa cidade.”
O plano
Sobre o Plano de Gestão e Desenvolvimento da Paisagem do Vale dos Vinhedos, a diretora do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano (IPURB), Melissa Bertoletti, destacou que essa passará a ser uma questão da tríade Bento, Garibaldi e Monte Belo do Sul. “Conforme determinado em reunião no Ministério Público, o plano será um regramento para os três municípios: Bento, Garibaldi e Monte Belo, na área do Vale dos Vinhedos. Será elaborado um termo de referência junto com os três municípios, Ministério Público, IPHAE e Metroplan. Após será realizada a contratação do serviço”, disse por meio da Assessoria de Comunicação da Prefeitura.