“O coronavírus foi criado em laboratório?”, por Raquel Balestrin – UCS

Em meio à pandemia causada pelo vírus SARS-Cov2, muitas informações conflitantes são produzidas. E devido ao número crescente de acontecimentos, muitas vezes não temos certeza do que é correto ou não. 

O mês de março iniciou com um aumento expressivo de casos da COVID-19 (Coronavirus disease 2019) fora da China, afetando principalmente a Europa e nos últimos dias a América. 

Além da explosão de novos infectados, conceituadas revistas científicas publicam artigos de renomados pesquisadores que refutam a possibilidade do vírus ter sido criado em laboratório ou manipulado de forma intencional.

A primeira publicação nesse sentido foi em 02 de março de 2020, na revista NATURE MICROBIOLOGY. Um grupo de renomados cientistas da Europa, Ásia e EUA, que compõe o Grupo de Estudo Coronaviridae (CSG) do Comitê Internacional de Taxonomia de Vírus (ICTV), realizou a classificação e nomenclatura do novo Coronavírus a partir de análises genéticas (1). 

Coronavírus são vírus de RNA com ampla distribuição entre humanos, outros mamíferos e aves. Até o ano de 2019, os cientistas conheciam seis espécies diferentes de coronavírus que infectavam seres humanos. Destes, quatro frequentemente causam quadros de resfriados e infecções leves do trato respiratório superior em todas as faixas etárias. Os outros dois podem causar quadros graves e potencialmente fatais de insuficiência respiratória — severe acute respiratory syndrome coronavirus (SARS-CoV) e a Middle East respiratory syndrome coronavirus (MERS-CoV). O surgimento de novas cepas de coronavírus é propício devido à sua extensa distribuição no mundo, alta prevalência, ligado à diversidade genética e frequentes mutações (2).

Este novo coronavirus compartilha 75% a 80% de sua sequência genética com o SARS-CoV e tem mais de 95% de homologia com um coronavirus de morcegos. Ainda é desconhecida qual foi a espécie animal intermediária entre os morcegos e os humanos (3).

 


Foto: arquivo pessoal

 

Corroborando os dados apresentados anteriormente, essa semana, dia 17 de março de 2020, foi publicado o artigo intitulado “The proximal origin of SARS-CoV-2”, em outra renomada revista científica, a NATURE MEDICINE. 

Os cientistas analisaram uma série de dados genômicos e discutem cenários sobre a origem do novo coronavírus. Salientam que, para ser realizado algum tipo de manipulação genética (criação em laboratório), há a necessidade de um modelo existente, ou seja, deveriam partir da estrutura viral de um dos antigos coronavírus conhecidos e disponíveis.

Entretanto, os dados genéticos analisados demonstram que o SARS-CoV-2 não é derivado da estrutura de nenhum vírus usado anteriormente (4). 

Com base nas análises de sequenciamento genético, Andersen e seus colaboradores concluíram que há dois cenários possíveis que explicam as origens do SARS-CoV-2. No primeiro, o vírus evoluiu para seu estado patogênico atual por meio da seleção natural de um hospedeiro animal e, então, pulou para os seres humanos. No outro cenário, uma versão do vírus saltou de um hospedeiro animal para o homem e depois evoluiu para seu estado patogênico atual na população humana.

Em relação à mutação do vírus de humanos para humanos, os pesquisadores sugerem estudar bancos genômicos de amostras de pacientes para identificar como, onde e quando a propagação do Covid-19 começou.

Os pesquisadores concluem que é difícil determinar como, de fato, o novo vírus surgiu. Mas as teorias apresentadas de que ele é resultado da evolução natural  trazem uma visão baseada em evidências científicas frente aos rumores que circulam sobre as origens do SARS-Cov2 causador da COVID-19 (4).

Os cientistas estão trabalhando incansavelmente para entender o vírus e encontrar formas de controlar essa pandemia. Muitos estão ativamente testando fármacos que foram desenvolvidos para outros fins, verificando sua ação contra o SARS-Cov2. Só teremos fim dessa pandemia quando uma vacina for desenvolvida e houver vacinação em massa, assim como aconteceu com a pandemia de Gripe A (Influenza H1N1), em 2009. 

Enquanto isso, por favor, FIQUEM EM CASA, evitem contato entre as pessoas e higienizem bem as mãos através de álcool gel ou lavagem adequada. Só passem adiante informações confiáveis, geralmente produzidas por médicos ou cientistas. Por fim, mesmo em isolamento social, cuidem da saúde mental e física pois o nosso sistema imune será muito mais forte.

1- Gorbalenya, AE, Baker, SC, Baric, RS  et al. A espécie Coronavírus relacionado à síndrome respiratória aguda grave : classificação de 2019-nCoV e denominação SARS-CoV-2. Nat Microbiol (2020).  https://doi.org/10.1038/s41564-020-0695-z
2- 0. Brasil. Ministério da saúde. Boletim epidemiológico 2. Infecção humana pelo novo coronavirus 2019-nCoV. 2/Fev/2020. Disponível em: https://portalarquivos2.saude.gov.br/ images/pdf/2020/fevereiro/04/Boletimepidemiologico-SVS-04fev20.pdf
3 – Perlman S. Another decade, another coronavirus. N Engl J Med, 2020. DOI: 10.1056/ NEJMe2001126.
4- Andersen, KG, Rambaut, A., Lipkin, WI et al. The proximal origin of SARS-CoV-2. Nat Med (2020). https://doi.org/10.1038/s41591-020-0820-9

 


Raquel Balestrin é Bióloga, Mestre em Genética e Biologia Molecular – UFRGS e Professora de Genética na Universidade de Caxias do Sul (UCS)