“Olhem para seus filhos, porque é dali que sai a força da gente”

Natural do Paraguai, a cozinheira Balquiria da Silva Paim viveu momentos de miséria, traumas, tristeza e superação durante seus 37 anos. Até os sete anos, morou em barracos improvisados pelos seus pais, em diferentes locais do país. Depois, começou a trabalhar como babá e dona de casa em diversas residências, a fim de auxiliar no sustento de sua família. “Eu ficava um ano em casa, e um ano fora, para juntar dinheiro. Voltava quando nascia algum dos meus irmãos e precisava ajudar meus pais a cuidarem”, recorda. 

Aos 10 anos, sua família chegou a Bento Gonçalves e se instalou em um barraco nos trilhos próximo ao Rio das Antas. Aos 12 anos, foi adotada por uma família do município e se afastou de seus pais e nove irmãos. “Fiquei com essa família até os 21 anos, quando noivei e fui morar com o pai do meu filho mais velho, o Cauã”, conta Balquiria. Foram 12 anos de casamento. Solteira há quase dois anos, a cozinheira conheceu o pai da sua segunda filha, Monique Desiee Paim Ferran. Em meio a um relacionamento agressivo e marcado por traições, Balquiria novamente decidiu se separar. 

A relação conturbada marcou mais um episódio de traumas que a acompanhavam desde pequena. “Eu sofria abuso do meu avô e meu pai me passava a mão”, revela. Mesmo assim, Balquiria decidiu entrar em um novo relacionamento tempos depois, quando engravidou dos gêmeos Enzo Gabriel e José Henrique. A terceira gravidez, entretanto, foi complicada.  Os irmãos precisaram vir ao mundo mais cedo, pesando cerca de 800 gramas. Para arcar com todos os cuidados médicos, a mãe precisou vender sua moto. Mas em meio a diversas complicações, José Henrique acabou morrendo ainda no hospital. “Até hoje não sabemos realmente o que aconteceu. Colocaram como morte natural. E nem conseguimos enviar o corpinho dele para necropsia. O corpo precisava chegar a Curitiba em 72 horas. Tínhamos conseguido o transporte e o valor, mas já era tarde”, lamenta.


 

O gêmeo Enzo Gabriel continuou no hospital por meses, devido a malformações em seu corpo, passando por diversas cirurgias e precisando utilizar oxigênio para se manter vivo. Balquiria passou dias trancada com o pequeno em um quarto de hospital e cerca de dois anos vivendo para ele, entre realização de exames, cirurgias e demais procedimentos. Mais tarde, após a mãe notar sinais diferentes em seu filho, foi descoberto que Enzo sofria de transtorno do espectro do autista (TEA). “Então comecei a correr atrás de fonoaudióloga e todos demais profissionais necessários para dar qualidade de vida a ele, além do leite especial e das fraldas que ele precisa diariamente”, comenta. 


 

Em meio à tristeza da perda de José Henrique e da luta para garantir que nada faltasse a seus filhos, Balquiria passou por períodos de desemprego e novos episódios de agressão com o seu agora ex-companheiro. “Cheguei a ficar dois meses sem emprego, só tinha uma lata de azeite e um pacote de massa em casa”, recorda. 

Mas Balquiria nunca baixou a cabeça. Começou a fazer faxinas, doces e até a trabalhar como manicure. Hoje, ela trabalha na cozinha de uma creche em Bento. Enzo já está com três meses e meio e começou a frequentar a escolinha. A filha Monique, de nove anos, fica meio período com a avó e meio período na escola. E o mais velho Cauã, de 14 anos, estuda e em um turno e ajuda a mãe com os afazeres de casa no outro. “Eu saio de casa às 6h e chego por volta das 19h. Ao meio-dia o Cauã busca o Enzo na escolinha e leva na babá. Saio do trabalho no fim da tarde e busco a Monique na avó de moto. Voltamos para casa e vamos encontrar o Cauã, que busca o nenê na babá”, relata. 


 

Mesmo com uma rotina agitada e com tantos obstáculos pelo caminho, Balquiria se orgulha da qualidade de vida e educação que conseguiu dar às crianças. “Nem os médicos acreditavam que o Enzo estaria vivo. E hoje está ali, feliz. Nunca vi ele triste. Então eu encontro força por neles e por eles”, afirma. 

Como mensagem de Dia das Mães, Balquiria ressalta a importância de colocar a si e os filhos em primeiro lugar. “Claro que merecemos ter uma pessoa que amamos ao nosso lado, mas tem que ser uma pessoa que nos ajude, que nos incentive e, principalmente, que também ame nossos pequenos”, pontua. E sobre sua batalha de vida, que também pode estar sendo compartilhada por diversas mães que estão lendo esta matéria, Balquiria finaliza: “Olhem para seus filhos, porque é dali que sai a força da gente”.

Fotos: Arquivo pessoal