Opinião: a cara da morte

Por Franciele Sassi

Nessa cultura desenfreada a qual vivemos e na rapidez com que as informações nos são transmitidas todos os dias, acabamos vivendo a consequência da redução das possibilidades de pensar. Em razão do número de estímulos ser exacerbado, os assuntos que têm a ver com a finitude ou com a limitação das coisas são englobados nesta dita “agilidade” da “vida que segue”, passando por despercebidos, bloqueados e, muitas vezes, nem sequer questionados. Logo, aquilo que entendemos como desenvolvimento – até porque o convite para pertencer aos “avanços da humanidade” pode ser considerado, de forma crítica, como a negação de tudo o que é da ordem do sentir, da ordem da experiência – precisa ser prático, rápido e objetivo. Não é à toa que vemos conteúdos relacionados à morte, que é um dos grandes mistérios da vida, como um evento dotado de diferentes respostas que a justificam e aliviam a angústia da sociedade, mesmo que de forma temporária.

Como reflexo da agilidade e facilidade, percebemos que as pessoas têm resposta para tudo em relação à morte: o que motivou um suicídio foi o fator x, y ou z; o luto dura um tempo x, devemos fazer isto ou aquilo com os pertences da pessoa falecida, o diagnóstico de x ou y deve ser adotado para quem apresentar determinados sintomas por um tempo também específico, entre muitas outras “fórmulas” que encontramos para amenizar aquilo que nem sempre conseguimos explicar por uma só via. Então, é como se a morte – assim como tantos outros assuntos polêmicos – tivesse uma cara, uma face.


Há um grande problema em tentarmos encontrar uma explicação para tudo o que vivemos: nessa tentativa de controle, o objetivo é o reasseguramento, mas por trás dele esconde-se o medo de experimentar. Na medida em que buscamos as famosas receitas de bolo nas diferentes fontes de acesso, também restringimos a nossa capacidade de tentar de forma particular e, através da experiência, descobrir uma resposta que construa significados próprios e que seja satisfatória para a continuidade das relações e da vida. E no processo de luto não é diferente. Muitas vezes, ficamos tão atordoados buscando como se comportar, o que falar, fazer e pensar, que bloqueamos a nossa própria forma de reagir frente às adversidades. Isso justifica a dificuldade que temos em nos autorizarmos a expressar as emoções, que são genuínas no ser humano. Pelo receio do julgamento, baseado em coisas tão fáceis, rápidas e prontas, nós acabamos ficando um tanto perdidos sobre como nos portarmos.

O convite para pensarmos em como agimos diante de grandes situações de crise na vida, como a perda de uma pessoa amada, por exemplo, que nos convoca a entrarmos em contato com nós mesmos, já constitui o primeiro passo para que possamos modificar e reconstruir formas de pensar e agir. Antes de grandes transformações por fora, é preciso reatribuir significados na nossa parte de dentro. A apropriação do sentir é o que nos liberta para ser o que se é e também fornece um lugar especial para os nossos sentimentos mais verdadeiros. O lugar que nós temos também fala de um lugar que temos para todos aqueles que amamos e que permanecem para sempre junto de nós.