Quando a falta de bom senso ultrapassa os limites

Após uma semana de trabalho, o que se almeja é um final de semana calmo e tranquilo. Porém, essa não é a realidade de alguns moradores do bairro Licorsul. Eles alegam que o barulho vindo da avenida Presidente Costa e Silva, no bairro Planalto, é insuportável e que o incômodo tem causado problemas tanto de saúde quanto psicológicos e emocionais. O tumulto inicia às quintas-feiras e segue até o domingo. Segundo os denunciantes, vários motoristas estacionam os veículos no local, ligam o som em volume alto e abrem os porta-malas. A Brigada Militar (BM) constantemente é acionada, entretanto, quando a viatura se afasta, tudo recomeça e a música alta segue até a madrugada. Os moradores se mobilizaram na organização de um abaixo-assinado, que será entregue ao Ministério Público (MP), buscando uma alternativa para minimizar o problema.

Segundo as moradoras – que preferem não ser identificadas – a situação se agravou há cerca de dois meses. “Não temos mais condições de dormir. Já ligamos várias vezes para a Brigada Militar. Eles, inclusive, pediram que anotássemos as placas dos veículos e o fizemos, mas nunca conseguimos registrar uma ocorrência. São sempre os mesmos motoristas que param seus veículos na avenida e ficam com o som muito alto”, reclama uma delas. Os infratores chegam a encobrir as placas com peças de roupas, cadeiras ou caixas de isopor para dificultar a identificação dos veículos e o repasse das denúncias às autoridades policiais, segundo ela. 

Para descansar aos finais de semana, as denunciantes relatam que precisam sair das próprias casas, incomodadas com o barulho. “O remédio que tomo para conseguir dormir me causa mal-estar, tenho que optar: ou passo mal ou não durmo. É uma situação muito estressante, não aguentamos mais. Se nada for feito, algo muito grave pode acontecer”, desabafa outra moradora. “Entendemos que eles devem ter um espaço para ficar e que não são todos que fazem essa baderna, mas não precisariam colocar o som no nível insuportável a ponto de atrapalhar a rotina dos moradores. Parece que um precisa aparecer mais que o outro”, relata. “A revolta é tanta que já tive vontade de ir até a avenida e jogar meu carro contra os veículos que estavam com o som alto. Por fim, acabei me desentendendo inclusive com o meu marido por causa desse fato”, conta outra moradora. Elas chegam a torcer para que o final de semana seja chuvoso, só assim diminui o movimento no local. 

Abaixo-assinado

Para tentar amenizar o problema, os moradores se mobilizaram. Em menos de uma semana, reuniram cerca de 50 assinaturas no abaixo-assinado que entregarão ao Ministério Público. O documento deverá ser encaminhado ao promotor Gílson Borguedulff Medeiros, da Promotoria de Justiça Criminal, que o remeterá à Brigada Militar para que seja realizada uma fiscalização mais rigorosa. “Desde 2010, o MP e a BM estão trabalhando em conjunto para coibir essa prática. Desde então, já são mais de 50 casos de veículos recolhidos. Os infratores respondem a um termo circunstanciado e posteriormente acontece uma negociação entre as partes, que optam por doar a aparelhagem de som ou pagar uma multa de R$ 3 mil. Há ainda uma pena alternativa, mas que também incide multa, de R$ 2 mil”, explica Medeiros.

Denúncia na Delegacia ou via site

Queixas e denúncias sobre perturbação de sossego público – gritaria, algazarra, barulhos oriundos de profissões incômodas, abuso de instrumentos sonoros ou mesmo sons produzidos por animais – podem ser relatados através da Delegacia de Polícia Online (www.delegaciaonline.rs.gov.br) ou ainda na Delegacia de Polícia de Pronto Atendimento (DPPA).

Em casos de automóveis com som alto, o delegado Eduardo Limberger do Amaral, titular da DPPA, orienta que a pessoa informe à delegacia a placa e o modelo do veículo, o local, o horário e a data em que o fato ocorreu. Após o registro (tanto na DPPA quanto na Delegacia Online), é instaurado um procedimento no qual as testemunhas são chamadas para depor na Delegacia. Depois, o documento é encaminhado para o juizado.

DMT restrito ao estacionamento

Conforme o diretor do Departamento Municipal de Trânsito (DMT), Clóvis Bedina, casos de perturbação do sossego não são de responsabilidade exclusiva do DMT, principalmente porque o órgão não possui decibelímetro. Em caso de fiscalização, os agentes somente podem autuar veículos que estiverem estacionados em local proibido ou em função de alguma outra infração de trânsito. “Durante a noite, o número de agentes é menor. Por isso, eles atuam somente em situações de emergência, acidente sem vítimas ou prestando apoio à BM em acidentes com lesões. Nesses casos, o DMT pode ser acionado através do telefone 153”, explica. Bedina ainda destaca que, quando necessário, o órgão age em parceria com a Brigada Militar nas blitze de trânsito a fim de identificar infratores.

18 veículos apreendidos somente na avenida Planalto

Os transtornos causados pelo som alto dos veículos estacionados em via pública não são novidade em Bento Gonçalves, como recorda o tenente Clóvis Couto Lavarda, comandante do Policiamento Comunitário da 1ª Companhia do 3º Batalhão de Policiamento de Áreas Turísticas (3º Bpat). O mesmo problema já havia sido registrado nas avenidas Planalto e São Roque, nas ruas Olavo Bilac e Guilherme Fasolo, na Fundaparque e nas imediações de postos de combustíveis no bairro Cidade Alta. “Quando aumentamos a fiscalização em um local, os grupos migram para outros pontos, como já aconteceu na própria avenida Presidente Costa e Silva, em um terreno baldio no bairro Ouro Verde e na área verde no bairro Fátima”, enfatiza o tenente. Apesar do incômodo causado aos moradores pela concentração de veículos e pelo barulho, ele destaca que os condutores que transitam com o som alto pelas ruas do município representam o maior problema, uma vez que a abordagem se torna inviável. 

De acordo com o capitão Evandro José Flores, comandante da 1ª Companhia, entre os dias 1º de janeiro e 17 de novembro, 29 veículos foram recolhidos por perturbação do sossego público. Destes, 18 estavam no bairro Planalto, 2 no bairro São Roque, 2 no Progresso, 1 no Botafogo, 5 no Cidade Alta e 1 no Juventude. 

Ainda segundo o comandante, a BM vem realizando fiscalizações mais frequentes na avenida Planalto e imediações, mas nem sempre é possível destinar uma viatura. “No momento em que eles veem a viatura, baixam o volume do som. Atualmente, a Planalto é o ‘point’ da cidade. Eles acabam se reunindo por causa do comércio que há por ali. Não podemos deixar um pessoal fixo, porque existem diversos outros pontos da cidade com inúmeros problemas, além desses de perturbação de sossego público”, explica o capitão. Ele também relata que a corporação até pode autuar os infratores por perturbação do sossego público, mas não em função do volume, porque isso depende do decibelímetro – aparelho que mede o nível da pressão sonora – e que precisa ser utilizado em um local específico a fim de captar o som de um único automóvel por vez.

Reportagem: Katiane Cardoso


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