Sopão para ajudar ainda mais

Uma pequena fila de pessoas se forma em frente a uma casa do bairro Zatt. São 10h30 da manhã de um sábado qualquer. Nas mãos, panelas vazias e baldes plásticos. Mães e pais de família ou até mesmo crianças pequenas dividem um objetivo comum enquanto esperam pelo alimento que preencherá o recipiente e garantirá uma das poucas refeições decentes da semana: manter a esperança. O sopão é servido por um pequeno grupo de voluntários comandado por um casal evangélico fundador da Igreja Água Viva, que mantém o projeto graças a doações e apoio do Centro Espírita Nossa Casa. Um exemplo de como é possível deixar diferenças de crença de lado em benefício de quem precisa.

A história do pastor Alfeu Siqueira Ferreira e de sua esposa Marli foi marcada por dificuldades. Mas, contrariando o comportamento de muitos que preferem passar os dias lamentando, eles deram a volta por cima e decidiram ajudar outras pessoas que, assim como eles, passavam por dificuldades. Moradores do bairro Zatt há mais de 20 anos, eles mantêm o projeto social que já atendeu mais de 5.000 famílias. Para ajudar ainda mais, eles querem agora construir uma cozinha comunitária para que mais pessoas possam ser atendidas em um dos carros-chefes da mobilização: a distribuição de cestas básicas, frutas, leite e do tradicional sopão, servido uma vez por semana. Hoje o trabalho é feito na casa do casal, que vive no porão da igreja. Todos os ingredientes do sopão, assim como o gás, são fruto de doações. 

Ferreira conta que o sistema de auxílio mudou desde a parceria com o Nossa Casa, há cinco anos. “No início dávamos rancho para quem pedia, independente do motivo. Depois, aprendemos com os voluntários do centro espírita que devemos selecionar quem vai receber, para evitar que a pessoa se acomode e sobreviva de doações. É como aquele ditado: temos que ensinar a pescar e não dar o peixe”, detalha Ferreira. 

No caso do sopão, o controle de distribuição é feito através de um caderno, onde consta o nome do responsável pela família, o bairro onde reside – a maioria é oriunda do Zatt, mas há moradores de bairros adjacentes que também buscam ajuda na igreja –, e o número de pessoas que serão servidas em cada casa. Os donativos também são levados pelo pastor a famílias de localidades às margens do Rio das Antas, como o Km2, Veríssimo de Matos e São Luiz das Antas. 

Parceiros do projeto

*Centro Espírita Nossa Casa – doação de alimentos, roupas, móveis e utensílios. Em épocas específicas são doados brinquedos e material escolar. É o principal mantenedor do projeto;

*Rede Apolo de Supermercados – doação de alimentos perecíveis, como pães, salgados, bolos, frutas, verduras, legumes e carne;

*Cainelli Liquigás – doação do gás para o cozimento do sopão semanalmente – média de um a dois botijões por mês;

*Secretaria municipal de Habitação e Assistência Social (Semhas) – distribuição de alimentos do Programa de Aquisição de Alimentos e doação de oito sacolas de alimentos; 

*Lar Luchese – doação de alimentos não perecíveis;

*Ação Social São Roque – doação de alimentos e donativos.


Inspiração e persistência

O casal de migrantes, vindo do município de Marau, inspirou-se em histórias pessoais de dificuldades e de solidariedade para criar a iniciativa. Criado em orfanato, Alfeu conta que teve épocas em que passou fome e quis evitar que outras pessoas sofressem o mesmo. “Faço esse trabalho de ajudar famílias carentes através do sopão há muitos anos, pois vejo isso como uma missão em minha vida. Tínhamos uma Igreja em Marau e lá já fazíamos isso. Depois nos mudamos para Bento Gonçalves e abrimos nossa igreja no bairro Zatt. A realização do sopão foi logo ativada, pois estava acostumado a isso e não consigo ver como falar de Jesus Cristo para as pessoas e não mostrar com atitudes práticas que realmente acreditamos em sua doutrina de caridade e amor ao próximo”, explica. O pastor conta que há cinco anos a falta de condições quase pôs fim ao projeto. “Não tínhamos nem condições de comprar o gás para fazer o sopão. Quando não dava, percebíamos que pessoas que contavam com ele para matar a fome ficavam decepcionadas e até revoltadas conosco, chegando ao ponto de tornarem-se violentas”, relembra. Com a parceria com o Nossa Casa, as doações periódicas garantiram não apenas a manutenção do projeto, mas também a ampliação dele. “Percebo que muitas famílias tiveram nessas ações o apoio que precisavam para se reerguer e melhorar de vida. Espero que essa parceria nunca acabe e agradeço a Deus por ela existir”, comemora.

Solidariedade X Assistencialismo

Uma das preocupações do Nossa Casa, principal mantenedor do projeto do Zatt, é não tornar a família dependente de um assistencialismo, o que causa acomodação. Por isso é feito um cadastro dos beneficiados e a cada três ou seis meses a situação é avaliada individualmente. “Conforme a necessidade da família e seu merecimento, a fim de que não se torne uma ajuda paternalista, mas um apoio para que possa se reerguer por suas forças e mérito”, explica Humberto Pértile, um dos colaboradores do projeto e integrante do Nossa Casa. “É importante que a família saiba que a ajuda é temporária para que não ocorra uma acomodação e isso vire um processo vicioso. Não queremos pessoas dependentes da nossa ajuda. Queremos dar um empurrão inicial para que a família possa, depois, andar com as próprias pernas”, detalha.

A prioridade é para famílias cujas crianças estejam frequentando a escola ou pessoas que estão incapacitadas de trabalhar, principalmente em função de doenças. Estão cadastradas hoje cerca de cem famílias, de quatro áreas da cidade: bairros Municipal e Zatt, Recanto da União (área irregular que integra o perímetro do bairro Municipal) e Km2 (às margens do Rio das Antas). Indiretamente, também são atendidos moradores das localidades de Veríssimo de Matos e São Luiz das Antas, no interior. Por semana são distribuídos 25 ranchos, em média, o que resulta em um rancho por família a cada 30 dias.

Cozinha comunitária

A etapa considerada mais complexa na construção da cozinha comunitária já foi superada. O projeto está pronto e aprovado, o material está comprado e o trabalho do pedreiro já foi pago. Falta apenas a retirada dos entulhos de construção para que a obra comece a ser erguida. “Estamos aguardando a realização de uma promessa da prefeitura, de ceder uma retroescavadeira e uma caçamba para o descarte desse material. Assim que isso for feito, a obra começa”, diz o pastor. A solicitação foi feita há cerca de três meses. O SERRANOSSA entrou em contato com a assessoria de Comunicação Social da prefeitura. Na segunda-feira, dia 17, a reportagem foi informada que tão logo o tempo colaborasse as máquinas iriam até o local para a retirada. O serviço será feito, segundo a prefeitura, de forma voluntária, pela empresa Pavimentadora União.

Cada rancho:

2kg de arroz (custo médio: R$ 1,70)
2kg de feijão (custo médio: R$ 2,99)
1 pacote de massa (custo médio: R$ 1,39)
1kg de açúcar (custo médio: R$ 2,99)
1 litro de azeite (custo médio: R$ 2,69)
1 pacote de farinha de milho (custo médio: R$ 1,49)
1 pacote de farinha de trigo (custo médio: R$ 1,69)
1 pacote de café em pó (custo médio: R$ 3,38)
1 litro de leite (custo médio: R$ 1,49)
Custo médio total: R$ 20

Para ajudar

Todo o tipo de doação é bem-vinda. Contato com o pastor Alfeu pode ser feito através do telefone (54) 8115 5283. A busca de doações maiores, como grande quantidade de alimentos ou móveis, deve ser combinada com a equipe de voluntários do Nossa Casa, através do e-mail nossacasa907@gmail.com. Os donativos também podem ser entregues na sede da entidade (rua Senador Salgado Filho, 907, bairro São Bento), às terças e sextas-feiras à noite, a partir das 18h30.


Reportagem: Greice Scotton

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