Temperaturas negativas devem causar prejuízos às plantações em brotação na Serra

Nesta semana a região Sul do Brasil enfrentará dias de frio intenso, com temperaturas negativas e previsão de geada e neve em alguns municípios. As baixas temperaturas estão sendo trazidas por uma massa de ar polar, que vem logo após a frente fria que traz chuva nesta segunda-feira, 26/07, e na terça-feira, 27/07. Entretanto, de acordo com a meteorologista Cátia Valente, da Sala de Situação do RS, apesar dessa massa de ar polar ser comum em períodos de inverno, o frio deverá ser mais intenso, principalmente a partir da quarta-feira, 28/07. 

E as temperaturas negativas devem provocar prejuízos significativos em algumas produções agrícolas. Conforme o pesquisador da Embrapa Gilmar Ribeiro Nachtigall, doutor em agronomia, o que preocupa é a magnitude da frente fria. “Abaixo de 0ºC já é suficiente para dar prejuízo nas plantas que já estão em vegetação, porque as células se rompem, vazando fluidos. Isso causa a morte daquele tecido e se perde a estrutura da flor que iria gerar o fruto no futuro”, explica. 


Doutor em agronomia e pesquisador da Embrapa Gilmar Ribeiro Nachtigall

Apesar de muitas culturas ainda não estarem em seu período de brotação, o engenheiro agrônomo comenta que algumas frutas, como os pêssegos e as ameixas, já iniciaram seu processo fisiológico. 
Durante os meses de inverno, as culturas frutíferas de clima temperado entram em processo de dormência para resistir às condições de frio intenso. “Nesse período, elas criam uma camada de proteção nos ramos e em sua estrutura, deslocando os nutrientes das folhas para os ramos, por isso as folhas caem”, esclarece. “A partir de um determinado período de frio e com o aumento da temperatura, a planta recebe o sinal de que pode voltar à parte vegetativa, cada uma em seu período”, continua. 

Normalmente, o período de brotação inicia em agosto e segue até setembro. Entretanto, nos últimos anos têm sido constatadas mudanças significativas no clima da região. Os invernos passaram a ter períodos de oscilação de temperatura, com calor fora de época. “A temperatura mínima foi aumentando e a oscilação faz com que as culturas pensem que já podem brotar”, comenta o pesquisador. 


Pessegueiros em brotação em propriedade de Pinto Bandeira. Foto: Raquel Konrad
 

Dessa forma, Gilmar avalia que, no caso das culturas que já retomaram seu período vegetativo, se não houver uma estrutura para minimizar os efeitos do frio, as perdas podem ser significativas nos próximos dias. O mesmo vale para as culturas plantadas o ano inteiro, como a alface, a couve e o repolho, por exemplo. “Nesse caso, as folhas irão queimar e danificar, ficando imprópria para consumo”, complementa. 

Métodos para evitar prejuízos

O pesquisador da Embrapa Gilmar Ribeiro Nachtigall afirma que todas as medidas para proteger as culturas do frio intenso devem ser pensadas antecipadamente. Conforme o engenheiro agrônomo, há três principais métodos recomendados para os agricultores. O primeiro dele seria uma irrigação por toda a área plantada, de forma suave. “Assim ocorre o congelamento de todas as estruturas, mas de forma sutil, fazendo com que, dentro da estrutura de gelo, a temperatura não fique inferior a -1ºC”, explica. 

Outro método citado pelo pesquisador é a utilização de sistemas de geração de calor, ou de turbinas que geram calor. Ainda, é possível utilizar serragem e óleo para formar ‘fogueiras’ ao longo da plantação, impedido que a temperatura diminua. “Também se pode utilizar grandes ventiladores que movimentam o ar, não deixando esse ar chegar a temperaturas baixas”, cita.

De todas as práticas, Gilmar avalia que a primeira, da irrigação, é a mais eficiente, mas consome um grande volume de água. “Pra isso o produtor precisa estar preparado. Não é possível fazer de um dia para o outro”, alerta. 

Para quem não possui condições ou tempo hábil para colocar em prática alguns dos métodos citados, a dica é fazer um seguro agrícola, a fim de compensar os valores das perdas. 

Questionado sobre a proteção plástica, o pesquisador analisa que pode funcionar para plantações menores, mas que envolve altos custos. “Se faz a cobertura, a planta recebe menos água, então é preciso um sistema de irrigação. E também não são todas as plantas que se adaptam às condições de cobertura”, alerta. 

Exemplos na região

Na vinícola Família Geisse, em Pinto Bandeira, dois métodos principais são colocados em prática para evitar prejuízos. O primeiro é o Thermal Pest Control, utilizado no início da brotação das videiras, quando há previsão de geada tardia. “O intuito é promover a inversão térmica no vinhedo, ou seja, não permitir que o ar frio, que é mais denso, se acumule e forme a geada”, explica a Engenheira Agrônoma da Família Geisse e Doutora em Viticultura, Aline Mabel Rosa.


Utilização do TPC na vinícola Família Geisse, em Pinto Bandeira. Foto: arquivo pessoal
 

O método se trata de uma máquina a base de gás, que produz um jato (vento) de calor a 130-135ºC. “A máquina joga o ar quente, empurra o ar frio pra cima e não deixa que ele se acumule. É como se fosse um aquecedor do vinhedo todo”, esclarece Aline. 

Conforme a engenheira agrônoma, a vinícola utilizou o método no ano passado em três madrugadas frias do fim de agosto. “Conseguimos controlar bem e não tivemos perdas”, afirma. 

Mais do que ajudar na elevação das temperaturas no período de geadas tardias, durante a brotação das videiras, a máquina auxilia no “controle fitossanitário nos vinhedos, além de ativar a produção de fitoalexinas nas folhas, tornando-as mais resistentes ao ataque de patógenos”, complementa Aline. 

Entretanto, por se tratar de uma grande área de terra, são necessários outros métodos para evitar prejuízos em dias de geada. Um deles é a elaboração de fogueiras com madeira, que são alimentadas durante toda a madrugada para evitar que a temperatura baixe de 0ºC. “Precisamos de muitas fogueiras e de uma equipe muito grande”, revela. “Outra estratégia é a aplicação, por pulverização, antes e depois da geada, de aminoácidos e melaço, o que diminui o ponto de congelamento da célula e reduz a água livre da célula, que é o que vai congelar e formar cristais que acabam matando os brotos. Com isso ganhamos um ou dois graus no ponto de congelamento. Se a temperatura está em -1ºC, conseguimos elevar para 1ºC positivo”, complementa. 

As técnicas, conforme a engenheira agrônoma, também podem funcionar em outras culturas, mas dependem de fatores como temperatura mínima e área cultivada.