Tese de estupro culposo gera revolta após divulgação de imagens de audiência

O caso da influenciadora digital catarinense Mariana Ferrer, que acusa o empresário André de Camargo Aranha de estupro ocorrido há dois anos, ganhou mais um capítulo e gerou revolta nas redes sociais com as hashtags #justiçapormariferrer e "estupro culposo". Aranha foi absolvido no dia 09/09 pelo juiz Rudson Marcos, da 3ª Vara Criminal de Florianópolis.

Imagens divulgadas nesta terça-feira (03/11) pelo site The Intercept mostram parte da audiência que inocentou o empresário. Nelas, o advogado de defesa de Aranha, Cláudio Gastão da Rosa Filho, exibe cópias de fotos sensuais produzidas pela jovem quando era modelo para reforçar o argumento de que a relação foi consensual e descredibilizar Mariana.

Ele definiu as poses das fotos como ginecológicas e não foi questionado sobre a relação delas com o caso. Também afirmou que “jamais teria uma filha do nível” de Mariana. Ele ainda repreende o choro da jovem: “não adianta vir com esse teu choro dissimulado, falso e essa lábia de crocodilo”.

Mariana reclama do interrogatório para o juiz. “Excelentíssimo, eu estou implorando por respeito, nem os acusados, nem os assassinos são tratados do jeito que estou sendo tratada, pelo amor de Deus, gente. O que é isso?”, diz.

O magistrado avisa Mariana de que vai parar a gravação para que ela possa se recompor e tomar água e pede para o advogado mantenha um bom nível.

O uso de argumentos pelo promotor do caso, Thiago Carriço de Oliveira, no sentido de que não houve dolo (intenção) do acusado, porque não havia como o empresário saber, durante o ato sexual, que a jovem não estava em condições de consentir a relação, não existindo portanto intenção de estuprar, gerou polêmica. "Como não foi prevista a modalidade culposa do estupro de vulnerável, o fato é atípico", escreveu ele em sua argumentação, dando origem à revolta nas redes sobre o estupro culposo.

“Não restou comprovada a consciência do acusado acerca de tal incapacidade, tendo-se, juridicamente, por não comprovado o dolo do acusado no tocante a tal estado psíquico alegado pela ofendida. Pelo que consta no processo, não restou comprovado que o acusado tinha conhecimento da suposta incapacidade da vítima”, escreveu Oliveira. “A instrução criminal não indicou a presença de dolo na conduta do acusado, não restando configurado o fato típico e antijurídico a ele imputado, qual seja, o delito de estupro de vulnerável.”

A conclusão do juiz foi de que "não há provas contundentes nos autos a corroborar a versão acusatória". A sentença reconhece que “há provas da materialidade e da autoria, pois o laudo pericial confirmou a prática de conjunção carnal e ruptura himenal recente”.

Contudo, registra o magistrado, “pela prova pericial e oral produzida considero que não ficou suficientemente comprovado que [Mariana] estivesse alcoolizada –ou sob efeito de substância ilícita– , a ponto de ser considerada vulnerável, de modo que não pudesse se opor a ação de André de Camargo Aranha ou oferecer resistência”.

O juiz faz essa afirmação embasado nos exames de alcoolemia e toxicológico realizados menos de 24 horas depois do episódio, que apresentaram resultados negativos. Ou seja, no processo a Justiça entendeu que, de fato, houve a ruptura himenal da jovem, mas que não há provas de que isso tenha sido resultado de um ato de violência nem sob alegado estado de vulnerabilidade ante a intoxicação por alguma substância colocada em sua bebida ou comida.

Ao aceitar o pedido de absolvição, o juiz Rudson Marcos concordou com a tese do promotor e, alegando o respeito ao princípio da dúvida em favor do réu, afirmou que é “melhor absolver cem culpados do que condenar um inocente”.

A defesa de Mariana recorreu da decisão, segundo o Intercept.

Durante o processo, Aranha confirmou ter tido contato sexual com a jovem, mas nega que o ato tenha sido consumado e que tenha agido de forma violenta.

O advogado Claudio Gastão classifica a reportagem do Intercept como Fake News. "Ele foi absolvido porque não foi comprovado aquilo que a Mariana tinha alegado e não por 'estupro culposo'. Isso aí é uma grande inverdade e fake news. No processo, foram ouvidas várias testemunhas e nenhuma delas corroborou o que a Mariana falou. Temos vídeos, filmagens, que desmentem. Tudo que ela falou foi impugnado por prova pericial e testemunhal", afirmou.

 

CNJ abriu procedimento disciplinar para apurar conduta do juiz

A Corregedoria do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) abriu procedimento disciplinar nesta terça-feira (03/11) para apurar a conduta do juiz Rudson Marcos. 

O pedido de investigação contra o juiz foi apresentado pelo conselheiro do CNJ Henrique Ávila. Ele quer que sejam averiguadas responsabilidades do magistrado na condução da audiência. "O que eu assisti é chocante. Precisamos avaliar aprofundadamente para apurar responsabilidades", disse Ávila. "As chocantes imagens do vídeo mostram o que equivale a uma sessão de tortura psicológica no curso de uma solenidade processual", escreveu o conselheiro no pedido."