Transporte está entre os setores mais atingidos pela pandemia

Há 20 anos, Janete Bellaver e seu marido, Antônio, conhecido como Pelé, veem suas vans cheias de crianças, de todas as idades. Desde 1999, o principal sustento da família é o transporte escolar, por meio da empresa Saratur. Com os anos, o negócio foi crescendo e eles decidiram contratar um colaborador, com quem Janete vinha trabalhando desde a metade de março deste ano. Mas a pandemia do Coronavírus mudou essa rotina e trouxe prejuízos incalculáveis ao casal de empresários, que está há 5 meses sem rodar nenhuma van escolar. Janete e Pelé trabalham exclusivamente com o transporte de estudantes do colégio Sagrado Coração de Jesus, que suspendeu as aulas presenciais no dia 19/03. 

O exemplo do casal é um em dezenas, somente em Bento Gonçalves. O setor de transporte, junto com o turismo, é um dos mais atingidos pela pandemia. “No começo do ano a gente faz todos os serviços de manutenção. Renova seguro, troca pneus… tudo para não precisar parar depois. Nesse período nós já não estávamos bem financeiramente, por conta das férias escolares. Por isso, pagamos esses serviços com boleto. Quando começou a pandemia ainda tínhamos muitos para pagar. Tivemos que fazer um acordo com o nosso motorista porque não íamos conseguir continuar pagando o salário integral dele. E ainda temos todos os gastos de casa e o financiamento de um micro-ônibus”, revela Janete. 

Logo após a suspensão das aulas, a profissional conta que não tentou fazer acordo com os pais dos alunos, por não achar justo que continuassem pagando por um serviço não prestado. “Eu deixei bem livre para os pais. Porque assim como nós, muitos também estão passando por dificuldades financeiras”, conta. Mesmo assim, alguns clientes continuaram pagando os boletos da van por alguns meses, para auxiliar o casal. “Em maio, menos pessoas pagaram. Depois, foi diminuindo ainda mais. Mesmo quando alguns ainda pagavam, o valor não cobria as despesas mesmo com as vans paradas”, lamenta. 


Janete e Pelé. Foto: arquivo pessoal
 

Desde então, Janete e o marido têm buscado auxílio financeiro com programas do governo. Mas até o momento, o casal não encontrou nenhum financiamento vantajoso para auxiliar neste momento de crise. “Eu conversei com representantes do Poder Público para que a prefeitura intercedesse junto aos bancos para liberarem um empréstimo com alguns meses de carência para que pudéssemos começar a quitar quando o transporte retornasse, mas até agora não deram retorno. Vale lembrar que nós, do transporte escolar, somos muitos cobrados o ano todo. E eu não entendo por que, nesse momento, ninguém se lembra da gente”, lamenta Janete. “Por enquanto nós estamos nos sustentando com o valor que tínhamos guardado para comprar um imóvel, porque moramos de aluguel. Mas até essa reserva está chegando ao fim”, desabafa. 

Mudanças necessárias

A prefeitura de Bento Gonçalves informa que, até o momento, vem auxiliando as empresas do setor que prestam serviço ao município, ou seja, aquelas que transportam estudantes das escolas municipais. Para esses, está sendo adiantado o valor de 50% de cada vaga, mesmo sem a prestação do serviço. 

Entretanto, muitas empresas seguem desamparadas, como também é o caso da D&E Transportes e Turismo. Apesar da possibilidade da prorrogação das parcelas de financiamentos, benefício criado pelo governo federal, os juros abusivos acabaram tornando a alternativa inviável para a empresa. “Na reunião em que participamos com o Poder Público do município, nos foi passado que não havia como auxiliar o setor. A única coisa que conseguiram foi uma parceria com um banco para analisar situações de possíveis financiamentos com juros melhores, o que, na minha opinião, não iria ajudar em nada”, desabafa a proprietária, Elizandra Menzen. 


Elizandra e Dileno. Foto: arquivo pessoal
 

Até o começo da pandemia, a empresa se chamava SM Viagens e Turismo, mas diversas adaptações foram necessárias para que Elizandra e seu marido, Dileno Slotnicki, conseguissem dar sequência ao negócio. “Uma das alternativas foi vender a SM. Aí reduzimos a quantidade de veículos de 3 para 1, não temos mais funcionários e estamos só eu e o Dileno. Então abrimos uma empresa nova para começar do zero e manter tudo em dia”, conta. 

A SM Transportes foi criada em 2006 e, até então, contava com três veículos de transporte de passageiros, trabalhando com turismo, viagens, eventos, transporte empresarial e universitário. “Nosso carro-chefe era o turismo, os eventos e o transporte universitário. Agora, a maioria dos nossos serviços foi extinto. Hoje, apenas trabalhamos com o transporte empresarial dos funcionários, mas algumas empresas também cancelaram para reduzir custos”, relata Elizandra. 

Com mais de 80% de queda nos serviços, a empresária afirma que não tem expectativas de retorno próximo. “No nosso caso temos o pensamento que apenas em janeiro de 2021 retorne à rotina normal”, acredita. 

Na visão da empresária Janete Bellaver, os serviços deverão retornar em setembro, mas de forma gradual. “Infelizmente, vai demorar para voltarmos 100%. Alguns pais estão tirando as crianças de escolas particulares, por conta da redução de suas rendas. E também teremos que fazer um distanciamento seguro entre os alunos. Ou seja, vamos ter que rodar um veículo que teria capacidade de 30 estudantes com apenas 15. Vai ser bastante custo, menos renda e muita conta para pagar”, lamenta.