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Vice-prefeito fala em “tentativa de golpe” e tem gabinete transferido para fora da prefeitura

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Ao retornar de Brasília – onde foi acompanhar o desenrolar do processo de impeachment e cumprir agenda em ministérios – o vice-prefeito Mario Gabardo deparou-se com uma situação, no mínimo, inusitada, no final da tarde da última quarta-feira, dia 20. Ele, literalmente, perdeu seu lugar na prefeitura: ainda surpreso, foi avisado de maneira informal que seu “novo” gabinete funcionaria no segundo andar do prédio ao lado do Palácio Municipal, junto ao Arquivo Histórico. Ao chegar no escritório improvisado, com uma mesa velha, duas cadeiras e uma estante metálica torta, perguntou aos servidores do departamento de onde havia partido a ordem para a mudança. “Veio lá de baixo”, resumiu uma das funcionárias, referindo-se à sede do governo.

O distanciamento forçado de Gabardo do resto da administração, de acordo com ele, chegou ao seu ápice nos últimos dias, mas se arrasta há pelo menos um ano e meio. O momento mais conturbado foi justamente no dia em que o vice embarcou para a capital federal, às próprias custas: enquanto estava fora, o Poder Executivo empossou novos secretários, anunciou férias do prefeito Guilherme Pasin e divulgou que o cargo havia sido transferido temporariamente para Gabardo – ele garante não ter sido informado da responsabilidade em momento algum e vai além: exibe na tela do seu smartphone uma troca de mensagens com Pasin, do dia 14, na qual o comunica de sua viagem (o que a prefeitura alegou não saber), recebe algumas demandas a cumprir e é atualizado sobre a nomeação dos novos titulares de algumas secretarias. Nada sobre Gabardo se tornar prefeito interinamente.

O que poderia significar uma “simples” falta de comunicação – realidade que o vice-prefeito acusa ser a atual, pelo isolamento a que teria sido submetido – é, nas palavras de Gabardo, “uma artimanha, uma tentativa de golpe”. Isso porque seu filho e ex-secretário de Governo de Pasin, o presidente do PMDB local César Gabardo, é pré-candidato a prefeito e, caso o pai assumisse no período de seis meses antes das próximas eleições, inviabilizaria sua candidatura, conforme restrições previstas na Constituição (veja quadro). “Pela forma como isso aconteceu, sem que eu fosse avisado e nem assinasse nada, só posso pensar nisso, que era uma maneira de fazer com que meu filho não pudesse concorrer nas eleições. Eu soube em Brasília e pensei ‘deve ser alguma armação’. Isso ficou ainda mais claro com as declarações do procurador (Sidgrei Spassini) de que eu deveria renunciar e com as mentiras de que eles não sabiam onde eu estava e o que estava fazendo”, afirma.

Segundo Gabardo, ao longo de 2013 e 2014, Pasin chegou a transferir a função a ele três ou quatro vezes, mas já não fazia isso há mais de um ano. “Ele designava secretários ou qualquer outra pessoa para representar a prefeitura em eventos, menos eu. Por que fazer isso agora, quando ele sequer me deixa a par de sua agenda ou nem me atende? É muito estranho”, completa.

Em uma breve entrevista, ele relatou ao SERRANOSSA sua condição nos bastidores do poder. Confira:

Jornal SERRANOSSA – Como está a sua relação com o prefeito Guilherme Pasin?
Mario Gabardo –
 Por decisão dele, não existe praticamente nenhum tipo de comunicação entre nós dois. Ele não me deixa saber da agenda de prefeito e também não me passa atribuições de vice. Para conseguir uma reunião com ele, eu preciso quase pedir esmola. Tenho que esperar dois ou três meses. E, mesmo com hora marcada, já fiquei esperando sentado mais de meio dia, vendo outros chegarem e passar na frente.

SN – É uma situação recente?
Gabardo – 
É uma situação que piorou recentemente, mas já vem assim há um ano e meio. Cada vez foi piorando: trocaram várias fechaduras da prefeitura para eu não ter acesso nem ao Salão Nobre, tiraram a única assinatura de jornal que eu mantinha no gabinete, me deixaram sem uma secretária por seis meses, não tinha nem quem atendesse o telefone.

SN – A que você atribui isso?
Gabardo –
 Só posso acreditar que, antes, tratava-se de uma retaliação ao vice-prefeito pelo fato de ser pai do presidente do PMDB. Agora, ficou claro que o golpe já pode ser interpretado como campanha por parte deles. Eles querem ganhar o jogo, mas sem um time do outro lado. Estão tentando ganhar por W.O.

SN – Por que permanecer no governo mesmo após o fim da coligação entre PP e PMDB?
Gabardo –
 Porque meu cargo não é do partido, embora seja uma situação que também tenhamos discutido, e eu tenho que prestar contas à população. Eu me mantive, ao longo desse tempo, como deve ser o vice: disposto para assumir os trabalhos designados pelo prefeito, e continuo dessa forma. Meu desejo é encerrar o mandato assim, mas não depende apenas de mim. Se eles querem me afastar mais ainda ou me humilhar, é um problema deles, e não meu.

SN – A renúncia é uma possibilidade?
Gabardo –
Vai ser o meu último recurso. Não é o meu desejo, porque eu não sei como isso seria recebido na comunidade. Se chegar ao ponto de eu ser forçado a escolher entre ficar ou proteger uma possível candidatura do meu filho, eu saio para não prejudicá-lo. Mas ainda acredito no bom senso, em uma campanha sem baixarias.

 

Vice-prefeito Mario Gabardo exibe em seu celular mensagens a Pasin em que informa ida a Brasília e nas quais não é notificado da transmissão do cargo

 

Gabardo sabia, rebate prefeitura
O procurador-geral do município, Sidgrei Spassini, argumenta que Gabardo teria sido comunicado de que assumiria a prefeitura no dia 13, no gabinete do prefeito, e não apresentou nenhuma objeção. Ainda conforme Spassini, o vice não precisaria assinar o termo de transmissão, pois a função “é inerente ao cargo”.

A prefeitura, na justificativa do procurador, não estava sabendo da agenda de Gabardo em Brasília. “Se ele não quer assumir essa responsabilidade, que não seja vice-prefeito e renuncie”, afirmou Spassini, ainda na última sexta-feira, 15.

Pasin viajou para Abu Dhabi na última segunda-feira, 18, mas, após o impasse da semana passada, cancelou as férias que tiraria antes. Ele permanece nos Emirados Árabes Unidos até a próxima terça-feira, dia 26. A visita internacional é acompanhada do secretário-executivo do Ministério dos Esportes, Marcos Jorge Lima, a convite da Federação de Jiu-Jítsu do país, para prestigiar a final do Mundial da modalidade. Bento Gonçalves foi escolhida para sediar uma das seletivas do campeonato de 2017. Conforme a prefeitura, a viagem não terá ônus para o município. O prefeito deve aproveitar a agenda para negociar um possível acordo de cidades-irmãs e apresentar outras propostas de intercâmbio acadêmico e comercial.

PP nega
O presidente do diretório local do PP, Carlos José Perizzolo, diz não ter conhecimento sobre qualquer tentativa de inviabilizar uma eventual candidatura de César Gabardo. “A gente não faria isso nunca. É mais uma armação para conseguir notoriedade para o PMDB”, acusa. Para ele, caso Gabardo não quisesse ou não pudesse assumir, deveria comunicar a prefeitura por ofício. De qualquer forma, Perizzolo acredita que o vice deva continuar no cargo, mesmo após o rompimento da sigla com o governo, no final de fevereiro. “Ele foi eleito, tem um mandato a cumprir, ao contrário dos secretários”, avalia.

O que diz a Constituição
“São inelegíveis, no território de jurisdição do titular, o cônjuge e os parentes consanguíneos ou afins, até o segundo grau ou por adoção, do presidente da República, de governador de Estado ou Território, do Distrito Federal, de prefeito ou de quem os haja substituído dentro dos seis meses anteriores ao pleito, salvo se já titular de mandato eletivo e candidato à reeleição.” (artigo 14, parágrafo 7º)

(Fotos: Carina Furlanetto e Jorge Bronzato Jr.)

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