Vítimas relatam como hacker agia e chantageava
Cristian Antônio Pereira. Esse é o nome do homem que atormentou pela internet centenas de mulheres por, pelo menos, sete anos e que foi preso na Inglaterra na semana passada. Natural de Rolândia, no Paraná, ele invadia perfis femininos e chantageava as verdadeiras donas. Quem quisesse ter a página de volta teria que fazer sexo virtual com ele. A bento-gonçalvense Patrícia Fleck, 27 anos, modelo e empresária, foi uma das vítimas do hacker, que chegou a fazer sexo virtual com um idoso usando o perfil dela.
O drama de Patrícia durou uma semana, tempo suficiente para causar diversos constrangimentos e incômodos. Quem também passou por isso foi Josiane da Costa Schmitt, de 27 anos, de Lajeado. Ambas foram enganadas por pensarem que estavam conversando com as amigas, quando, na verdade, era o hacker roubando todas as contas de Skype, MSN, Facebook, e-mails e demais redes sociais. Confira a entrevista com os relatos das vítimas.
COMO ELE AGIA
Cristian Antônio Pereira tinha diversos modos de operação. O principal deles, relatado pelas vítimas entrevistadas pelo SERRANOSSA, é que ele invadia um perfil, fingia ser a dona da conta e procurava as amigas dela na internet, onde passava a aplicar o mesmo golpe. A partir daí ele pedia para conversar por vídeo. Na hora em que as vítimas ligavam a câmera, não era a amiga, era o rapaz. Outra ação era enviar uma solicitação de amizade em nome de Fred Maya, um perfil falso criado pelo hacker. Quando conseguia roubar as contas, chantageava as mulheres dizendo que se não fizesse sexo virtual com ele, divulgaria imagens e vídeos íntimos encontrados nos e-mails e nas contas.
O criminoso também ameaçava as vítimas dizendo que se não ocorresse sexo na internet, iria ser pessoalmente. Isso porque, ele tinha acesso a endereços pessoais e telefones das vítimas, através de informações obtidas nos e-mails e redes sociais. Cristian chegou a ser condenado por estupro em 2012. A pena, de 13 anos e 6 meses de reclusão, cujo mandado de prisão encontra-se expedido desde 11 de setembro de 2012, não chegou a ser cumprida. Ele deixou o país durante o julgamento e cometeu os mesmos crimes em uma cidade no interior da Inglaterra. A Justiça já pediu a extradição de Cristian Pereira para que ele cumpra no Brasil a pena pela qual foi condenado. Na Inglaterra, o rapaz também é considerado um criminoso.
“Oferecemos dinheiro, mas ele queria sexo”, conta Patrícia
Jornal SERRANOSSA – Como tudo aconteceu?
Patrícia Fleck – Há mais ou menos um ano e meio, uma amiga minha me chamou no Facebook pedindo ajuda com uma pesquisa. Como eu a conhecia, respondi as perguntas que não tinham maldade nenhuma. Logo depois, ela me ofereceu um trabalho, no qual eu ganharia muita grana, mas que eu teria que mostrar meu corpo na internet para homens muito ricos. Chamei ela de louca e disse que jamais faria isso. Ela ainda tentou me convencer, dizendo que era fácil e rápido.
SERRANOSSA – Na verdade não era sua amiga, era o hacker?
Patrícia – Isso. Um tempo depois, percebi que ela estava estranha, que já falava como se fosse um homem e me fazia ameaças do tipo “você tem que ficar falando comigo senão algo muito ruim irá te acontecer”. Nesta mesma hora troquei a senha do meu Facebook e ele me disse: “não adianta você mudar a senha, já estou com ela”. Nesta mesma hora, ele já desativou o Face e não tive mais como usar, assim como e-mail e o Skype. Neste dia eu estava no Uruguai, e o único meio de contato lá era através do WhatsApp. Imediatamente falei com meu namorado e pedi que ele falasse com minha família para que todas as minhas contas de banco fossem bloqueadas.
SERRANOSSA – Você conseguiu manter contato com ele depois que roubou suas contas nas redes sociais e e-mail?
Patrícia – Eu tentava entrar em contato com ele através do Facebook da minha mãe. Oferecemos dinheiro, e ele dizia que não queria grana, queria sexo. Ele dizia: “você sabe como pode me pagar”. Inclusive tentou fazer sexo virtual com a minha mãe, no caso, era eu falando no Face dela, e ele fazia de tudo para que eu dissesse palavras relacionadas a sexo.
SERRANOSSA – E como você conseguiu recuperar suas contas?
Patrícia – Um dia, um primo meu conseguiu recuperar meu e-mail e depois meu Facebook. No exato momento que ele recuperou, o hacker estava marcando um encontro com uma menina lá na Inglaterra, como se fosse eu. A conversa aparecia em tempo real para nós. Intervimos e avisamos que ele era um hacker e para ela não ir a encontro nenhum.
SERRANOSSA – O que mais ele fez usando seu perfil?
Patrícia – Ele fez a festa! Adicionou mulheres de todos os lugares do mundo e oferecia diferentes tipos de trabalho e induzia, incansavelmente, as meninas a falar sobre sexo. Fazia pesquisas e mais pesquisas. Ele só queria ler algo sexual ali na tela! O mais absurdo é que ele chegou a fazer sexo com um idoso com meu perfil.
SERRANOSSA – Quanto tempo durou tudo isso? Você chegou a denunciar o caso na polícia?
Patrícia – Foi uma semana. Fui na polícia registrar e fiquei bastante desapontada. Eles nem me deram atenção e o hacker era um bandido, um estuprador foragido! Eu entendo que a polícia deve ter milhões de coisas para resolver, mas é necessário dar atenção aos crimes virtuais também.
SERRANOSSA – Você conhece outras mulheres que passaram por isso?
Patrícia – Sim, várias. Mas têm duas amigas da cidade de Joinville que foram casos mais graves. Uma se apaixonou por ele e outra acabou aceitando o trabalho por estar precisando muito de grana e depois sofreu muito com isso, precisou de tratamento psicológico e muito apoio da família. O cara era muito dominador e sabia usar as palavras. Minhas amigas disseram que ele mostrava a casa dele, que ele parecia ser rico e, embora fosse um maníaco, ele tinha uma boa aparência.
“Ele pedia para eu ficar nua na webcam”
SERRANOSSA – Quando e como você caiu no golpe deste hacker?
Josiane – Foi em 2009. Minha melhor amiga me chamou no MSN para me entrevistar para um trabalho de faculdade dela, de empreendedorismo, dizendo que estava na universidade fazendo o trabalho com colegas. Na verdade era o hacker, que já havia roubado o perfil dela tentando descobrir coisas sobre a minha pergunta secreta de recuperação de e-mail, que se referia a trabalho. Acredito que ele tenha notado que eu estava achando estranho ela não lembrar de alguns detalhes e disse que um colega continuaria me fazendo as perguntas enquanto ela fazia outra parte e me adicionou do próprio perfil para “terminar” de descobrir minhas senhas. Ele roubou tudo: redes sociais, e-mails, MSN… Lembro como se fosse hoje meu e-mail caindo e eu tentando entrar e não funcionou. Na hora liguei para essa minha amiga e ela atendeu falando baixinho: “não posso falar agora, estou trabalhando”. Na hora entendi o que tinha acontecido. Eu me senti muito estúpida.
SERRANOSSA – Que tipo de coisas ele pedia para você fazer?
Josiane – Queria que eu ficasse nua para ele na webcam dizendo que me devolveria as coisas. Ele chegou a roubar meu TCC. Como ele não tinha como me chantagear com essa história de ter fotos ou conversas comprometedoras, ele ameaçava publicar meus trabalhos para que eu fosse acusada de plágio.
SERRANOSSA – Por quanto tempo ele agiu?
Josiane – Cerca de duas semanas, até que ele desistiu. Ele criou um perfil no MSN para que eu me comunicasse com ele e me ligava dezenas de vezes por dia, pois conseguiu meu celular na assinatura do e-mail. Era dissimulado, ria muito. Como eu não tinha vídeos ou fotos ele apelou para o TCC. Depois que recuperei minhas contas, descobri que ele se passava por mim para tentar roubar várias mulheres e depois ele as ludibriava.
SERRANOSSA – Você chegou a falar com ele na webcam?
Josiane – Sim, desde a primeira conversa (quando ele nem tinha minhas senhas e se passou por colega da minha amiga) ele fez questão de mostrar o rosto. Não tinha medo de nada, disse que nunca seria pego.
SERRANOSSA – Como conseguiu se livrar dele?
Josiane – Consegui uma forma segura de recuperar todas as minhas senhas (em uma segunda tentativa, pois na primeira vez que consegui ele roubou novamente). Tive que comprovar via documento oficial a titularidade das minhas contas.
SERRANOSSA – Você chegou a denunciar na polícia?
Josiane – Não. Em 2009 não se falava com seriedade em crimes pela internet. Eu era mais julgada por ter conversado sobre trabalho com minha melhor amiga do que vista como vítima de um maluco. Quando vi que ele foi preso foi inacreditável. Tantos anos depois, fiquei feliz pela justiça que foi feita por mulheres que tomaram a frente e fizeram essa denúncia (uma lição pra mim), e assustada de saber que ele ainda fazia esse tipo de coisa.
Reportagem: Raquel Konrad
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