Cuidando da pessoa, não apenas da doença: uma pausa necessária
Uma doença grave ou um diagnóstico de câncer é como um acidente de carro: interrompe bruscamente o fluxo de algo que estava em andamento. Desse momento em diante, reduzir a velocidade não é uma mera possibilidade, mas uma obrigação. A rota é suspensa, a marcha precisa mudar, mesmo que temporariamente. E, às vezes, o motorista percebe que aquela rota ou velocidade anterior não estava alinhada com o que realmente queria.
De fato, fomos condicionados a sermos tão obcecados em seguir em frente, em avançar e progredir, que muitas vezes nos esquecemos de nos perguntar:
Para onde estou indo?
Essa rota que escolhi faz sentido?
Esse ritmo está valendo a pena?
É difícil construir uma vida com qualidade, sentido e significado sem nos abrirmos para a contemplação dessas perguntas de tempos em tempos – para não dizer a todo instante. É fácil, muito fácil, cair no automatismo da ação.
Somos engolidos por nossos hábitos, vícios, pela pressa, pelo excesso de informação, pela cultura que se sobrepõe aos nossos instintos.
Nesse sentido, gosto muito da história do homem que vai ao mestre e pede para saber o seu futuro. O sábio, sem pestanejar, responde: “É fácil. A menos que você desperte, amanhã será como hoje”.
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Muitas vezes, a doença convida para esse despertar: convoca a atenção do indivíduo, que passa a estar mais próximo de si. Esse chamado à consciência pode desencadear uma reavaliação com o potencial de trazer mais alegria, propósito e bem-estar global à pessoa, que se sente compelida ou autorizada a aproveitar melhor a vida.
O adoecimento de meus pais alterou profundamente minha relação com o tempo. Inicialmente, o que sentimos foi soma: tudo passou a acontecer ao mesmo tempo. Com o passar dos anos, teve início a subtração: em parte, era intencional, mas também tinha o fator ausência de fôlego mesmo. Tivemos que eleger nossas prioridades, peneirar o que fazia sentido.
Deixar de lado algumas coisas.
Passamos a fazer algo que, no fundo, seria importante para qualquer pessoa, saudável ou não: olhar para o próprio tempo de vida e entender o que deseja fazer com ele.
Desacelerar nos dá a oportunidade de sermos menos reativos.
Os acontecimentos podem ser ameaçadores, até mesmo assustadores, mas, reduzindo o ritmo, criando um espaço seguro e quieto, ampliamos o campo de possibilidades.
Há uma frase, atribuída ao psiquiatra e sobrevivente do Holocausto Viktor Frankl, que pode ser muito útil aqui (mesmo sem autoria comprovada): “Entre o estímulo e a reação há um espaço. Neste espaço está nosso poder de escolher nossa resposta. Na nossa resposta está nosso crescimento e nossa liberdade”. Um dos paradoxos da doença é que, ao criar esse espaço, essa pausa, podemos inaugurar uma forma muito mais expressiva e gratificante de experimentar a vida.
Vale a pena repetir: “Parar não é interromper. Muitas vezes continuar é que é uma interrupção”.
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