“Noites Alienígenas” leva cinco Kikitos no Festival de Cinema de Gramado

“Noites Alienígenas”, produzido no Acre, conquistou o 50º Festival de Cinema de Gramado. O filme dirigido por Sérgio de Carvalho levou na noite de sábado, 21/08, no Palácio dos Festivais, cinco Kikitos: melhor longa-metragem brasileiro, ator (o estreante Gabriel Knoxx, rapper como o seu personagem), ator coadjuvante (Chico Diaz), atriz coadjuvante (Joana Gatis) e o troféu da crítica. Também recebeu uma menção honrosa pela atuação de Adanilo. “Foi um filme ovni que aterrissou em Gramado e foi uma grande surpresa”, afirmou o diretor.

“A gente vem de um lugar que sofreu muito bullying, com pessoas dizendo que não existia. Mas a gente existe. A foto da cultura brasileira costuma ser muito branca e masculina, mas agora nós, mulheres, indígenas, negros, demos uma empurradinha para o lado e estamos na foto também. Nunca mais este festival será igual, porque hoje abriu uma porta ao reconhecer a cultura periférica. A gente é fruto de política pública, de dinheiro descentralizado, que chega lá nas bordas”, destacou a produtora executiva Karla Martins.

Com estreia comercial prevista para 2023, “Noites Alienígenas” representou uma tendência desta edição do festival: a de dar visibilidade e voz às populações marginalizadas e às comunidades periféricas. Entre os outros longas nacionais laureados está “Marte Um”, que recebeu quatro Kikitos: Prêmio Especial do Júri (“pelo afeto na tela”), melhor roteiro (Gabriel Martins, diretor do filme), música e o troféu do júri popular. O filme mostra os sonhos e os perrengues de uma família negra da periferia de Contagem, na região metropolitana de Belo Horizonte.

O longa “A Mãe”, que ganhou três categorias, incluindo a de direção (Cristiano Burlan, porto-alegrense radicado em São Paulo) e a de atriz (Marcelia Cartaxo, vencedora em 2019 por Pacarrete), é ambientado em um bairro pobre da capital paulista, o Jardim Romano, onde a protagonista luta para encontrar o filho adolescente, desaparecido após uma abordagem policial.

Entre os curtas-metragens, “Fantasma Neon (RJ)”, de Leonardo Martinelli, foi ganhador de quatro Kikitos: melhor filme, direção, ator (Dennis Pinheiro) e troféu da crítica, além da aquisição do Canal Brasil. O curta é um musical sobre os entregadores de aplicativo que usam bicicleta. Tendo a precarização do trabalho como tema, mistura atores e não atores, ficção e depoimentos reais.

“O Pato (PB)”, que valeu a Fernando Domingos o prêmio de roteiro, tem uma protagonista negra e nordestina que encara a violência doméstica. Imã de Geladeira (SE), de Carolen Meneses e Sidjonathas Araújo, mereceu menção honrosa “por catapultar a urgente discussão sobre o racismo estrutural através do horror cósmico”.O Elemento Tinta (SP), de Iuri Salles e Luiz Maudonnet, venceu a categoria de montagem e o júri popular ao retratar praticantes do pixo que decidem protestar contra o governo após a morte de um amigo por covid-19.

Sobre Noites Alienígenas

A história de Noites Alienígenas é inspirada no romance homônimo publicado em 2011 pelo próprio diretor, um paulista que há 20 anos mora no Acre, e se passa nos limites entre o urbano e a Floresta Amazônica. O título tem um duplo sentido. Por um lado, alude à porção realismo mágico do filme; por outro, sinaliza para uma triste realidade: a abdução da juventude de Rio Branco, a capital do Estado, pelo crime organizado, a partir da chegada das facções do Sudeste. Segundo Noites Alienígenas, nos últimos 10 anos o número de homicídios aumentou 183% entre adolescentes e jovens. E o poder público parece omisso: não se vê policiais nem viaturas em cena.

Com planos belíssimos, ora colando a câmera no corpo dos atores (ou até dos animais, como uma cobra), ora inserindo os personagens na paisagem exótica, Carvalho faz rodar uma trágica ciranda de tipos e situações que não deixam de ser clichês. Mas essa condição é minimizada pela paixão do elenco — quase todo praticamente amador — e pela relevância sociopolítica da trama.

A figura de Paulo, vivido por Adanilo, ilustra a ruína dos povos indígenas perante o tal de “progresso” das cidades: ele se tornou dependente químico e rouba pertences da própria mãe para comprar drogas. Há um rapper de 17 anos, Rivelino, o Riva (papel de Gabriel Knoxx), que é apaixonado pela garçonete e mãe solteira Sandra (Gleici Damasceno, vencedora do BBB 18) e que acaba se juntando a uma facção. E é atrás de notícias sobre esse garoto que uma mãe hedonista e em princípio um tanto distante, Beatriz (Joana Gatis), vai à casa de Alê (Chico Diaz), um traficante “das antigas”, que não compactua da violência empregada pelos novos barões do crime, que rimam irmandade com mortandade — uma imagem emblemática é a do soldado do tráfico que carrega uma arma na cintura e, às costas, traz tatuado o nome de Jesus Cristo.

Confira todos os premiados

LONGAS-METRAGENS BRASILEIROS

•             Melhor filme: Noites Alienígenas, de Sérgio de Carvalho (mais R$ 40 mil em dinheiro)

•             Direção: Cristiano Burlan (A Mãe)

•             Ator: Gabriel Knoxx (Noites Alienígenas)

•             Atriz: Marcélia Cartaxo (A Mãe)

•             Ator coadjuvante: Chico Diaz (Noites Alienígenas)

•             Atriz coadjuvante: Joana Gatis (Noites Alienígenas)

•             Roteiro: Gabriel Martins (Marte Um)

•             Fotografia: Rui Poças (Tinnitus)

•             Montagem: Eduardo Serrano (Tinnitus)

•             Direção de arte: Carol Ozzi (Tinnitus)

•             Desenho de som: Ricardo Zollner (A Mãe)

•             Trilha musical: Daniel Simitan (Marte Um)

•             Prêmio Especial do Júri: Marte Um, de Gabriel Martins

•             Júri da crítica: Noites Alienígenas

•             Júri Popular: Marte Um

•             Menção honrosa: Adanilo (ator de Noites Alienígenas)

CURTAS-METRAGENS

•             Melhor filme: Fantasma Neon (RJ), de Leonardo Martinelli (mais R$ 10 mil em dinheiro)

•             Direção: Leonardo Martinelli (Fantasma Neon)

•             Ator: Dennis Pinheiro (Fantasma Neon)

•             Atriz: Jéssica Ellen (Último Domingo, RJ)

•             Roteiro: Fernando Domingos (O Pato, PB)

•             Fotografia: Fernando Macedo (Último Domingo)

•             Montagem: Danilo Arenas e Luiz Maudonnet (O Elemento Tinta)

•             Direção de arte: Joana Claude (Último Domingo)

•             Desenho de som: Alexandre Rogoski (O Fim da Imagem, PR)

•             Trilha musical: Nhanderekoa Ka’aguy Porã, pelo Coral Araí Ovy e Conjunto Musical La Digna Rabia (Um Tempo para Mim, RS)

•             Prêmio Especial do Júri: Serrão (MG), de Marcelo Lin

•             Júri da crítica: Fantasma Neon, de Leonardo Martinelli

•             Júri Popular: O Elemento Tinta, de Luiz Maudonnet e Iuri Salles

•             Menção honrosa: Imã de Geladeira (SE), de Carolen Meneses e Sidjonathas Araújo

•             Prêmio Canal Brasil: Fantasma Neon

FILMES ESTRANGEIROS

•             Melhor filme: 9, de Martín Barrenechea e Nicolás Branca (mais R$ 25 mil em dinheiro)

•             Direção: Néstor Mazzini (Cuando Oscurece)

•             Ator: Enzo Vogrincinc (9)

•             Atriz: Anajosé Aldrete (El Camino de Sol)

•             Roteiro: Agustin Toscano, Moisés Sepúlveda e Nicolás Postiglione (Inmersión)

•             Fotografia: Sergio Asmstrong (Inmersión)

•             Prêmio Especial do Júri: Jeff Calmet, pela direção de arte de La Pampa

•             Júri da crítica: 9, de Martín Barrenechea e Nicolás Branca

•             Júri Popular: La Pampa, de Dorian Fernández-Moris

MOSTRA GAÚCHA DE LONGAS

•             Melhor filme: 5 Casas, de Bruno Gularte Barreto (mais R$ 10 mil em dinheiro)

•             Direção: Bruno Gularte Barreto (5 Casas)

•             Ator: Hugo Noguera (Casa Vazia)

•             Atriz: Anaís Grala Wegner (Despedida)

•             Roteiro: Giovani Borba (Casa Vazia)

•             Fotografia: Ivo Lopes Araújo (Casa Vazia)

•             Montagem: Vicente Moreno (5 Casas)

•             Direção de arte: Gabriela Burk (Despedida)

•             Desenho de som: Marcos Lopes e Tiago Bello (Casa Vazia)

•             Trilha musical: Renan Franzen (Casa Vazia)

•             Júri Popular: 5 Casas, de Bruno Gularte Barreto

•             Menção honrosa: Clemente Vizcaíno (Despedida) e Campo Grande É o Céu, de Bruna Giuliatti, Jhonatan Gomes e Sérgio Guidoux

DOCUMENTÁRIOS

•             Melhor filme: Um Par para Chamar de Meu, de Kelly Cristina Spinelli (mais R$ 10 mil)

•             Menção honrosa: Elton Medeiros: O Sol Nascerá, de Pedro Murad

Com informações de GZH.